Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O jornalismo vai ao teatro

O jornalismo tem inspirado muito o cinema, bem menos o teatro. Entra em cartaz neste sábado, 5 de março, às 21h, a peça A entrevista, do dramaturgo Samir Yazbek. Com Lígia Cortez e Marcelo Lazzaratto (que também é o diretor), a peça conta a história de uma entrevista ao vivo, programada por um apresentador de televisão para homenagear a ex-mulher, uma conhecida escritora. Mas o que era para ser uma conversa sobre literatura se transforma num acerto de contas pessoal, numa reflexão sobre a condição humana. A peça fica em cartaz no Teatro Cultura Inglesa-Pinheiros (Rua Deputado Lacerda Franco, 333, telefone 3086-1297), em São Paulo, até 1º de maio, de sexta a domingo.

Yazbek, que tem escrito artigos sobre teatro e dramaturgia para a Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo e revista Bravo, tem no currículo peças conhecidas como O fingidor (Prêmio Shell de 1999), A máscara do imperador e A terra prometida. Formado em Cinema, firmou-se no teatro sob orientação do diretor Antunes Filho. Ensina em alguns cursos, sobretudo no Teatro do Centro da Terra, em São Paulo, onde cuida do Núcleo de Dramaturgia.

A entrevista explora mais a forma do que o conteúdo do jornalismo, diz Yazbek nesta entrevista por e-mail ao Observatório. ‘Também foi uma forma de brincar com a necessidade de falar, bastando para isso encontrarmos alguém que nos escute.’

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Você teve algum contato com o jornalismo – ou jornalistas – para escrever a peça?

Samir Yazbek – Não houve pesquisa de campo, a não ser na fase final, para conferir algumas referências técnicas do universo da televisão, que a peça apresenta. Atribuo a familiaridade com o tema ao fato de eu ter passado diante da TV minha adolescência, época de tantas descobertas, na década de 1980, quando o jornalismo, sobretudo o televisivo, amadureceu significativamente. O texto, de certa forma, se utiliza de um imaginário que se formou durante esse período, em que vi muitos programas de entrevistas.

Você diz que seus dilemas são a chave para continuar a escrever. Que dilema você foi buscar no jornalismo para transpor à peça?

S. Y. – A grande questão do trabalho se resume a um paradoxo. É possível que um entrevistado se revele diante das câmeras, justamente numa situação que colabora, e muito, para o cultivo das aparências? A situação dramática do texto – porque, afinal, se trata de teatro – propõe um encontro público em que se explora o potencial das relações privadas, por tratar-se de uma entrevista promovida por um jornalista com uma escritora, sua ex-mulher. Também, em outro sentido, foi uma forma de brincar com a necessidade de falar, bastando para isso encontrarmos alguém que nos escute plenamente.

Jornalismo é um bom tema para teatro? Para o cinema tem sido…

S. Y. – No caso, na peça o jornalismo está presente mais como forma e menos como conteúdo, fazendo com que uma mera conversa se transforme num autêntico diálogo, teatral e filosófico, nos moldes socráticos. Não deixa de ser uma utopia para a televisão, mas algo que acontece em alguns cantos do mundo. Quanto ao conteúdo, o foco me parece o relacionamento humano em sua complexidade.