‘Anúncios são as únicas coisas verdadeiras que os jornais publicam.’ (Thomas Jefferson, em carta de 1819 a Nathaniel Macon)
Desde a realização do IV Congresso de Publicidade, na primeira quinzena do mês passado, tenho lido, na imprensa, diversas invectivas contra esta nova e petulante pretensão de publicitários e marqueteiros: de estender o conceito de liberdade de expressão aos seus anúncios, produtos e serviços.
À maneira de Voltaire, permitam-me definir algumas premissas. Artigos a que me vou referir saíram no site do Observatório da Imprensa, um espaço que muito aprecio, criado pelo competente Alberto Dines. Logo, não são todos os jornalistas que sustentam essas opiniões contra a P&M. Só muitos deles.
Diferentemente do citado Thomas Jefferson – que escreveu muitas coisas ótimas (gosto muito daquela frase que diz que o povo tem direito de pôr na rua seus governantes quando eles não prestam) e outras mais ou menos –, não concordo que os anúncios sejam as únicas coisas verdadeiras nos jornais, nas revistas, no rádio ou na TV.
Embora haja muita coisa nos veículos de comunicação que não presta para quase nada – a não ser entreter o não-tão-respeitável público – e ainda exista muita matéria desinformada e até deliberadamente falsa, em geral nossos profissionais de informação são gente séria, sobretudo os mais antigos. Da mesma forma, na área de publicidade há anúncios verdadeiros para bons produtos e os há mentirosos para serviços desonestos e produtos enganadores, ou até prejudiciais ou perigosos.
‘Pra nós é justo, pros outros é marmelada’
Todos aceitariam que o fato de haver as frutas podres nas plantações ou animais infestados por doenças contagiosas nos rebanhos não são justificativa para o genocídio universal (em que pesem algumas iniciativas, nesse sentido, advindas – em geral – do preconceituoso primeiro mundo). Mas, ao tratar de P&M, muitas vezes se usam os famigerados dois pesos e duas medidas.
Carlos Knapp, um ex-publicitário, queixou-se no Observatório que, nos anúncios, só escrevia o que queria o anunciante. Será que queria escrever o que o cliente não queria? O seu artigo tem, como título ‘57 bilhões contra a cidadania‘. Sabem como ele chegou a esta cifra? Pegou os números oficiais da receita anual de toda a indústria de comunicação, divulgados pela Abap no IV Congresso – inclusive as vendas e assinaturas de publicações, pesquisas de mercado etc. – e considerou que essa grana é mobilizada pela mídia contra os cidadãos.
No mesmo site, Paula Martins e Maíra Magro escrevem que ‘liberdade de expressão publicitária’ (assim mesmo, entre aspas, como se fosse outra língua – ou palavrão) é uma falsa discussão, concluindo que ‘quem deve definir os limites da regulamentação é a sociedade […], e não os publicitários e anunciantes isoladamente’ – falseando o papel do Conar e os princípios da auto-regulamentação, que nunca se propuseram a substituir a fiscalização da sociedade pelo Estado, mas a colaborar com ela [ver ‘`Liberdade de expressão publicitária´, uma falsa discussão‘].
A atitude de certos setores da imprensa sobre quem ‘merece’ liberdade de expressão lembra uma frase famosa do publicitário Neil Ferreira: ‘Prêmio pra nós é justo, pros outros é marmelada.’
O título do presente artigo é, sim, baseado no do livro de Jane Austen, Orgulho e Preconceito.
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Jornalista