Quando o grupo New York Times Company informou estar preparado para fechar ojornal Boston Globe, na semana passada, a notícia foi capa do Washington Post. Já no New York Times, que pertence à mesma empresa do Globe, a informação foi citada no segundo parágrafo de um artigo da seção de economia, revelou o ombudsman do jornalão em sua coluna de domingo [10/5/09].
No começo de abril, foi publicada, na primeira página do Globe, a primeira ameaça de fechamento do jornal, a não ser que o sindicato concordasse com grandes concessões. A redação do NYTimes, que só tomou conhecimento da notícia após ela ter sido divulgada no sítio do Globe, publicou um artigo aprofundado sobre o assunto na seção de economia. Na ocasião, o presidente do grupo, Arthur Sulzberger Jr, e a porta-voz Catherine Mathis recusaram-se a confirmar a informação. O diário não publicou mais nada até a semana passada, com artigo sobre as negociações com o sindicato. Ambos foram escritos pelo jornalista Richard Pérez-Peña, que ressalta que recentemente ocorreram muitas negociações sérias com sindicatos e o diário tenta divulgar os momentos mais importantes.
O fato do maior e mais influente jornal de New England ser fechado gerou críticas de leitores, que reclamaram sobre a recusa do grupo de se explicar e do modo como o carro-chefe da empresa, o NYTimes, lidou com o tema. O jornalão, que pede transparência de todos os tipos de instituições públicas, ficou em uma posição desconfortável ao tentar ajudar o próprio grupo a não despertar tanta atenção para o assunto. ‘Acreditamos que negociações devam ser privadas’, disse Catherine a Hoyt. Para o ombudsman, esta é a visão corporativa; a visão jornalística, por sua vez, foi prejudicada.
Na semana passada, o maior sindicato do Globe, o Boston Newspaper Guild, concordou em deixar seus mais de 600 membros votarem um pacote de cortes, congelamento de aposentadorias e outros temas. O Globe tem um futuro incerto pela frente. Sua tiragem caiu 13,7% e o diário deve ter US$ 85 milhões de prejuízo este ano. As concessões que o jornal pensa conseguir dos sindicatos deve gerar uma economia de US$ 20 milhões. A New York Times Company perdeu US$ 74,5 milhões nos primeiros três meses deste ano e impôs reduções de gastos em todos os seus veículos, incluindo o NYTimes.
Mais um?
Na opinião dos editores do NYTimes, foi feito um bom trabalho na cobertura do caso. ‘Se realmente acreditássemos que o jornal seria fechado esta semana, teríamos dado destaque de capa’, afirmou o editor-executivo Bill Keller. Janet Robinson, executiva-chefe do grupo, foi mais realista. ‘Caracterizar a atual fase como de negociação não é preciso e não mostra a gravidade da situação financeira do Globe‘, ressaltou.
Bruce Headlam, editor responsável pela cobertura de questões sobre a mídia, afirmou que o NYTimes deu a mesma ou maior atenção ao Globe que a diários em crise em São Francisco, Filadélfia e outras cidades. ‘Temos muitas matérias sobre jornais na capa, ao ponto que estávamos começando a ser narcisistas na nossa cobertura. O Globe não é o primeiro [a enfrentar fechamento]’, refletiu.
É verdade que a situação financeira não é das melhores para muitos jornais. Mas Hoyt acredita que, quando a pauta envolve um dos mais importantes grupos da indústria jornalística do país, e trata-se do seu próprio grupo, é uma obrigação especial ser agressivo na divulgação, o que não ocorreu. Há questões a serem respondidas: como o Globe, pelo qual o grupo pagou US$ 1,1 bilhão em 1993, ficou em pior situação que muitos outros jornais? Qual a estratégia do grupo? Um dos mais importantes jornais do país pode realmente ser fechado? Pérez-Peña pediu entrevistas com Sulzberger, mas ele negou.
Hoyt indagou Keller sobre a dificuldade de cobrir a própria empresa. ‘Tem pessoas que pensam que o que você escreve, se não foi ditado pelo departamento de relações públicas, foi fortemente influenciado pelo instinto de auto-preservação. Tentamos fazer um trabalho equilibrado, o mesmo que fazemos quando escrevemos sobre outra instituição, mas, historicamente, jornais não são bons nisto’, confessou. Já Sulzberger admite que ‘não há nada mais difícil’ para uma organização de mídia do que cobrir a si própria. ‘Estou muito orgulhoso de como o Globe e o NYTimes estão lidando com a cobertura das negociações com os sindicatos’.