Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Aquecimento global é um grande negócio

Como já sabemos, a mídia nos bombardeou o suficiente sobre o que é o aquecimento global. Em rápidas palavras, nada mais é do que o que todos já sentem na pele: o tempo está cada vez mais quente (ou, contraditoriamente, mais frio) e mais louco (!). Esqueça as demais explicações acadêmicas – o que poupa nosso tempo. Entretanto, após o relatório do IPCC – e ainda que o assunto não seja de interesse geral –, até onde a mídia aprofundou as entrelinhas e interesses escusos do aquecimento? Com pontuais exceções, muito pouco.

Em tempo: não espere neste texto mais tripulante do barco sem condutor empunhando a bandeira de que o aquecimento global é balela, de que não está nada comprovado e bla-bla-blá. Como um bom defensor da ciência moderada, acredito nas provas dadas pelo método científico de que o modo de vida atual causa males ao planeta e ponto. Portanto, não é disso que falaremos aqui. O texto – que não é a descoberta da pólvora – visa, de forma crítica e aberta, a instigar nosso pensamento: afinal, alguém sai ganhando com o alardear sobre o aquecimento do planeta?

Sobe preço do petróleo

Como nada na vida pode ser neutro – especialmente quando se trata de ciência, política ou economia –, claro que alguém sempre lucra (como com qualquer outra coisa que aconteça abaixo dos céus). Assim, tentemos um exercício de listar os principais interessados em alardear que mundo está esquentando. A lista pode ser densa; olhemos para os mais óbvios.

Primeiro, os ambientalistas. Eles, sempre tratados de loucos e alarmistas, agora têm sua vez. Além disso, as organizações ambientais passam a ter mais argumento na hora de captar recursos. Afinal, alguém precisa fazer alguma coisa; nem que seja barulho (muitas fazem mais que isso). Creio que estes ganham de forma justa e pode ser visto como positivo.

Como a queima de combustíveis fósseis é a razão do aquecimento, então produzir energia de outras formas menos-emissoras seria a solução. Se for assim, também seria ótimo mudar a matriz energética com esforço global, pois dividiria gentilmente o bolo da culpa e seria mais facilmente alcançado se a maioria dos interessados estivesse buscando a solução do que alguns poucos.

Aonde chegaríamos então? No curto prazo, à tão temida energia nuclear. Sem ingenuidade na polêmica sobre as armas nucleares, a tecnologia nuclear é dominada por outros poucos que, quando solicitados, podem vender por milhões de dólares equipamentos, tecnologia e assistência técnica por décadas – incluindo o que (não) fazer com os rejeitos (veja a vontade do Japão em ajudar). Ora, não esqueçamos, ainda, que forçar a redução do uso de petróleo implica em aumentar os preços (!) o que interessa – e muito – aos (poucos) vendedores.

Quem paga a conta?

Na mesma linha, se o problema é global, então os países desenvolvidos poderiam contar também com a ajuda dos países em desenvolvimento (e menos poluentes?) com tecnologia ou medidas mais limpas (tais como, o Brasil com biodiesel, álcool, energia eólica etc). Ao mesmo tempo, acenar com a bandeira retórica da redução de desmatamento em florestas tropicais – um dos vilões do carbono atmosférico – ajuda os países desenvolvidos a expurgar sua culpa por terem dizimado suas florestas e, de quebra, os coloca como bons moços por ajudar na preservação das dos outros. Bem verdade que o Protocolo de Kyoto tentou ser justo com quem mais ou menos poluía. Mas essa é outra história.

Falando em Kyoto, um dos instrumentos desse Protocolo foi incentivar projetos limpos em países em desenvolvimento. Isto é, nesses paises, cada tonelada de carbono capturada ou deixada de emitir tem um preço fixo no mercado. Ora, quem paga a conta? As empresas de países que não alcançaram as metas de Kyoto. Portanto, são inúmeras as formas de ganhar com isto.

Catástrofes anunciadas

E o Brasil, o que tem com isso? Tem, e muito. O país tem interesse econômico direto no aquecimento global, pois seria um dos que mais poderia vender esses projetos (estima-se que o país abocanharia 10% da fatia mundial). Não é pouca coisa, num mercado lucrativo e em crescente expansão. Além disso, o aumento dos gases atmosféricos fortalece o lobby para o uso do etanol, do qual o Brasil é líder mundial, e puxará os debates para a expansão do uso no restante do mundo.

Por fim, as catástrofes anunciadas pelo IPCC (relatório da ONU sobre aquecimento global) vão demandar bilhões de dólares para a economia mundial em ajudas humanitárias, programas de recuperação, perdas agrícolas e aumento nos preços dos alimentos (The Economist, em inglês), valores dos seguros etc. Enfim, em economia, todo dinheiro que sai de algum bolso pára em outro.

Um valioso ganha-pão

Muitos podem argumentar que pouco interessa para a grande massa o que sai ou não na mídia a respeito do aquecimento global. É um bom argumento, mas maiores reflexões são sempre bem-vindas. Lembremos que o desmatamento em nossas florestas é visto com péssimos olhos no exterior – validando o argumento para o Brasil entrar no trem da alegria dos que precisariam reduzir suas emissões ou pagar a conta.

Em vez disso, o aquecimento pode ser um valioso ganha-pão para os brasileiros em futuro próximo, associando redução do desmatamento com energias limpas. Em outras (e frias?) palavras: para o Brasil, o aquecimento global também é um grande negócio.

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Engenheiro agrônomo e mestre em Florestas Tropicais. Manaus, AM