Sunday, 17 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Lula é manobrado por jogo político de Macron

(Foto: Fabio Rodrigues- Pozzebom/Agência Brasil)

Emmanuel Macron foi figura carimbada no noticiário brasileiro neste fim de março. A razão foi a visita do líder francês ao presidente brasileiro e suas muitas interações ao longo da permanência do europeu nestes tristes trópicos.

Além dos memes e brincadeiras nas redes sociais, a visita rendeu um posicionamento mais crítico de Lula da Silva ao pleito eleitoral na Venezuela, fato este que é inédito na longa relação entre o petista e Nicolás Maduro. Mas se tal fato teve um gosto amargo em parte da militância petista, também é verdade que os entusiastas do governo Lula podem dizer que a visita de Macron valida a importância do líder petista no cenário internacional.

Há, porém, alguns outros desdobramentos no tabuleiro internacional para quem tem olhos para ver. Macron tem ensaiado alguns movimentos geopolíticos com vistas a emergir como o príncipe dentre os príncipes da Europa, e conseguir uma crítica de Lula a um presidente não alinhado pode ser visto como um movimento preparatório na estratégia de legitimação de sua liderança regional.

Sabemos que Angela Merkel teve uma carreira de amplo destaque como chanceler, e em seus 16 anos de liderança era constantemente citada como uma das mulheres mais poderosas do mundo. Em compensação, seu sucessor Olaf Scholz tem se mostrado uma figura bastante apagada, mesmo governando o país mais próspero da Europa.

Assim, é mais que evidente que Emmanuel Macron deseja ocupar um espaço de influência antes restrito à Alemanha e sua chanceler Angela Merkel.

As evidências de tal ambição não estão restritas aos eventos deste fim de março. Cerca de um mês atrás Macron começou a endurecer o discurso contra Vladimir Putin, sugerindo uma maior participação do Ocidente em benefício da Ucrânia, inclusive com o envio de tropas para o conflito. E mesmo sendo certo que Macron não tem a autoridade para definir tais estratégias de forma unilateral, seu discurso foi suficiente para marcar posição como a liderança europeia mais proativa até o presente momento em matéria de enfrentamento com a Rússia.

Com base nesse contexto, as intenções do líder francês se tornam mais claras e podemos delinear as vantagens que ele pretende obter com a recente visita ao Brasil. Lula pode ter um discurso eloquente, mas é evidente que ele não possui qualquer papel de protagonismo no cenário internacional. Ainda assim, fazer Lula se engajar em uma crítica ao presidente venezuelano evidencia que o peso político da presença de Macron é suficiente para influenciar lideranças populistas de médio escalão em prol do discurso hegemônico europeu.

Devemos recordar que até o presente momento a política externa de Lula tem sido enfática em defesa do chamado Sul Global. Tal discurso soa muito bem aos ouvidos de russos e chineses, ao mesmo tempo em que lança mão de certo grau de hostilidade em relação aos Estados Unidos e Europa. 

Mas embora Lula se mostre aguerrido e sumariamente inspirado em frente aos microfones, sua postura é mais comedida quando precisa interagir tête-à-tête com um líder global em ascensão.

É por isso que, no frigir dos ovos, o resultado é que Lula foi manobrado em benefício do jogo político de Macron. 

De tudo isso, fica a expectativa de saber quais serão os próximos passos de Emmanuel Macron no tabuleiro geopolítico global. Caso ele consiga se consolidar como principal nome da Europa, não há dúvidas de que ele colherá frutos significativos no âmbito interno. Já no âmbito externo, que é o que mais nos interessa, ainda há pouco de concreto para permitir visualizar que tipo de mudanças práticas viriam de um cenário dominado pela figura do famigerado líder francês. 

Para o bem ou para o mal, teremos de esperar as cenas dos próximos episódios. 

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Rodolfo Jose Andrello é formado em direito e filosofia, com especialização nas áreas de direito do trabalho, epistemologia e filosofia do direito. É servidor de carreira do judiciário federal e atua como assessor de Desembargador pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª região.