A escolha do escritor Mário Vargas Llosa, do Peru, para o Prêmio Nobel de Literatura deste ano, foi uma homenagem da Academia sueca – a segunda em um século – à imprensa e a literatura latino-americana. Ou, mais especificamente, aos repórteres e à reportagem.
Hoje aos 74 anos, Llosa sempre produziu uma literatura com um estilo enviesado com o jornalismo. Às vezes panfletário, outras denso, mas quase sempre direto e bem humorado, nunca fez concessões para ser bem vendido. Contudo, suas criações buscaram e alcançaram uma abrangência quase longitudinal. O que emprestava uma dimensão planetária à sua emocionalidade, fazendo com que quem consumisse em Tóquio suas invenções sentisse o mesmo prazer de quem as provasse na Venezuela.
Desde jovem ele considerava que sua literatura teria mais chance de tornar-se mundial se fosse irradiada a partir do núcleo literário mais fértil do mundo – o que aconteceu a Paris no segundo quartel do século 20, quando a efervescência da criatividade literária do pós-guerra trouxe à tona estilos de gênios como Marcel Proust. Por isso aproveitou uma chance que lhe foi dada pelo governo peruano para engajar-se como embaixador do Peru na França, aproveitando o tempo disponível não só para produzir novos romances como para difundir a cultura peruana e latino-americana.
Uma injeção de ânimo
Potencializou como ninguém essa oportunidade, criando, a partir daí, um relacionamento tão agudo, não só com o mundo literário europeu, e aprofundando-o com a própria literatura do continente latino-americano. Mas o que a eleição de Llosa como Nobel da Literatura deste ano consagra é principalmente a vertente segundo a qual cada repórter nada mais é do que um escritor nato. Talvez a salvação do jornalismo – já se disse – esteja no aprofundamento da reportagem pelos caminhos da literatura. E Llosa deixa isso bem claro em Pantaleão e as Visitadoras (1977) e em Tia Julia (1973).
Na década de 70 e meados de 80, a criação literária mundial andou impactada com o realismo fantástico do primeiro escritor latino-americano ganhador de um Nobel, o colombiano Gabriel García Márquez, tendo à frente o seu magistral Cem anos de solidão. Muitos escritores enveredaram por esse caminho, menos Llosa, que manteve um estilo quase jornalístico mas com um conteúdo humanístico próprio, sem esquecer sua latinidade paralela ao descortínio quixotescas de Miguel de Cervantes.
Com a sagração de Llosa, estão homenageados todos os repórteres do continente e recebem uma injeção de ânimo especial aqueles que ainda veem na reportagem, especialmente a investigativa, o coração onde pulsa o verdadeiro jornalismo, cuja sobrevivência só depende da vontade de quem o faz e o edita.
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Jornalista