Esse caso de espionagem que atinge o governo federal é nojento. Não se pode admitir – e não apenas por atingir gente importante: violar a intimidade do cidadão é inaceitável – essa história de invadir e-mails e grampear telefones.
Entretanto, este colunista ficou com uma dúvida: quem foi espionado? Os ministros Luiz Gushiken e José Dirceu ou os cidadãos Luiz Gushiken e José Dirceu? Em termos morais, não faz diferença; em termos de segurança nacional, é importante saber se grampearam Gushiken e Dirceu antes ou depois de ocupar cargos no governo. Uma empresa multinacional, por mais conceituada que seja, não pode fazer espionagem.
Já houve alguns casos no Brasil em que ocorreu espionagem e foi tudo esquecido (o mais famoso, ao que me recorde, foi a descoberta de um microfone oculto nas paredes do gabinete do presidente João Figueiredo). Mas essas coisas não podem ser varridas para baixo do tapete, não: a imprensa deve cobrar ferozmente o esclarecimento dos fatos.
O previdente
Um cavalheiro que atende pelo nome de Catapreta surge sorridente no jornal, falando em nome das empresas de seguro-saúde, convênios e medicina de grupo – essas que tentam aumentar em mais de 80% a mensalidade de seus clientes. Explica que os segurados já ganharam muito, economizando aumentos que deveriam ter sido cobrados há tempos, e não foram. E completa com a seguinte pérola: um amigo, contou, lhe disse que tinha economizado com o seguro-saúde barato e guardado dinheiro, porque sabia que um dia os preços seriam reajustados.
Quem é esse amigo? O jornal não perguntou. Quanto é que esse amigo pagava de mensalidade? O jornal não perguntou. Qual era a benemérita empresa que vendia seguro-saúde baratinho? O jornal não perguntou. Será que, se perguntasse, o sr. Catapreta teria a resposta na ponta da língua?
Parafraseando o SBT, quem pergunta acha.
Nóis vai
Esta coluna falou em mau uso da Última Flor do Lácio, Inculta e Bela, e tivemos um belo exemplo: a notícia de que um jatinho estava abrigado em um ‘angar’. É duro ter sido copy: essas coisas batem no olho e doem.
Imprensa de papel
‘China trabalha à noite para poupar luz.’ Deve ser coisa de antípoda: aqui, nos trópicos, nossa gente bronzeada apaga a luz de dia.
Imprensa de bits e bytes
‘Helicóptero cai com 11; 6 são resgatados, 1 morre’.
Dona Elvira, dona Elza e dona Odila, que ensinaram aritmética a este colunista, faziam contas de maneira diferente. Do jeito que publicaram, a conta não fecha.
Lido na rede
‘Mulheres são acusadas de agredir e danificar equipamentos da TV Globo’, diz o título. E desde quando gente agride equipamentos? Lendo o texto, a dúvida fica esclarecida: as distintas senhoras agrediram a equipe da TV Globo e danificaram seus equipamentos. Como o Português correto, embora coloquial, facilita o entendimento das coisas!
Quero tudo!
O jornalista Chico Amaro, leitor desta coluna, comenta um fato irritante cada vez mais comum na abertura das entrevistas pingue-pongue: o repórter esclarece que serão publicados ‘os principais trechos’. Pergunta: ‘De onde será que tiraram isso? Eu, como leitor, não quero só os principais trechos: quero todos, quero ser eu a decidir o que é principal e o que não é!’
O leitor tem razão: na luta pela transparência, muitas vezes o jornalista exagera. O que se espera de uma entrevista é que seja a versão escrita de um texto falado – e, portanto, não seja necessariamente idêntica, com todos os ‘hum’, ‘né’, ‘então’, ‘aí’ da linguagem oral. Normalmente a entrevista publicada não é cópia fiel da concedida; sempre há cortes. Então, se isso sempre acontece, por que é preciso destacar o fato?O exagero acaba virando pedantismo.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados Comunicação; e-mail (carlos@brickmann.com.br)