Panorama de segmentos dos veículos do Sul se altera com maior presença de mídias digitais
A região Sul acompanhou a tendência nacional de diminuição dos desertos, a partir do pente fino feito pela equipe durante o mapeamento. Neste ano, com o intuito de aprimorar sua precisão, o Atlas se focou na revisão dos desertos de notícia, aqueles municípios que não possuem nenhum veículo jornalístico cadastrado, ao longo de todas as regiões do país. Com isso, os voluntários se dedicaram a consultar cada município individualmente, em busca de veículos que pudessem ter surgido ou passado despercebidos.
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No total, 101 municípios dos três estados eram considerados desertos e foram identificados como tendo veículos de comunicação. O Rio Grande do Sul foi o que mais perdeu desertos: 58, frente a 31 no Paraná e 12 em Santa Catarina. A proporção de municípios que são desertos é constante nas três UFs, girando entre 45% e 48%. Aliás, é a primeira vez que a região Sul demonstra uma média de desertos abaixo de 50%. Na edição anterior do levantamento, os desertos de notícia perfaziam 54,5% dos municípios do Sul.
Veículos em geral
A região Sul permanece a segunda região brasileira com mais veículos de comunicação – 3478, ou 25% do total. Isto representa a mesma proporção do último levantamento do Atlas, com uma variação pequena (em torno de 150) na quantidade de veículos jornalísticos totais identificados na região. Esta diferença se deve justamente à atenção especial dedicada aos desertos de notícia neste ano, embora o nível reduzido da diferença demonstre que a metodologia aplicada pelo mapeamento cobre adequadamente o território. Em termos proporcionais à população, a região Sul é a que concentra uma maior média de veículos, junto à região Centro-Oeste: cerca de 14 para cada 100 mil habitantes.
Já a proporção de meios entre os três estados do Sul permanece semelhante ao identificado anteriormente no Atlas. O Rio Grande do Sul lidera com 1377, o que é 10% dos veículos totais do Brasil, seguido pelo Paraná com 1210, e por Santa Catarina com 891.
A pandemia e a consequente crise econômica, que age principalmente sobre o bolo publicitário, atingiu em cheio os veículos. No entanto, o jornalismo local ainda resiste. Durante o levantamento, se destacou a Folha Montecarlense, de Monte Carlo, município com cerca de 10 mil habitantes no oeste catarinense. O veículo, exclusivamente digital, surgiu em março de 2021, em plena pandemia, e produz conteúdo local. Este tipo de experiência, embora localizada, demonstra que existe uma demanda por informações hiperlocais, algo que pode ser suprido por iniciativas enxutas, ágeis e focadas.
O crescimento de iniciativas online, aliás, é notável. Atualmente, a região Sul apresenta uma divisão quase equânime entre estações de rádio, veículos impressos e veículos online, com as distribuições proporcionais entre estes sendo, respectivamente, 33%, 32% e 29% do total dos meios. Emissoras e retransmissoras de televisão, por conta de sua estrutura mais cara, são menos comuns e representam apenas 5,5% dos veículos jornalísticos nos três estados.
Este movimento de equiparação entre os três meios mais comuns já vinha sendo observado em edições anteriores do Atlas. Isto se dá principalmente por dois movimentos. Por um lado, o maior lançamento ou transição de veículos para a internet, como um meio de cortar custos e alcançar uma maior audiência. Por outro, o Atlas têm identificado mais veículos com versões online, principalmente rádios e jornais – que no mapeamento contam como veículos distintos. Estas são frequentemente versões secundárias, com menos dedicação dos veículos, muitas vezes com apenas replicação do conteúdo publicado no ramo principal. É comum, por exemplo, que sites de emissoras de rádio tenham seções de notícias, mas estas sejam atualizadas com menos frequência. Embora exista uma ideia constante de que o “futuro” e a sustentabilidade estejam no online, a execução desta no interior ainda é iniciante, em muitos casos. Nestas situações, os motores desses veículos para interação online acabam sendo os perfis em redes sociais, por sua facilidade de uso e acesso ao público. Se observou durante o mapeamento, consistente com o identificado em outras edições do Atlas, que é comum veículos sem nenhuma outra presença online utilizarem apenas redes sociais como forma de interação – com o Instagram e o Facebook como presenças dominantes.
No entanto, a adoção dos veículos a plataformas online é desigual na região. O Paraná tem o maior número de iniciativas digitais, 457, frente a 348 do Rio Grande do Sul e a 218 de Santa Catarina. De fato, a proeminência do Paraná neste quesito se mantém a nível nacional: é o segundo estado com maior número de veículos online, atrás apenas de São Paulo. Um elemento disto são os veículos que consistem exclusivamente de perfis em redes sociais ou blogs – um fator que é mapeado pelo Atlas e no qual os paranaenses também se destacam. Dos 457 veículos online, 385 (85%) são blogs ou páginas de redes sociais, um percentual muito superior ao do Rio Grande do Sul (68%) ou de Santa Catarina (53%). De fato, a edição 5 do Atlas demonstra que o Paraná já possui mais blogs/redes sociais do que emissoras de rádio, um marco no ecossistema local de mídia. Em toda a região Sul, 26% das iniciativas totais são blogs ou páginas de redes sociais.
Já os gaúchos se destacam com os impressos: o RS tem o segundo maior número de impressos do país, atrás também de São Paulo, e o terceiro maior de emissoras de rádio. Já Santa Catarina se destaca por ter 40% mais de veículos impressos do que o Paraná, mesmo com uma população menor.
Outro elemento que alterou a paisagem dos meios observada pelo Atlas é uma maior proeminência das rádios comunitárias. Especialmente em cidades pequenas, elas são formas emergentes e baratas de a comunidade falar com ela mesma – embora nem sempre com um intento noticioso.
Dificuldades na metodologia
A revisão de municípios considerados desertos propõe desafios naturais, uma vez que estas são localidades normalmente mais isoladas e com uma população menor. Assim, o contato com estes locais por parte dos voluntários normalmente é mais trabalhoso, visto que o contato via meios digitais é frequentemente inexistente.
Um exemplo dessa dificuldade é o jornal O Correio, que circula impresso na região de Fortaleza dos Valos, município de 4600 habitantes no norte do Rio Grande do Sul. A julgar por sua única presença online, uma página do Facebook que não vê atualizações desde 2017, o jornal não estaria mais ativo. No entanto, o contato por telefone demonstra que segue vivo, com periodicidade semanal e circulação em municípios próximos. Vários, no entanto, não possuem número de telefone visível ou ativo. Quanto mais o Atlas avança aos rincões do Brasil, por conseguinte se tornando cada vez mais fiel, mais se dificulta a atualização e a identificação de novos veículos.
Formas de receita
A avaliação do ecossistema jornalístico local por meio da metodologia do Atlas permite que se encontre as situações diversas nesse meio tão distribuído. Por exemplo, embora a imensa maioria dos veículos tenha como principal – e normalmente única – fonte de receita a publicidade, algumas organizações fazem tentativas com outras opções. Nos centros urbanos, a virada para assinaturas e receitas da audiência é visível. No interior, uma possibilidade ainda pouco explorada mas visível é a prestação de serviços para outras empresas. No caso da Rádio Progresso, em Derrubadas, no norte do Rio Grande do Sul, existe uma parceria para desenvolver sites para clientes. Este tipo de iniciativa pode ser uma fonte alternativa para veículos “produtizarem” eventuais expertises que tenham à disposição, seja em assuntos gráficos, digitais ou de outra ordem.
E você, o que vai encontrar? Confira os dados completos da pesquisa no site novo do Atlas, faça as suas análises e descubra um pouco mais sobre onde está (e onde não está) a mídia local no Brasil.
Participaram os seguintes voluntários:
Adriéli Jordana Wrasse
Adriéli Wrasse
Amir Bliacheris
Ana Lara Chagas Oliveira
Ana Luiza Mattos de Lara
Ana Paula Vaneli
ngelo M. Rockenbach
Anie Rodrigues
Anna Clara Tesche
Carolina Goettems de Oliveira Appel
Christiano Gonzaga
Cintia Xavier
Clarissa Gomes
Cláudia Pavão
Daiane M. de L. Silva
Douglas Henrique
Dyeimine Schlindwein
Eder Carlos Wehrholdt
Eduarda Hurieh
Eduarda Mello
Fabiana Damian
Guilherme Freling
Heryvelton Martins
Isadora Pimentel Terra
Jaqueline Andriolli Silva
Jenifer Teixeira
João Valter Passos
Jonathan Karter
Julia Magalhães
Júlia Urias
Karina Janz Woitowicz
Kássia Porto Alegre
Kenzo Yoshida
Leonardo Lopes
Leriany Barbosa Tizon
Letícia Almansa Klusener
Luana Figueiredo Brabosa
Manoel Moabis Pereira dos Anjos
Marcelo Bronosky
Marizandra Rutilli
Martina Ferreira Sturm
Nicole Silva de Medeiros
Patryck Cachoeira
Paula Fabricio
Pedro Aguiar
Pietra Marques
Rafael Schoenherr
Raíssa Gomes Figueiredo
Roger Dalcin
Samara Wobeto
Taís Schakofski Busanello
Tamires Limurci dos Santos
Thais Venâncio
Valentina Biason
Vinicius Sampaio Rodrigues
Vinicius Tóffoli
Vitória Garcia
Vitória Matos
Vivian Faria
Wellington Hack
Com o apoio das seguintes instituições:
IELUSC
PUCRS
UEPG
UFRGS
UFSC
UFSM
Unicentro
UNIPAMPA
UNIPLAC
UNISC
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Marcelo Fontoura é professor de jornalismo digital e de dados na Escola de Comunicação, Artes e Design Famecos da PUCRS e professor substituto na Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da UFRGS. Doutor em Comunicação Social pela PUCRS, com estágio de doutorado-sanduíche na Northwestern University através de bolsa de estudos Capes. Consultor da International Fact Checking Network para avaliação de iniciativas de fact-checking ibero-americanas. Foi fellow do International Center for Journalists (2015) no programa A Digital Path for Entrepreneurship and Innovation.