A mudança na Lei de Imprensa, determinada pelo Supremo, é boa ou má?
Uma coisa sempre surpreendente em nossos meios de comunicação é a capacidade de discutir os assuntos errados. O problema não é a Lei de Imprensa, mudada ou não (como também não o é sua origem ditatorial): o problema é garantir a liberdade de expressão – que não é um direito do jornalista, mas do público – e ao mesmo tempo proteger o cidadão de acusações infundadas. Esses objetivos se atingem com ou sem lei de imprensa: a lei geral pode ser suficiente para isso. Por exemplo, calúnia é crime. Por que criar uma calúnia específica para jornalistas?
E o problema que se discute agora, e que provavelmente levou à modificação da lei, também não tem nada com ela: é a possibilidade (demonstrada nos processos de fiéis da Universal contra a Folha de S.Paulo) de utilizar o processo judicial não como meio de alcançar a Justiça, mas como castigo em si. Uma pessoa, ou empresa, processada em dezenas de lugares diferentes, poderá ser financeiramente sangrada de maneira irremediável, seja depois declarada culpada ou não.
A solução não é mexer na Lei de Imprensa (nem proteger exclusivamente os jornais e jornalistas): é, em casos nos quais múltiplas ações semelhantes sejam movidas contra os mesmos acusados, unificá-las, colocando-as num só foro e tornando mais fácil e racional a distribuição da Justiça. Outras simplificações podem ser experimentadas, como o uso de sistemas modernos de comunicação (por que Fernandinho Beira-Mar tem de viajar de avião fretado, guardado por múltiplos policiais, se poderia ser interrogado via internet na própria cadeia? Ou, se isso for moderno demais, por que não ir o juiz ao réu, poupando o Tesouro?)
A discussão é longa, difícil, com detalhes jurídicos importantes que não podem ser esquecidos. Mas precisa ser feita. Quanto antes começar, melhor.
Pés-de-moleque
Claro que a discussão jamais começará se a imprensa estiver preocupada em verificar se algum ministro tomou um guaraná a mais num almoço pago com dinheiro público. Não, não ache que é exagero: outro dia estava no jornal uma ampla reportagem sobre gastos irregulares de um ministro, homem com fama de sério. Que será que houve? Houve que, em um ano, ele gastou algo como 900 reais do cartão corporativo em fins de semana. Ora, ele não é ministro só de segunda a sexta. Ninguém o imaginaria se recusando a ir a uma reunião de trabalho porque a hora da folga já chegou. O gasto é irrisório – não chega a R$ 40,00 por fim de semana. Daqui a pouco os meios de comunicação estarão utilizando sua força maior, a reportagem, para ver se algum ministro repetiu o prato. É excessivo.
E, enquanto discutimos cocada, tapioca, jantar que ultrapasse a meia-noite de sexta (e invada, portanto, o fim de semana onde é proibido gastar), os problemas sérios de acumulam. A reforma tributária, por onde anda? E a concessão de meios aos órgãos de fiscalização, para que combatam o desmatamento amazônico? A propaganda maciça de bebidas alcoólicas em todos os horários deve continuar? E o subsídio ao cigarro, para barateá-lo artificialmente?
Não é questão de tomar uma posição ou outra, mas de debater os problemas do país. Pode-se permitir que os impostos indiretos tornem mais pesada a tributação do pobre do que a do rico? Pode-se permitir que crianças sejam induzidas a beber compulsivamente, porque esta é a chave do sucesso? Mas estes problemas têm de ser trazidos ao debate pela imprensa. Ou então vamos continuar esperando, como até hoje, que a pauta da imprensa seja determinada pelo governo.
Fascista? Que coisa feia!
É difícil para um jornalista criticar promotores. Promotor pode ser um bom amigo, daqueles que muitas vezes dão dicas de matéria (‘conforme documento a que tivemos acesso’ é a fórmula consagrada desse tipo de dica). Promotor é unido, protesta maciçamente quando um deles é atacado. Promotor, hoje, tem excelente imagem na opinião pública, de implacável perseguidor da corrupção.
Mas, caro colega, tudo tem limite. Ao agredir a OAB, chamando-a de fascista, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Rodrigo Pinho, comete um erro básico: insultar o adversário, em vez de chamá-lo para o debate. Com isso, gera calor, e não luz; com isso, torna muito difícil buscar uma solução para os problemas que acredita ter encontrado. E, pior, mexe num vespeiro. Como lembra o advogado Alexandre Alkmim Teixeira, citado no portal Migalhas, sempre que algum cidadão sofreu nas mãos da ditadura militar – e não faz tanto tempo – houve um advogado para defendê-lo, e um promotor para acusá-lo.
Alkmim lembra o livro Código da Vida, do ex-ministro da Justiça Saulo Ramos: ‘Um dia, a ditadura, que tinha no Ministério Público um ativo e subserviente aliado, resolveu processar os professores universitários’ (pág. 44) pelo crime de ‘tentar mudar a ordem política ou social estabelecida na Constituição mediante ajuda ou subsídio de Estado estrangeiro ou de organização estrangeira ou de caráter nacional – pena de dez a 30 anos de reclusão’.
Até agora, Pinho resistiu a retirar o insulto – e, com isso, suas queixas não conseguem entrar em debate. Será humilhante reconhecer que errou ao exacerbar o debate e que os advogados merecem, sim, todo o respeito, mesmo quando discordemos deles?
Os números, os números
Numa matéria sobre concorrência suspeita no metrô de São Paulo, um grande jornal fala em preços ‘125% menores’. Será que alguma empresa estaria disposta não apenas a fornecer de graça, mas também pagando para o freguês?
Os textos, os textos
Esta é de publicação especializada: ‘o (nome do tribunal) caçou liminar (…)’.
Esta outra é de várias publicações, que repetem o mesmo erro: desconhecem a regência do verbo, ou não sabem a diferença entre objeto direto e indireto, embora todos os manuais de redação tentem explicar isso direitinho. ‘(…) quem lhe estraga é sua boca’; ‘eu lhe levei ao restaurante’; ‘o rapaz lhe pegou pela mão’.
Não é tão difícil: quem gosta de ler aprende – mas talvez seja exatamente esse o problema.
As informações, as informações
Houve época em que este colunista acreditava que a reportagem esportiva estava protegida contra erros de informação, porque o repórter não apenas gostava do tema como fazia questão de acompanhá-lo. Não é bem assim: agora mesmo houve um jornal que, na primeira página, disse que Ronaldo tinha operado o joelho direito.
Como…
O novo presidente no Brasil de uma gigantesca empresa mundial comparou-a a um pesado transatlântico, que ele pretende transformar ‘numa frota de veleiros ágeis e eficazes’. Curioso: estes transatlânticos pesadíssimos conseguem cruzar os oceanos bem mais depressa, com mais carga e mais segurança, do que os ágeis e eficazes veleiros que os antecederam.
…é…
Na Venezuela, o governador do estado de Mérida se chama Floréncio Porras.
…mesmo?
O lateral-direito Jancarlos, ex-jogador do Atlético Paranaense, declarou-se cansado da violência de Curitiba. E para onde levou a família, para fugir da violência de Curitiba? Para o Rio de Janeiro.
Obama, Osama
O engraçadíssimo erro da NBC, ao mostrar a foto de Osama bin Laden numa reportagem sobre Barack Obama, faz lembrar a piada do soldado americano que voltava do Iraque. Chelsea Clinton lhe perguntou quais seriam, em sua opinião de homem temperado na guerra, os três principais riscos que os Estados Unidos enfrentavam. O soldado respondeu:
‘Osama, Obama and your mama’.
E eu com isso?
A coleção é maravilhosa:
1.
‘Catherine Zeta-Jones joga golfe’2.
‘Reese Witherspoon não gosta de ser fotografada de biquíni’3.
‘Sutiã leiloado por Shakira custou US$ 3 mil a um fã’E temos o caso do colega que se entusiasmou com o preço do sutiã da cantora colombiana e resolveu transformá-lo em referência.
4.
‘Mega-Sena pode pagar mais de 2 mil sutiãs da cantora Shakira’E, finalmente, aquele fato inusitado que se transforma em notícia:
5.
‘Britney Spears mostra calcinha ao sair de carro’Pois é: normalmente, quando ela desce do carro, ninguém vê a calcinha.
Os grandes títulos
A semana é rica em títulos excelentes.
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‘Tigre engasga e estudante faz respiração boca-a-boca’Vale imaginar a cena. Como vale imaginar a cena do próximo título:
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‘Artista que pinta com pênis vai concorrer a prêmio máximo na Austrália’Sobre o mesmo tema:
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‘`Pricasso´ não usa pincéis convencionais’Estes títulos são todos bons. Mas o melhor, sem dúvida, é este, publicado num jornal pra lá de sério, com a melhor das intenções:
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‘Advogados investem em pós para subir na carreira’Sem dúvida, terão uma carreira brilhante.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados