A imprensa registrou sem nenhum tipo de reparo a decisão do desembargador Fernando Tourinho Neto, do TFR da 1ª Região, de autorizar a transferência para Brasília de Carlos Cachoeira, sob o argumento de que o bicheiro não precisa ficar em presidio federal de segurança máxima por não representar ameaça para a sociedade e não ter cometido nenhum crime hediondo.
É possível que o desembargador esteja tecnicamente coberto de razão. Mas talvez lhe bastasse dizer que a lei não permite esse tipo de detenção do indiciado. O conceito de crime hediondo (categoria que, como se previa na época de sua criação, o início dos anos 90, não teve nenhum efeito dissuasório sobre a violência) varia segundo a perspectiva de quem avalia o estrago causado. Os dicionários, a propósito, dizem que a palavra vem do latim foetibundus, de foetere, feder.
O Estado de S, Paulo de quinta-feira (19/4) reproduz trecho da decisão do juiz Paulo Augusto Moreira Lima que levou à prisão de Cachoeira: “É muito mais perigosa uma organização criminosa que conta com essa cooptação de agentes do Estado [30 policiais militares, seis delegados da Polícia Civil e dois da Polícia Federal, entre outros servidores] do que qualquer bando de traficantes armados ou assaltantes de bancos”.
Quanto à ameaça para a sociedade, pode-se dizer que a desmoralização das instituições causada pelo suposto esquema de Cachoeira é bem mais do que uma virtualidade.
Na prática, o desembargador Tourinho prestou um favor aos que estavam começando a achar muito perigoso Cachoeira ficar derretendo em Mossoró, onde perdeu 16 quilos. Isolado, abatido e, provavelmente, ruminando retaliações: o bicheiro é um colecionador de vídeos e áudios. O contador de sua organização, Giovani Pereira da Silva, está à solta, como se dizia antigamente. Conhece, por dever de ofício, o roteiro do dinheiro.