Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O poder das redes de informação

A Onda Rosa-Choque é um esforço de reflexão sobre a amplitude e a intensidade política que a cultura digital pode liberar na sociedade brasileira. Trata-se de um conjunto de análises do potencial transformador do compartilhamento de produtos e bens culturais a partir das redes de informação. Mas, os textos aqui reunidos não se limitam as tentativas de pensar o presente, eles querem disputar os caminhos para o futuro.

Enquanto escrevo este prefácio, mobilizações explodem neste Brasil de junho de 2013, como se inspiradas na lógica do hackativismo. Sem grandes líderes, sem carros de som, organizadas por microarticuladores, com o apoio de coletivos culturais, radicais, ambientais, nerds, hackers, rappers, jovens da periferia, entre tantos outros mobilizadores, os protestos desafiam a compreensão daqueles que debochavam dos “militantes de sofá”, “agitadores do Twitter”. Pois então, estamos assistindo a um movimento distribuído em que os “sofás” desceram para as ruas.

Os textos escritos pelo produtor cultural, pesquisador e ativista Rodrigo Savazoni fazem parte da antessala dessa emergência das redes e da tomada das ruas que tanta falta fazia ao país. A onda rosa choque contra o poder careta, verticalizado, excessivamente burocratizado, tecnocrático, insensível e opaco parece estar ocorrendo agora, com novas cores além do azul e vermelho, bem mais misturadas, remixadas com as diversas tonalidade ideológicas que assumiram as ruas.

Hora boa

Savazoni já perguntava em suas reflexões sobre o que estaria em debate: “Centralização contra descentralização? Formas de ação espontâneas ou organizadas? Ações emergentes, construídas de baixo para cima, ou ações de impacto, construídas clandestinamente e compartilhadas de cima abaixo?” De certo modo, tudo está em disputa. O processo é tão importante quanto suas finalidades. Se os ativistas pela radicalização da democracia não se dispersarem nas redes distribuídas e não se envolverem na intensa conversação das plataformas de relacionamento, poderemos ver a onda rosa se quebrar diante de ondas conservadoras.

Esperamos que o contágio da ética hacker, dos coletivos libertários, das ocupações, dos festivais de cultura digital, dos pontos de cultura, sejam superiores em encantamento e convencimento social do que o reacionarismo dos novos capitães do mato, da criminalização do compartilhamento de arquivos digitais e dos downloads, dos colonizadores genéticos, dos fundamentalistas contrários a diversidade cultural, religiosa, étnica e de orientação sexual.

As multidões estão ativas. Redes de opinião enfrentam outras redes de opinião. A bipolaridade se desfaz em meio aos múltiplos conflitos. Agora, é bem evidente que poder comunicacional cada vez mais está na capacidade de formar e reconfigurar redes, como bem relatou o sociólogo Manuel Castells. Os textos que Rodrigo Savazoni discutem de modo instigante esse cenário. São escritos mais otimistas que cautelosos. Também por isso, este livro vem em boa hora. Certamente, é fruto da emergência dos movimentos interconectados e da experiência efetiva de Rodrigo, principalmente na Casa de Cultura Digital. É uma tentativa de influenciar e destacar que os ciberviventes precisam hipertrofiar a biopolítica das modulações proibicionistas; mais do que o “do-in antropológico” do Juca-Gil, é preciso estimular o hackeamento, a inversão, a ocupação e outras linhas de fuga.

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Sobre o autor

Rodrigo Savazoni é realizador multimídia, pesquisador, jornalista, professor e gestor público. Foi um dos fundadores da Casa da Cultura Digital, espaço de colaboração e experimentação que teve origem em São Paulo mas foi se multiplicando Brasil afora.

Atualmente é Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo e integra o Grupo de Pesquisa em Cultura Digital e Redes de Compartilhamento da Universidade Federal do ABC, onde cursa sua pós-graduação em Ciências Humanas e Sociais.

Como ativista que se banhou no outromundismo do Fórum Social Mundial, participou da fundação do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação, colaborou com a Ciranda da Informação Independente, com várias ONGs, entre elas o Laboratório Brasileiro de Cultura Digital, do qual foi sócio-diretor.

Como gestor público, trabalhou como assessor na Secretaria Geral da Presidência da República em 2003 e chegou a ser editor chefe da Agência Brasil, então administrada pela Radiobrás, hoje EBC. Também foi um dos articuladores do Fórum Nacional das TVs Públicas e participou da concepção e organização, em parceria com o Ministério da Cultura, dos Fóruns da Cultura Digital Brasileira de 2009 e 2010.

Entre os trabalhos que mais lhe dão orgulho está a criação da Plataforma CulturaDigital.Br, uma rede social voltada à construção de políticas públicas que recebeu Menção Honrosa no Prix Ars Electronica, o maior prêmio europeu de arte e tecnologia.

Como realizador multimídia, desenvolveu inúmeros projetos, como a série documental “Cinco Vezes Cultura Digital”, para a qual codirigiu Remixofagia – Alegorias de Uma Revolução. Também foi um dos idealizadores e construtores do projeto Produção Cultural no Brasil. Ainda gosta, vez ou outra, de desenhar plataformas.

Como jornalista, trabalhou sempre com internet. Começou a carreira em 1999 no Portal do Estadão. Em 2008, voltou ao lugar do primeiro emprego para dirigir a área de Conteúdos Digitais, quando recebeu o Prêmio de Reportagem Multimídia pela plataforma Vereador Digital. Em 2008 também foi agraciado com o Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos pelo hipervídeo coletivo Nação Palmares, realizado na Agência Brasil.

Também colaborou com publicações alternativas e independentes, como Fórum, Revista do Brasil, Caros Amigos, Carta Maior, Select, Le Monde Diplomatique, entre outras.

Em 2011, coordenou a realização do Festival Cultura Digital.Br (http://www.culturadigital.org.br), que ocorreu no Rio de Janeiro reunindo experiências de cultura digital de mais de 20 países.

Foi professor convidado em 2009 e 2010 do curso de pós-graduação de jornalismo multimídia da PUC-São Paulo. Em 2013, recebeu convite para lecionar na Escuela Internacional de Cine y Televisión de San Antonio de Los Baños, Cuba.

Foi um dos organizadores do livro Vozes da democracia (Imprensa Oficial, 2007) e é coautor, com Sérgio Cohn, do livro Cultura Digital.Br (Azougue, 2009).

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Sergio Amadeu da Silveira, doutor em ciência política, é professor da Universidade Federal do ABC e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil