Uma pesquisa recente em Florianópolis revelou que quase 80,6 % dos entrevistados não se mostram dispostos a meter a mão no bolso para pagar por informações jornalísticas. O resultado, corroborado também por outras pesquisas aqui e no exterior, indica que as pessoas não consideram as notícias essenciais ao seu dia a dia.
O fato de o produto jornalístico ser visto como pouco relevante mostra a falta de consciência das pessoas em geral sobre o valor da informação na era digital e funciona como sinal de alerta sobre a fragilidade futura da sustentação financeira de organizações e profissionais do jornalismo.
Crescem as evidências da necessidade de pensar a notícia como um valor social a ser incrementado para que ela passe a integrar o orçamento individual com um grau de importância similar ao da educação e do entretenimento. Trata-se de uma tarefa que os jornalistas têm melhores condições de desempenhar porque, mais do que ninguém, eles sabem o valor de uma notícia, tanto que dependem dela para sobreviver.
As pesquisas deixam também bastante claro que a relação entre a notícia e o público será marcada pelo distanciamento e pela imprevisibilidade, enquanto o jornalismo e a imprensa não se derem conta de que as pessoas ainda não veem a informação como algo indispensável à sua performance social. Com um orçamento doméstico marcado pela inexistência periódica de sobras, cada vez mais as pessoas passam a tratar a notícia como algo descartável.
Esta condição dificulta enormemente o planejamento futuro de atividades jornalísticas tanto por indivíduos autônomos como por empresas. Sem um mínimo de previsibilidade e estabilidade, a produção de notícias torna-se uma aventura constantemente sujeita a revezes e frustrações financeiras.
Até agora as principais preocupações da imprensa se concentraram na atualização tecnológica, no marketing e na busca de fórmulas de sobrevivência como negócio lucrativo. Pouca ou quase nenhuma atenção foi dedicada ao fato de que a notícia perdeu valor comercial e ganhou destaque como item essencial e ferramenta indispensável à adaptação das pessoas à era digital.
Quebra de paradigma
Estamos entrando numa era onde o conhecimento é condição básica para o dinamismo econômico e científico, numa sociedade que depende cada vez mais de inovações. Estamos, portanto, diante de um ambiente onde a percepção do valor de uma notícia ou informação passou a ser algo essencial para a sobrevivência do jornalismo e da imprensa. Mas este é um desafio para o qual profissionais e executivos se mostram despreparados, porque ainda vivem a cultura do distanciamento em relação à massa de leitores, ouvintes, telespectadores e usuários de redes sociais.
Até agora, a ideia predominante é a de que a imprensa sabe o que as pessoas precisam para serem bons cidadãos e bons consumidores. Esta atitude levou as pessoas a se sentirem inferiorizadas em relação aos jornalistas. Acontece que a avalanche de informações publicadas na internet quebrou este padrão de conduta ao dar um inédito protagonismo ao público, o que acabou gerando a necessidade de rever comportamentos, regras e valores na atividade jornalística.
O fundamental passou a ser a identificação das necessidades informativas das pessoas comuns como passo inicial obrigatório para poder desenvolver novas estratégias de comunicação e informação. Pesquisas feitas em várias universidades norte-americanas como a Montclair State e a Northwestern mostraram que para conhecer as demandas reais é necessário identificar primeiro quais as principais fontes de informação do público que se pretende atingir. Ou seja, conhecer o ecossistema informativo local.
Existem dois tipos principais de percepções públicas sobre a realidade social: a condicionada pelas mídias hegemônicas onde predominam os interesses dos seus donos; e a resultante do histórico e das vivências das pessoas comuns. Esta diferença fica clara nas pesquisas sobre agenda pública e é fundamental para descobrir o que o público realmente quer e precisa.
Processo complexo
Sabendo o que os leitores, ouvintes, telespectadores e usuários de redes sociais procuram, é possível produzir notícias capazes de levar as pessoas a perceberem a importância que a informação tem no seu dia a dia. A vivência concreta dos benefícios da informação sintonizada com a realidade local tende a gerar credibilidade e fidelidade, através de um processo em que o jornalismo ocupa um papel insubstituível.
Experiências realizadas nos Estados Unidos e em alguns países europeus indicam que a revalorização da notícia em bases sociais e não majoritariamente financeiras é um processo lento e complexo, porque obriga os jornalistas a reverem suas normas de relacionamento com o público.
A principal consequência direta da revalorização da notícia é o estabelecimento de uma relação entre jornalistas e o público, onde ambas as partes se tornam corresponsáveis pela sustentabilidade financeira em projetos de informação pública, especialmente nas pequenas e médias cidades do interior. A sustentabilidade é hoje o maior desafio a ser enfrentado tanto pelos jornalistas como pela imprensa, porque dela depende a sobrevivência dos profissionais e das organizações responsáveis pela produção de notícias.
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Carlos Castilho é jornalista com doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento pelo EGC da UFSC. Professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária. Mora no Rio Grande do Sul.