Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Diante da dor da Ásia

As imagens da tragédia no Oceano Índico chegam com a força de uma tsunami. Madonas em transe pela perda dos filhos ganham os noticiários de TV e as primeiras páginas de jornais de todo o mundo. Corpos abandonados nas praias, ruínas, barcos exibidos de ponta-cabeça, multidões famintas disputando a ajuda das organizações humanitárias. Os flagrantes são inúmeros. A legião de fotojornalistas na região não cochila um só instante.

Mas, como a própria tsunami que veio, destruiu e arrefeceu, a força dessas imagens vão atingindo um ponto de saturação. Não por ser essa uma tragédia destituída de dramaticidade, horror e sofrimento. Muito pelo contrário. As estatísticas dos mortos e desabrigados são algo descomunal, mesmo para um continente densamente povoado como a Ásia.

A exibição incessante de tragédias resulta em indiferença. Do estupor inicial, permanece apenas um embotamento. ‘O que parece insensibilidade se origina na instabilidade da atenção que a tevê intencionalmente provoca e nutre por meio da sua superabundância de imagens’, escreveu Susan Sontag no ensaio Diante da dor dos outros, uma reflexão sobre o uso e o sentido das imagens sobre as nossas emoções.

Platitude

Insensibilidade, instabilidade. Como essas palavras dizem respeito ao universo da tevê? ‘A saciedade de imagens mantém a atenção ligeira, mutável, relativamente indiferente ao conteúdo’, responde a própria Susan. ‘O fluxo contínuo de imagens impossibilita uma imagem privilegiada. O xis da questão na tevê é que se pode mudar de canal, é normal mudar de canal, ficar inquieto, entediado’, diz. E prossegue: ‘Os consumidores desanimam. Têm de ser estimulados, sacudidos sem cessar’.

Para vencer o tédio do telespectador, a tevê garante um menu incessante e variado de imagens. Para a ensaísta, a reflexão sobre os acontecimentos exigiria um maior esforço de consciência, enfraquecida pela difusão massiva de imagens. ‘A rarefação de conteúdo’, escreveu Susan, ‘contribui, mais do que qualquer outra coisa, para o embotamento do sentimento’.

No caso do flagelo asiático, a tevê tenta preencher o conteúdo da tragédia com a oferta incansável de imagens, mas o feitiço vira contra o feiticeiro: chega um momento em que o telespectador, assolado pela platitude das informações, cansa do assunto e desliga a tevê.

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Estudante de Jornalismo da Universidade Tiradentes (SE) e editor do Balaio de Notícias (http://www.sergipe.com/balaiodenoticias)