O ex-presidente Lula fez uma declaração irretocável sobre o uso político da internet: a rede mundial é útil, é libertária, se contribuir para o esclarecimento da população. É ruim, é nociva, quando a liberdade que oferece é usada para caluniar, inventar, agredir. É boa quando usada com consciência e moderação; é péssima quando se transforma em veículo difamatório.
Mexer com a liberdade da internet? Jamais, diz Lula. Mas é preciso cobrar responsabilidade de quem a usa; é preciso responsabilizar quem se manifesta pela correção, pela honestidade das informações que ali posta.
Este colunista já tratou do assunto e chegou a mais uma conclusão: quem quiser usar pseudônimo que continue a usá-lo, mas sua identidade verdadeira tem de constar em algum lugar – por exemplo, quando manda comentários sobre uma coluna, o colunista deve saber com precisão de quem se trata.
Os atingidos têm direito a recorrer à Justiça, e isso só é possível quando a muralha que protege os pseudônimos não permite o bloqueio total de informações. Voltando ao ex-presidente Lula: uma pessoa pode pegar o carro e viajar para onde quiser, livremente, sem restrições. Mas se atingir alguém, se causar um acidente, tem de responder por isso.
Ao dizer essas coisas, Lula está mexendo em área sensível: em seu próprio partido, o PT, há grupos organizados que lutam para desqualificar e desmoralizar pessoas e organizações às quais se opõem. Não é apenas o PT que faz isso; há muita gente que usa a internet como se fosse guerrilha, e pertence às mais diversas correntes de pensamento político. O PT, entretanto, parece ser o mais organizado. O que não impede que viúvas da ditadura incensem generais (como dizia o marechal Castelo Branco, “como vivandeiras alvoroçadas, vêm aos bivaques bulir com os granadeiros e provocar extravagâncias do Poder Militar”); e que antipetistas busquem casos de dez anos atrás para noticiá-los como se fossem de agora.
Exemplos? Petistas correram para acusar o senador Aécio Neves de ligação com o narcotráfico, porque no helicóptero de um político mineiro havia meia tonelada de cocaína. Detalhe: o referido político tem boas relações com Aécio, mas pertence à base de apoio de Dilma. Antipetistas ressuscitaram uma velha besteira de Marta Suplicy que, quando ministra pela primeira vez, não queria permitir que sua bagagem de mão fosse inspecionada nos raios X. Petistas se apropriaram de uma tragédia – o cantor Cláudio Goldman, com carteira irregular, fez uma barbeiragem no trânsito e matou um motociclista – para realçar o tempo inteiro que se tratava do filho do ex-governador tucano Alberto Goldman. Um dos boletins mais ferozes acusava o próprio Alberto Goldman de ter provocado o acidente. Houve carteirada, houve ameaça, houve tentativa de influir sobre a ação da polícia? O fato de ser filho de político importante influiu nos procedimentos policiais? Ao que se saiba, não. Então, por que tanta insistência em atribuir a morte “ao filho do governador”, e não apenas ao cidadão?
O fato é que, pondo ou não a mão em vespeiro, Lula tem toda a razão: ou a liberdade proporcionada pela internet é um notável avanço ou se transforma apenas em reforço para difamação. Falta ver se as palavras do líder maior do PT são obedecidas no mínimo pelos militantes de seu próprio partido. E cabe aos dirigentes de outras correntes políticas contribuir ativamente para evitar que um instrumento tão revolucionário se transforme apenas em chulo veículo de insultos e palavrões
Silêncio conveniente
A ministra das Comunicações, Helena Chagas, disse que não era mulher de pedir demissão. Foi a última a saber que tinha pedido demissão do cargo, tendo sido substituída por um profissional de quem não gostava, Thomas Traumann. Depois que o afastamento tinha sido decidido, depois que o substituto tinha sido escolhido, Dilma conversou várias vezes com Helena, e não lhe contou nada.
Helena agora diz, em seu twitter: “Impressionante a capacidade e o oportunismo de alguns para inventar histórias. Não me atingem. Estou que nem São Sebastião: o que é mais uma flechada?” Poderia ter completado, brincando, “o que é mais uma flechada para quem tem Chagas no nome?” Mas não deveria falar a sério. O respeito que Helena Chagas acumulou, por sua competência e seriedade, não deve ser dissipado na tentativa de salvar as aparências para quem a traiu.
Novos desafios
O lendário Carlos Maranhão, 40 anos de Abril, com passagens por Placar, Playboy, Veja, Veja São Paulo e demais edições de Vejinha, deixa de ser empregado e passa a colaborador. Sua primeira tarefa é uma obra relativa à memória da empresa – ninguém melhor do que ele para tocá-la, já que era o funcionário mais antigo da Editora Abril. Algo de que poucos se lembram: Maranhão iniciou sua carreira no Paraná, como correspondente de Placar em Curitiba (e chegou a diretor de Redação da revista, em São Paulo).
Alecsandra Zaparolli, braço direito de Maranhão, e Maurício Lima, de Veja Rio, dividem de agora em diante o comando das Vejinhas e subprodutos: por enquanto, a edição digital para Ipad e o site Vejasp.com.
Número cá, número lá
Há economistas que dizem que os números, quando bem torturados, dizem o que quer que se queira. Há muitos debates, sobre a turma que lida com números, a respeito do resultado da soma 2+2: há quem diga que é quatro, há quem diga que é quatro, mas com viés de alta ou baixa, há quem diga o resultado varia, dependendo se for para comprar ou para vender. Dizem que, para o ministro Guido Mantega, o resultado pode ser o que for, que ele o usa para engrossar a conta do superávit primário. Mas ninguém ganha dos jornalistas nesta árida missão.
Notícia publicada num jornal impresso, de prestígio:
** “Na mesma semana, o governo da Venezuela promoveu ajustes no sistema de controle de câmbio – mantido há mais de uma década – e anunciou um sistema de cotização que, na prática, implica em uma forte desvalorização do bolívar de quase 100% para muitos produtos e serviços”.
Daria para começar pelo texto: “implica em” é como “se esforçar-se”. Tem repetição. Mas fiquemos nos números. A cotação do dólar na Venezuela pode ter subido quase 100%; mas se o bolívar tivesse caído quase 100% estaria perto de zero. Para cima, as porcentagens não têm limite; para baixo, quando chegam a 100% têm de parar, já que preços, cotações, etc. de zero não passam.
Vassoura na tela
Nelson Valente nasceu janista, cresceu janista, é até hoje seguidor de Jânio Quadros. Mais do que isso: é um estudioso de Jânio e do janismo. Valente está, pela Biruta Filmes, preparando um documentário sobre o ex-presidente (por enquanto, com o título “Jânio da Silva Quadros por Nelson Valente e outros”).
O documentário pretende iluminar um dos mais misteriosos episódios da história política do Brasil: a renúncia de Jânio à Presidência da República, em 25 de agosto de 1961. Personagens diversos – amigos, políticos, parentes, assessores – dão seu depoimento sobre o dia da renúncia.
Estão confirmados Jânio Quadros Neto, Salomão Esper, Álvaro Dias, Geraldo Alckmin, Gaudêncio Torquato, Arnaldo Niskier, José Paulo de Andrade, Milton Parron, José Sarney, o assessor Very Well, o mordomo José Dutra Sobrinho, o próprio professor Nelson Valente. E, com destaque, os documentos pessoais de Jânio: os bilhetinhos que enviava aos subordinados, suas entrevistas, suas conversas com amigos. Período do documentário: o que vai da renúncia até o confinamento compulsório em Corumbá.
De acordo com Valente, o documentário vai demonstrar que a renúncia de Jânio foi uma decisão pessoal, não parte de uma conspiração. A data de lançamento ainda não foi determinada.
Os contos do futebol
O tema é comum a todos: o futebol. Para falar de futebol, o escritor Luiz Ruffato juntou, no livro Entre as quatro linhas, 15 autores, cada um com seu conto sobre o tema. Também se refere ao tema o local do lançamento, dia 6 de fevereiro, a partir das 19h: o Museu do Futebol, no Estádio Municipal do Pacaembu, SP, com direito a mesa redonda, tira-gostos, uma cervejinha. E, juntando tudo, uma boa conversa sobre literatura e, claro, tudo permeado por futebol.
Como…
De um grande jornal impresso, apresentando a nova programação da TV:
** “Sem barba, humorista Rafinha Bastos assina contrato com a Band”
E que é que tem a barba a ver com a assinatura do contrato?
…é…
De um grande portal noticioso:
** “Após empréstimo, Luiz Gustavo celebram volta ao Palmeiras”
Não estranhe: quem deu o título certamente imaginou que dois jogadores, Luiz e Gustavo, comemoravam a volta ao clube. Por isso o plural do verbo.
…mesmo?
De um grande portal noticioso:
** “A tenista sérvia venceu a partida por 2 sets a 0 (4-6, 6-3 e 6-3)”
Não seja exigente, caro leitor: a partida realmente ocorreu, a notícia informa quem realmente venceu, diz até sua nacionalidade. Saiu bastante coisa certa! Só houve erro na contagem.
Frases
>> Da tuiteira Barbara Barreto: “Os petistas falam como Marx, governam como Stalin e vivem como Rockefellers”.
>> Do jornalista Josias de Souza: “Janeiro trouxe boas notícias para os auxiliares de Dilma. Não houve nenhum aumento da taxa de irritação da presidente. Continua nos mesmos 100%”.
>> Do jornalista e apresentador José Paulo de Andrade: “Após denúncia, ex-ministro cancela convênio com ONG do pai, para preservar a ‘lisura’ de seus atos. Então tá! Estrago feito, vai pra casa, Padilha!”
>> Do jornalista Charles Magno Medeiros:“Pô, por que pegar no pé de Zé Dirceu por ter usado celular na Papuda? Qual a novidade? Todo bandido não faz isso?”
Não notícia
Esta é uma notícia caprichada: em vez de citar o cidadão envolvido, cita seu parentesco com um político. E acaba trocando as bolas, além de trocar a notícia propriamente dita por uma suposição:
** “Filho de ex-governador atropela e mata policial. Alberto Goldman teria feito conversão proibida”
Alberto Goldman nem estava lá. O envolvido, seu parente, não “teria feito” uma conversão proibida: ele “fez” uma conversão proibida. A propósito, qual o nome da pessoa efetivamente envolvida no caso e que é citada apenas como parente de um ex-governador? A outra notícia é também excelente:
** “Bruna Marquesini viaja supostamente ao encontro de Neymar”
Sem querer ser chato, ela viajou ou não para encontrar-se com Neymar? A propósito, o namoro entre ambos continua firme ou naufragou? Conforme a página, eles se separaram, eles estão dando um tempo ou não aconteceu nada.
E eu com isso?
** “Luiza Brunet caminha na praia do Leblon”
** “Khloe Kardashian não vai falar mal de seu ex na TV”
** “Sem Cauã Raymond, Grazi Massafera vai à praia com Sofia”
** “Heidi Klum termina o namoro”
** “Di Ferrero pratica exercícios na praia”
** “Harry Styles aparece de bunda de fora fazendo xixi”
** “Cazarré curte dia na praia”
** “Beyoncé exibe o corpão em biquíni comportado”
** “Famosos curtem o sol nas praias do Rio”
** “Robert Pattinson diz que ficou mais vaidoso”
** “Letícia Wierman corre com namorado na orla da praia”
** “Amber Rose, ex de Kanye West, vai ser mãe de um menino”
** “Fred caminha pela orla de Ipanema”
** “Kristen Stewart está feliz por trabalhar com Julianne Moore”
** “José de Abreu se espreguiça em aeroporto”
O grande título
O título mais fantástico da semana, publicado num grande jornal impresso e na edição online, era tão bom que acabou ficando batido com tanta gente que o repetiu:
** “Dois mortos andavam pelo elevado de 120 toneladas, que desabou sobre dois carros, onde estavam as duas outras vítimas”
O caso dos walking deads foi ótimo, mas não o único: há pelo menos outro falecido que se manteve em plena atividade física e intelectual:
** “Após morrer em prova física da Polícia Civil, candidato é aprovado”
E há dois títulos magníficos, mais pelo que significam do que pelo texto. Não dá para escolher o melhor. Seguem ambos:
** “Suécia recusa Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 para não usar dinheiro público”
A Suécia, como se sabe, é aquele país pobrezinho onde há empresas como Fiat Lux, Ericsson, Saab (sim, essa dos caças Grippen), Volvo, Alfa Laval, Atlas Copco, Sandvik, Scania, IKEA, SKF, Electrolux.
** “Suzane quer pensão alimentícia dos pais assassinados”
Qual Suzane? Sim, a própria: Suzane von Richthofen, condenada à prisão como mandante do assassínio dos pais, cometido a pauladas. Tudo bem, ela quer pensão alimentícia, embora na prisão receba regularmente todas as refeições oferecidas aos condenados. Só falta requerer saídas especiais no Dia das Mães e Dia dos Pais e, quem sabe?, fazer um pedido à Justiça para participar do Baile de Órfãos.
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Carlos Brickmann é jornalista, diretor da Brickmann&Associados