Taí uma generalização improcedente e imprudente: a de que a pretensa bebedeira do presidente ‘está na boca do povo’. Que ele e eu, cada qual na sua, tomamos uma caninha, ou um cervejota aqui ou ali, não há a menor dúvida, é de lei. Mas que estive, eu e meus vizinhos, preocupados com essa questão nos últimos meses, semanas ou dias, de jeito nenhum. Nem nós, nem a mídia falada, televisada ou escrita. Até que um sujeito lá do Norte, sem mais nem menos, entrasse com aquela catilinária de botequim. E nós aqui preocupados com tanta coisa séria.
Pois bem, a gente pode até ter errado com a cassação do visto, o presidente pode, sim, concorrer para o cerceamento da liberdade de imprensa. Mas é melhor assim do que botar o rabo entre as pernas e adotar atitude meramente cosmética, na linha do ‘politicamente correto’. Melhor ser transparente e proporcionar um bom debate com as repercussões necessárias do que ver, frustrado, as tais medidas diplomáticas esvaírem-se inúteis enquanto o desaforo continua repercutindo.
E, finalmente, não há razão para estupor. Somos uma democracia, nossas instituições funcionam, e tanto que, diante da possibilidade da injustiça na cassação do visto do jornalista, o STJ já concedeu liminar favorável à sua permanência.
E estamos conversados.
Luiz Paulo Santana, candidato a escritor, Belo Horizonte
Sob pena de demissão
Li na Folha Online, e isso é que é liberdade de imprensa:
‘O outro correspondente do NYT no Brasil, Todd Benson, que mora em São Paulo, disse ter sido proibido pela direção da empresa de comentar a decisão do governo brasileiro e a reportagem que gerou a polêmica, sob pena de demissão. A mesma orientação foi recebida por funcionários do escritório no Rio. ‘Em outros momentos, eu teria isso na ponta da língua, mas agora não é o caso. Não posso falar, não dá’, afirmou Mery Galanternick, jornalista brasileira que trabalha para o New York Times no Brasil’.
Só direitos para mim. Só obrigações para os outros.
Cleovaldo Batista, estudante de Direito, Salvador
Preconceito e reflexo
Repasso matéria de Paulo Henrique Amorim, no UOL News. A referida professora pode ser facilmente encontrada na Unicamp.
O jornal americano The New York Times tem uma visão preconceituosa sobre o Brasil. A opinião é da pesquisadora Regina Martins, da Unicamp. Ela estudou os textos do jornal entre 1986 e o ano 2000, para uma tese de doutorado. A pesquisadora fala sobre o assunto com Paulo Henrique Amorim. ‘É um discurso (o do jornal) muito preconceituoso. O Brasil é um país caótico, terra sem lei, da impunidade, o povo é adepto do misticismo de maneira exacerbada, fanfarrão. Uma matéria compara o Carnaval do Brasil ao dos EUA. Eles dizem ‘Não pensem que o Carnaval é como o americano. O americano é civilizado. Os americanos se enfileiram à beira da calçada. Os brasileiros serpenteiam pelas ruas, com cerveja’. Não existe pecado abaixo do Equador, é uma marca do Brasil’, afirma.
O preconceito verificado no jornal americano também é reproduzido por parte da grande imprensa brasileira. ‘O preconceito ressoa de lá para cá e daqui para lá.’ Esse preconceito seria expresso na visão de um Sul maravilha e de um norte caótico. ‘Há dois Brasis, um Brasil do Sul, a Bélgica, em que se enfatiza a descendência (racial). O brasileiro do Sul é visto como competente como administrador público, competente em negócios, neoliberal, globalizado. O resto é dança, cultura popular e música’, diz. ‘É o que muitos jornais brasileiros também dizem’, ela afirma.
Para Regina Martins, ‘a imprensa é receptora e emissora do imaginário da sociedade. Reflete a sociedade. Os americanos em geral são conservadores em questões raciais’, afirma. ‘Lá, eles só podem fazer isso conosco porque a gente deixa. A gente valoriza o que eles falam. Para eles importa o olhar deles. Não o do outro. Para nós importa o olhar do outro’, conclui. A pesquisa se concentrou em assuntos sobre o Brasil, sem usar as matérias de economia e esportes. Ela cobriu os dados da Biblioteca do Congresso americano. O foco era analisar a questão social. Ver como os brasileiros eram tratados pelo jornal’, afirma.
Vera Pereira, professora universitária, Rio de Janeiro