Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

O avanço para trás

Novo brinquedo eletrônico na praça, mas não se destina às crianças. O Kindle é um gadget para adultos, abonados e novidadeiros: trata-se de um leitor eletrônico de livros, lançado pela livraria digital Amazon. Custará no Brasil cerca de mil reais e desde já tem à disposição 200 mil títulos que podem ser baixados do próprio aparelho em 60 segundos.


A direção da Feira de Frankfurt, o maior evento editorial do mundo, onde o aparelho foi apresentado, já previu que o livro de papel acabará até 2018. Dois anos depois da Olimpíada do Rio.


Jornais e revistas estão excitadíssimos. O Globo já anunciou sua adesão: sua edição impressa já está disponível no Kindle. O aparelho foi capa de revista no último fim de semana e Paulo Coelho, o maior fabricante de livros, proclamou que ‘quem não adotar a nova tecnologia ficará tão antigo como os monges medievais’. Então, um viva aos monges medievais – eles sabiam o que é bom.


Tipos móveis


De qualquer forma, os próprios jornalistas que se encarregaram de promover o incrível aparelhinho estão dizendo que a sua primeira versão é tosca e as páginas não são muito claras. Os fabricantes anunciam que funcionará com a mesma tecnologia dos celulares, embora isto não seja uma garantia de qualidade: como sabem os milhões de usuários das grandes cidades brasileiras, seis de cada dez ligações por celular são imperfeitas, perdem-se ou não conseguem ser completadas.


Os alegres promotores do fim do livro impresso também não informam o peso da maquineta nem a sua portabilidade. Muito menos respondem a algumas perguntas essenciais: é possível ler um Kindle na cama, no metrô, no toalete?


A nova noção de progresso é muito estranha, tem algo de medieval: ao invés de saudar avanços, regozija-se com retrocessos.


Portabilidade é a questão central nos veículos impressos. Não foi Gutenberg quem inventou o livro, o livro já existia antes dele. Johannes Gutenberg, de Mainz (Mogúncia), inventou os tipos móveis – quem inventou o livro tal como o conhecemos hoje foi o veneziano Aldus Manucius, meio século depois.


Era verdadeiramente portátil.