Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O jornalismo premiado

A formação acadêmica melhoraria ainda mais a qualificação dos jornalistas, um dos aspectos positivos da exigência do diploma de nível superior, feita a partir de 1969, se os profissionais pudessem cursar qualquer faculdade e não apenas comunicação social. A passagem pela Universidade aprimorou os jornalistas em todas as partes do mundo em que não houve a vinculação a um único curso. Permitiu-lhes combinar o rigor dos métodos científicos e da observação sistemática com a criatividade do exercício do jornalismo na linha de frente, em contato com os fatos. Eles são o ponto de partida e o ponto de chegada dos jornalistas. O princípio investigativo específico da profissão é nunca se desviar dos fatos.

Um dos reflexos desse ganho de qualidade está nos livros de reportagem que têm sido publicados recentemente. Eles não são mais apenas uma reunião de material que já saiu na imprensa periódica, mas um produto original. Não só novo como também denso, capaz de servir de referência a outros trabalhos intelectuais. É o que se pode ver pelos livros que receberam o Prêmio Jabuti deste ano, todos de alto nível.

Com toda justiça, o primeiro prêmio ficou com Operação Araguaia, de Taís Morais e Eumano Silva, que revelaram os arquivos secretos oficiais sobre a guerrilha organizada pelo Partido Comunista do Brasil no que, depois, ficaria conhecido como ‘Bico do Papagaio’, uma área entre o Pará e Goiás (atual Tocantins) marcada pelos conflitos de terra. Além de penetrar nos arquivos das Forças Armadas, até então inacessíveis (cuja existência era negada pelo governo), os dois repórteres conseguiram aduzir suas observações e outras informações obtidas em pesquisa própria, que enriqueceu muito sua reconstituição da guerrilha. O livro foi editado com primor pela Geração Editorial, que se tornou a melhor editora de jornalismo.

Mundo de sombras

O segundo prêmio foi para a impressionante denúncia de Frederico Vasconcelos sobre a corrupção na justiça, Juízes no banco dos réus. O paraense Luiz Maklouf Carvalho, novamente premiado, ficou com o terceiro lugar, graças a Já vi esse filme – Reportagem (e polêmicas) sobre Lula e o PT, também da Geração Editorial, que documenta seu acompanhamento crítico da trajetória de Lula durante 20 anos (1984-2005). O material não deixa dúvida: os desvios éticos, morais e políticos do maior líder popular do Brasil começaram há muito tempo. Um deles, que pode ter dado causa aos demais, é não admitir a crítica. E, por derivação, só admitir a lisonja e a bajulação, o que Maklouf nunca lhe deu, muito pelo contrário.

Só lamento não haver lugar para Ministério do silêncio, o excelente livro de Lucas Figueiredo, de pesquisa tão ou mais sólida do que os anteriores, enveredando por uma seara pioneira na revelação do mundo das sombras (e, em geral, da ineficácia) do serviço secreto brasileiro, velho de 70 anos. No acervo desse serviço há poucas contribuições realmente positivas para o país, marcantes. A mais eficiente dessas organizações parece ser a mais profissional e a que ainda continua menos conhecida de todas: a do Ministério das Relações Exteriores. Lucas, que abriu sendas ainda à espera de novas incursões, certamente continuará a responder às questões que ele mesmo suscitou.

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Jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)