Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Realidade Re-Vista traz jornalismo audaz

Talvez só tivesse sido possível realizar no Brasil um projeto jornalístico tão audacioso e bem-sucedido como o da revista Realidade na década de 60: 1966.

Muitas e raras condições para uma ‘tempestade perfeita’ se juntaram: um grupo de jornalistas de extraordinário talento, um público ansioso por insumos intelectuais que lhe permitissem compreender os fenômenos da sua época plena de transformações de toda espécie, um mercado que comportava iniciativas arrojadas, uma empresa jornalística com saúde financeira e disposta a correr riscos.

O fato é que não houve antes e provavelmente nunca haverá nada parecido.

Isso explica o fascínio que Realidade provoca até em pessoas que nem eram nascidas quando ela deixou de existir, 42 anos atrás (uma sucessora homônima a sucedeu até 1976 sem lhe chegar aos pés), mais ainda nas que esperavam ansiosamente uma vez por mês o dia em que ela chegava às bancas, sempre instigante, inteligente, surpreendente.

Destaque cultural

Dois veteranos daquela aventura, José Carlos Marão e José Hamilton Ribeiro, resolveram, com o editor José Luiz Tahan, revivê-la um pouco na forma de livro.

Escolheram e colocaram juntas algumas das reportagens que a revista publicou. E produziram comentários e textos atuais sobre elas e sobre o grande projeto.

Num deles, Marão enfatiza que, ao contrário da mitologia criada, não foi na política, mas na área da cultura, que Realidade foi de fato grandiosa no seu conteúdo.

A identidade entre leitores e revista era intensa porque ela os ajudava a compreender as perplexidades que pílula anticoncepcional, liberação feminina, conquista do espaço, igualdade racial, urbanização acelerada, transplantes cardíacos, teologia da libertação lhes causavam.

Por ser mensal, o que muitos consideravam loucura, sua pauta tinha de se livrar do cotidiano imediato, no que ela radicalizou, tendo feito algumas edições especiais que poderiam ter a perenidade de um livro (como o relançamento de uma sobre a mulher brasileira em 1967).

Por ser do tempo em que era proibido proibir, seus repórteres tinham a liberdade de escrever como quisessem e, como eram muito bons, souberam tirar pleno proveito dessa liberdade, para total desfrute da audiência.

Realidade Re-Vista leva os leitores para aquela época (de volta, no caso dos mais velhos, talvez pela primeira vez, no dos jovens) com os textos históricos e os que reconstituem a história. José Hamilton Ribeiro tem a minúcia de contar que filmes estavam em cartaz em abril de 1966, as cotações do dólar, os comentários de senhoras mineiras à coleção de Pierre Cardin em que as saias curtas preponderavam.

Essa viagem ao passado vale a pena ser feita. Inclusive para entender melhor o presente e vislumbrar o futuro com mais nitidez.

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Jornalista