A mídia brasileira se divide numa missão de caráter ambíguo. No entanto, com o mesmo propósito de sempre: a audiência.
Sensibilizar, chocar, impressionar e, se possível, fazer chorar. Em decorrência do acidente do dia 17/07 com o avião da TAM que, se estima, levava 186 passageiros, a mídia, travestida de porta-voz da vida brasileira, está tendo que revelar todo o seu potencial de cinismo. Os noticiários gravitam do tom fúnebre e melancólico, para um frenesi histérico. Diante de um acidente desta magnitude, que acontece durante a realização do Pan, a mídia nitidamente perde o prumo.
Por força da realidade eletrizante dos Jogos Pan-americanos, as emissoras são guiadas, por uma espécie de desejo inconsciente e ímpeto dourado das conquistas das medalhas dos atletas, a vibrarem de alegria e se esquecem da tragédia. O vaivém das emoções desencontradas opera como distúrbio cognitivo por excelência.
O mais bizarro é que alguns apresentadores, devido a uma óbvia inexperiência para lidar com uma situação tão diametralmente oposta, se deixam contaminar pela euforia e calor dos fatos, o que deixa no ar um verdadeiro descompasso entre a cobertura jornalística e o distanciamento crítico.
Imaturo e acrítico
É perfeitamente compreensível que o jornalista, como ser humano comum que é, se emocione ou sinta pena das vítimas. No entanto, o que não tem cabimento é que dentro de um mesmo bloco de telejornal se transmute de um velório para o pódio. Esse tipo de cobertura deixa transparecer um mundo meramente virtual e que nada, nem ninguém, existe de fato. Fico perplexo ao ver na mídia essa aura fantasmática que só se rende à notícia e não pondera o lado humano da vida.
Esse tipo de situação paradoxal serve para expor as vísceras de um jornalismo imaturo e acrítico, que se presta a representar todos os tipos de personagens para alcançar o primeiro lugar em ‘nossos corações’ e, principalmente, a medalha de ouro da audiência.
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Jornalista, poeta e músico, Niterói, RJ