A roda da História está se movendo e a imprensa tradicional parece não se dar conta. Já passa de um milhar de cidades em quase uma centena de países o total de concentrações de cidadãos indignados que produzem o movimento de movimentos cuja denominação a nomenclatura conservadora dos fatos sociais ainda não conseguiu definir.
Há muito mais a ser dito para descrever o contexto em que se produz essa manifestação planetária e mesmo nos meios digitais fica difícil elaborar um quadro do seu significado. Mas eventualmente a complexidade dos fatos exige apenas que o observador abandone certos pressupostos condicionados pela leitura linear de notícias e tente enxergar o novo.
Coloquemos, por exemplo, o fato de que os indignados pertencem, na maioria, à chamada “geração Y” – cujos valores e visão de mundo se colocam em total contraposição aos dos yuppies, que a partir do final dos anos 1980 se apossaram da liderança dos grandes negócios e da condução dos humores do mercado.
Pergunta essencial
Os indignados são essencialmente diferentes da chamada “geração X”, na qual são classificados os predadores de Wall Street, que gozaram a infância no final dos “30 anos gloriosos” e, quando jovens adultos, entenderam que precisavam cuidar pessoal e egoisticamente de seus interesses. Mas também são nascidos na “geração X” os criadores do movimento punk, originalmente uma reação às dificuldades surgidas com a primeira grande crise do petróleo, nos anos 1970.
Assim, é preciso inicialmente diferenciar os indignados de hoje dos alienados de ontem. A atual geração que chega à idade adulta após o advento da internet encontrou o mundo preparado para outros 30 anos de bem-estar e evolução: as novas tecnologias reinventam os negócios, a inovação lança ininterruptamente na rotina aparelhos e sistemas que ampliam o alcance do conhecimento, alargam-se os horizontes geográficos para a ação estimulante do capital.
Mesmo a urgência ambiental, percebida já nos anos 1980 com as ocorrências de chuvas ácidas na Europa, na Ásia, no antigo território soviético e na América do Norte, produziu reações positivas ao impactar a vida social no fim da década passada, como a rápida conscientização sobre a necessidade de novos paradigmas na indústria, no transporte, na vida privada e na organização das cidades.
O que é, então, que não está dando certo?
Essa é uma pergunta essencial da pauta contemporânea.
Indignados e resignados
O que está destoando desse contexto é justamente a “geração X”, que se aquartelou no capital financeiro, entranhou-se nas instituições do poder – entre elas a imprensa tradicional – e, envelhecida precocemente, não consegue enxergar as possibilidades do novo século.
Há um mal-estar generalizado quando se olha para o futuro, mas essa percepção não parece ter relação direta com o fim da era do petróleo e o advento da era da responsabilidade pessoal pelo destino coletivo. Esse é um pressuposto explícito em todos os movimentos contemporâneos, desde a chamada “primavera árabe” até o “ocupe Wall Street”.
O mal-estar no ambiente da globalização vincula-se claramente à incompatibilidade dos interesses do setor financeiro – chamado genericamente de “o mercado” – com as necessidades e interesses da sociedade em geral.
No momento em que a inovação tecnológica oferece soluções para o desenvolvimento sustentável, a irresponsabilidade individualista dos remanescentes da “geração X” ameaça colocar tudo a perder. Eles se tornaram mais do que conservadores – são reacionários no limite da insanidade.
Podem ser claramente identificados nos conselhos de grandes conglomerados transnacionais, no comando dos gigantescos fundos de investimento e nas chefias de muitos governos importantes. Mas também estão presentes em postos de direção dos grandes grupos de mídia – valorizados como mão de obra qualificada por sua obediência cega aos cânones do chamado fundamentalismo de mercado.
Falta entender
O que diferencia essencialmente a geração dos indignados da geração dos resignados – que resistem a aceitar os novos paradigmas que se impõem ao mundo – é justamente a capacidade de alimentar uma utopia coletiva.
É quase dogma na maioria das redações a interpretação de que a queda do muro de Berlim representou o fim das utopias. É “chique” entre jornalistas adeptos dessa ideologia dizer-se “pós-moderno”, embora poucos deles saibam explicar o que isso quer significar.
Mas acontece que, ao contrário do que alardearam os jornais no fim do século passado, a História não acabou. Ela se desenrola hoje nas ruas de todo o planeta com a manifestação dos novos protagonistas. Mas a imprensa tradicional ainda não entendeu, ou não quer entender.