Nota da Gazeta Mercantil.
Caio Navarro de Toledo, São Paulo
Gazeta Mercantil, 16 de agosto de 2004, Nomes & Notas
Herança da ditadura
A ‘fúria’ arrecadatória da Prefeitura de São Paulo já passou dos limites. Diretores do antigo semanário jornal Movimento – da imprensa nanica que nunca teve finalidade lucrativa e foi obrigado a encerrar suas atividades em 1981 pelas pressões da ditadura militar – estão sendo acionados pela administração petista desde o ano passado. Trata-se de uma execução fiscal iniciada em 1981, e depois sustada em 1982, e reativada em 2003 pelo governo municipal do PT e ameaçando penhorar bens dos 400 acionistas do tablóide, intelectuais de esquerda e sem patrimônio expressivo. Inconformados com a arbitrariedade da execução, os profissionais que trabalharam no semanário pedem que a prefeita Marta Suplicy reconsidere a decisão e mande sustar um processo iniciado pela truculência da ditadura militar.
PROJETO DA ANCINAV
Tanta falação sobre a tal Ancinav que resolvi entrar no site do Ministério da Cultura para conferir. Que surpresa! Percebi que o texto do projeto que eu li não tinha nada a ver com as informações que eu conhecia pela mídia. Não me pareceu uma proposta de autoritarismo, controle e censura, nem uma conspiração petista pelo poder. Aliás, o texto apresenta questões muito pertinentes relativas ao controle público dos bens públicos. O projeto tem problemas e pode melhorar. A parte sobre conteúdo, por exemplo, tem uma redação ruim, tem que ficar mais claro o conceito. Mas eu não acho absurda a idéia de uma instância pública que controle e fiscalize o investimento do dinheiro público oriundo das leis de incentivo a cultura.
Tem que ter critério, não é qualquer filme, programa ou tema que interessa a sociedade. Senão, eu também quero que o governo banque minhas cerâmicas, por que só os filmes do Cacá? Quem tiver paciência e conseguir ir além das primeiras dezenas de artigos, lá pelo 41 vai perceber onde o bicho pega, o porquê da gritaria dos barões do audiovisual com esse projeto. É quando se fala de concessões públicas e controle público dessas concessões; taxas e tributos. Uma expressiva fatia do empresariado nacional acostumou-se a privatizar o que é público e não quer largar o osso.
Outro aspecto que me intriga nessa história é que a mídia só dá voz aos de sempre: Jabor, Cacá, os Farias, os Barretos, o pessoal da Globo, a Abert, que são contra a proposta. O que pensa essa nova geração tão talentosa de cineastas? E os documentaristas? E os curtametragistas? E as produtoras que não estão no esquema das grandes empresas de mídia? E os que produzem cinema e audiovisual fora do eixo sul? Será que são contra a criação da Ancinav? Não sei, ninguém se interessou em ouvi-los. Tenho a impressão de que tem muita gente que está caindo de pau na Ancinav sem ter lido o projeto. As críticas estão repletas de adjetivos e pouca coisa substantiva.
Sinceramente, acho uma burrice taxar esse projeto de autoritário, rasgá-lo e jogá-lo no lixo, será um desperdício de boas idéias.
Fabiana Tambellini, educadora, São Paulo
Abusado & abusador
Diz a psicologia que abusado sexualmente vira abusador (sic), do que eu discordo veementemente. No entanto, o atual governo tem demonstrado que esta máxima da psicologia têm fundamentos políticos. O projeto cultural de mídia e cinema, a proposta do controle sobre o jornalismo e até mesmo as históricas guerrilhas da esquerda brasileira nos anos 70, além da simpatia autista e antiética por Fidel, nos levam a crer que os milicos fizeram tão mal à esquerda quanto à democracia. A democracia se recuperou, mas a esquerda… Será que era a isto que a ditadura militar se referia quando dizia que a esquerda comia criancinhas? Seria presságio?
Warner Burchauser, marqueteiro, Campinas, SP