Matérias de domingo são em geral mais longas e mais cheias de penduricalhos que as do resto da semana, mas nem sempre são mais informativas, mais importantes e mais carregadas de novidades. Neste domingo (20/1), boa parte do material econômico – publicado nos cadernos de Economia ou de Política – trouxe a marca das melhores pautas de fim de semana. Os efeitos da crise nos Estados Unidos, a gastança do governo, a política das emendas orçamentárias e a situação do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento às vésperas de seu primeiro aniversário foram alguns dos grandes temas. Em todos, algum tijolinho de informação relevante foi acrescentado.
O Estado de S.Paulo destacou as conseqüências da crise americana para o Brasil. Durante a semana, o próprio Estadão e a Agência Estado haviam divulgado as primeiras críticas de peso à idéia do descolamento (decoupling) dos emergentes. Segundo essa tese, uma desaceleração da maior economia do mundo pouco afetaria, desta vez, os grandes emergentes como China, Índia e Brasil. Essa avaliação, naturalmente, foi encampada com entusiasmo pelo governo brasileiro.
As coisas podem não ser bem assim, segundo a matéria do Estadão. Integrantes da equipe econômica federal mostram-se agora menos otimistas e já admitem um crescimento abaixo de 5% em 2008. Mas este não é o ponto mais importante. Pode-se gastar muito tempo e muito papel, sem grande proveito, com especulações sobre a expansão provável da economia.
Dinheiro público
A parte mais interessante da história é a discussão sobre como o esfriamento da economia nos Estados Unidos pode afetar a atividade brasileira. O enfraquecimento dos preços das matérias-primas pode ser parte da resposta. A hipótese é discutível, mas não desprezível, e vinha sendo tratada sem grande atenção. Não há no material nenhum catastrofismo, mas a reportagem contribui, sem dúvida, para animar e enriquecer uma discussão até agora muito morna.
A matéria mostra, além disso, um governo despreparado para enfrentar os efeitos fiscais de um crescimento menor que o previsto até há pouco tempo. Se a arrecadação de impostos for afetada, o corte orçamentário terá de ser maior que aquele estimado para compensar a perda da Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF).
Mas que orçamento é esse? Uma reportagem do Globo sobre as emendas formuladas por parlamentares fluminenses dá uma idéia de como deputados e senadores trituram verbas orçamentárias. Não há grande surpresa. Muito dinheiro vai para ONGs e para pequenos projetos de alcance municipal, miuçalhas incompatíveis, obviamente, com qualquer idéia de planejamento em escala nacional. Não há surpresa, de modo geral, mas é importante ver as emendas identificadas quanto à sua destinação, ao seu valor e aos seus autores. Se a reportagem fosse mais ampla e incluísse a atuação de parlamentares de outros estados, o leitor teria uma preciosa descrição de como seu dinheiro é usado para os objetivos eleitorais de Suas Excelências.
Lado trágico
O assunto é particularmente importante, neste momento, porque governo e parlamentares, ao discutir cortes no orçamento, concordaram em manter a tesoura bem longe de boa parte das emendas. Em ano de eleições municipais, os parlamentares se empenham maior vigor na distribuição de verbas às clientelas paroquiais.
Globo e Folha de S.Paulo, com enfoques diferentes, trataram dos investimentos classificados como prioritários pelo governo federal. O Globo mostrou o atraso dos projetos do PAC destinados ao estado do Rio de Janeiro. A Folha deu um quadro mais amplo, mostrando como o PAC permanece emperrado às vésperas de seu primeiro aniversário. Dos 16,5 bilhões de reais previstos para 2007, o governo federal só 5,4 bilhões de reais. Boa parte dos projetos está encalhada em processos legais e trâmites burocráticos e muitos deles sequer foram plenamente desenvolvidos no papel.
O Estado de S.Paulo ainda ofereceu, na área econômica, mais duas boas leituras para preencher o domingo chuvoso. Uma delas foi uma reportagem sobre os gastos do governo federal com viagens, 1,2 milhão de reais por dia durante quatro anos. Parte dessas despesas certamente é injustificável. Outra boa reportagem mostrou a catastrófica situação da defesa sanitária animal pouco mais de dois anos depois do surto de aftosa em Mato Grosso do Sul. Uma grande foto mostra um posto de fiscalização abandonado na fronteira do Brasil com o Paraguai, no município de Sete Quedas. O trânsito de animais, por ali, é absolutamente livre. Reportagem oportuníssima, quando o governo brasileiro é pressionado pela União Européia por causa da política sanitária. A pressão européia reflete, em parte, os interesses de grupos protecionistas, especialmente irlandeses. Isso não é segredo nem novidade. O lado trágico da história, do ponto de vista comercial, é o governo brasileiro continuar mostrando-se absolutamente relapso no trato de uma questão de centenas de milhões de dólares.
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Jornalista