Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Dando vivas aos seus maiorais

É bom jornalista, o Franklin Martins. Deve ter seus pecados, que perfeito nem este colunista é; mas, em sua carreira jornalística, no geral foi sucesso de crítica e de público. Entretanto, ser bom jornalista não significa entender de publicidade; não significa entender a política de distribuição de anúncios. E esta é a parte mais importante do seu novo trabalho: distribuir entre grandes, médias, pequenas e minúsculas empresas a montanha de dinheiro da publicidade oficial. Que é que nossos meios de comunicação publicaram sobre a política do governo Lula a respeito da publicidade oficial? Que é que perguntaram a Martins sobre isso?

Quais as idéias de Sua Nova Excelência a respeito da política de distribuição de verbas? Pode-se, como muita gente, defender a proporcionalidade entre verbas recebidas e audiência, ou circulação; mas se pode também argumentar que, nesse caso, perpetua-se a atual posição de cada veículo no mercado. Pode-se defender a prioridade a veículos regionais, pulverizando as verbas e reforçando a comunicação local; mas se pode também argumentar que, neste caso, há desperdício de verba, já que seria possível atingir mais gente com outras políticas.

Este colunista, como Franklin Martins, não entende nada de distribuição de verba publicitária. Mas leva a vantagem de não ter de cuidar do assunto, nem de ser obrigado a comer pela mão dos outros.

E Franklin Martins, como gente, quem é? O noticiário se dividiu em três grandes grupos: um detesta Martins, porque entrou no governo do PT (e, imaginam os mais radicais, contrabandeava idéias petistas em todos os seus comentários desde que iniciou sua vida de jornalista); outro gosta de Martins, porque entrou no governo do PT, confirmando, imaginam, que isso comprova a perseguição partidária na Rede Globo, que não renovou seu contrato. O maior grupo foi o corporativo: Franklin Martins é jornalista, é dos nossos, e não há qualquer motivo para deixar de ser seu amigo, criticando-o – ainda mais agora, que é poderoso. Ganhou status de ministro, como não se cansa de repetir a imprensa inteira.

Grande coisa, esse tal status de ministro! Até aquele sujeito que nunca viu um rio de perto e foi ministro da Pesca tinha status de ministro. PC Farias só não teve status de ministro porque não quis. E Waldir Pires não tem apenas status de ministro: é ministro!



Jornalistas no poder

Miguel Jorge tem uma bem-sucedida carreira jornalística, ocupou com êxito diretorias importantes na Autolatina, na Volkswagen, no Banco Santander, na Febraban, a Federação Brasileira dos Bancos, está agora no governo. Este colunista conhece o novo ministro desde que ambos tinham 18 anos e garante que Miguel Jorge não foge a perguntas, responde sempre, tem facilidade para lidar com entrevistas, não sonega detalhes.

Pena que nossos veículos de comunicação não tenham aproveitado a facilidade que é entrevistar o Miguel Jorge para perguntar-lhe o que é que pensa do Ministério do Desenvolvimento e de suas tarefas. Quais são, a seu ver, as principais funções do ministério e como pensa desenvolvê-las. Será sua prioridade a exportação ou o crescimento do mercado interno? Será essencial ter comando sobre o BNDES para executar sua política, ou dá para trabalhar sem ele?



Tudo muito bem

Sabe aquele promotor que matou um rapaz e feriu outro em Bertioga? Continua no posto, embora sem trabalhar, mas ganhando como se estivesse na ativa.

Sabe aquele rapaz condenado a dez anos de prisão, por violência sexual contra uma menina de 12 anos, daquelas que exibem sua habilidade com malabares nos cruzamentos? Pois foi colocado em liberdade, para aguardar o resultado da apelação. Veja bem: não se trata de um suspeito. Trata-se de um condenado.

Sabe aquele jornalista que matou a ex-namorada e foi condenado a 16 anos de prisão? Pois continua em liberdade, para aguardar o resultado da apelação. Como no caso anterior, não se trata de um suspeito: trata-se de um condenado.

Mas um escândalo encobre o outro, e nossa imprensa vai abandonando os escândalos mais antigos, tratando-os – quando deles trata – como se fossem coisa normal, como se fosse inerente à espécie humana viver no meio de gente que comete crimes terríveis e não sofre qualquer punição. Não se trata obrigatoriamente de cadeia: este colunista acredita que cadeia deve ser usada apenas quando o condenado oferece risco físico à sociedade. Mas há outras penas possíveis, há outras punições. Não se pode esperar que certas pessoas bem situadas na vida sejam punidas apenas por decurso de prazo, quando chegar sua hora final.



Fumaça nos olhos

Levou muito, muito tempo, mas hoje se sabe que a indústria do cigarro pagou para que, nos filmes, o cigarro fizesse parte do maior número possível de cenas. Veja hoje um clássico como Casablanca, com Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, e preste atenção na quantidade de cenas que, com cigarro ou sem cigarro, teriam exatamente o mesmo impacto. No entanto, fumava-se sem parar (e Bogart, a propósito, morreu de câncer do pulmão. Segundo sua esposa, Lauren Bacall, seus últimos anos foram de puro sofrimento).

Pois é. Liga-se agora a TV e, no BBB 7, fuma-se o tempo todo. Moças bonitas, rapazes que devem fazer ginástica muitas horas por dia, todos fumando como locomotivas a lenha. É esquisito: nas academias, informam-me (este colunista não tem o costume de frequentá-las), pouca gente fuma.

Coincidência? O colunista José Luiz Teixeira, no seu blog, levanta a lebre:

‘Este velho nariz – que já se meteu em muitos lugares onde não foi chamado, mas ainda não perdeu totalmente o olfato – está sentindo cheiro de merchandising no ar’.



É melhor ser rico

Um motorista de Kombi da Escola Base é acusado de crimes infamantes e seu nome é imediatamente divulgado por todos os meios de comunicação. A moça é acusada de ter matado a filha com cocaína na mamadeira e seu nome e foto são imediatamente distribuídos ao público – a ponto de colocar em risco sua segurança entre as demais detentas.

Já outros crimes são tratados pela imprensa com muito mais gentileza. No caso do provável vazamento de informações sobre a venda da Ipiranga a um consórcio liderado pela Petrobras, o suspeito não tem seu nome mencionado. Fala-se vagamente em ‘empresário’, ‘cotista de um fundo de investimentos num paraíso fiscal’, ‘uma pessoa de dentro da empresa’.

Se fosse pobre e preto, já estaria até na cadeia, com foto, filme, vídeo, YouTube e salva-tela de telefone digital. Mas, quando o cavalheiro é rico, autoridades e jornalistas preferem cumprir os bons preceitos da profissão, e acusar apenas quando houver uma boa e sólida base para isto.

Por que não repetir esse comportamento em todos os casos?



Inculta e bela

Não faz muito tempo, uma bacharel em Direito mandou irada carta aos jornais para dizer que ela, tendo estudado mais que os outros, tendo-se especializado, deveria escrever diferente, naquilo que chamava de ‘linguagem culta’.

Em textos encaminhados a tribunais, encontramos palavras como ‘supedâneo’ (suporte), ‘ergástulo público’ (cadeia). E já foi possível ouvir um honorável professor citar algo do tipo ‘é condição sine qua non, como dizem os franceses’.

Data vênia, vale a pena ler o livro Português para convencer – Comunicação e persuasão em Direito, do juiz Túlio Martins e do professor Cláudio Moreno (271 pp., R$ 49,00) – para aprender e para divertir-se com os exemplos autênticos encontrados em documentos enviados aos tribunais. Exemplo citado no portal gaúcho Espaço Vital:

‘Destarte, como coroamento desta peça-ovo emerge a premente necessidade de jurisdição fulminante, aqui suplicada a Vossa Excelência. Como visto nas razões suso expostas com pueril singeleza, ao alvedrio da lei e com a repulsa do Direito, o energúmeno passou a solitariamente cavalgar a lei, este animal que desconhece, cometendo toda sorte de maldades contra a propriedade deste que vem às barras do Tribunal. Conspurcou a boa água e lançou ao léu os referidos mamíferos.

Os cânones civis pavimentam a pretensão sumária, estribada no Livro das Coisas, na Magna Carta, na boa doutrina e nos arestos deste sodalício. Urge sejam vivificados os direitos fundamentais do Ordenamento Jurídico, espeque do petitório que aqui se encerra. O apossamento solerte e belicoso deve ser sepultado ab initio e inaudita altera parte, como corolário da mais lídima Justiça’.

Completa o juiz Túlio Martins:

‘Como disse muito bem David Mellinkoff — talvez o autor que mais lutou pela simplificação do Inglês usado no Direito americano —, a linguagem do advogado deve ser idêntica à de qualquer outra pessoa culta e articulada de nossa sociedade, ‘exceto naqueles raros pontos em que realmente há uma razão para ser diferente’’.



Outras palavras

Num só dia, num só portal de internet (e, suspeite-se, provavelmente um só redator, assoberbado de trabalho), uma sucessão de títulos notáveis [grifos meus]:

1. ‘Polícia prende dois suspeitos de matar soldado da PM em São Paulo’

2. ‘Polícia prende suspeito de fingir ser agente da Abin em São Paulo’

3. ‘Secretaria decide afastar professora suspeita de agredir aluna em SP’

4. ‘Advogada suspeita de envolvimento com PCC deixa presídio em SP’

5. ‘PF prende suspeitos de fraude para obter passaportes a estrangeiros’

6. ‘Polícia prende suspeitos de traficar drogas em LAN house em SP’



Notícia vs. notícia

Na primeira página do portal noticioso, a foto de um acidente de ônibus em São Paulo. Uma foto excelente, na qual aparece direitinho até o número do ônibus. No material interno, a informação: ainda não se sabe a companhia a que pertence o ônibus.

Não seria ótimo se o pessoal lesse seu próprio portal?



E eu com isso?

William Waack, jornalista consagrado e experiente, em palestra outro dia na Faap, em São Paulo, lembrou os velhos tempos do telex – um antigo símbolo da modernidade (e como era difícil e lento trabalhar com ele!).

Pois é: a tecnologia tanto avançou que o telex está esquecido, bem como seus primos próximos, os teletipos. O fax, que há 20 anos era modernérrimo, está hoje a caminho da aposentadoria. Agora vale a informação digital. Como esta:

** ‘Elizabeth Taylor dá conselhos à Britney Spears e Lindsay Lohan’

A eterna Liz Taylor disse às meninas que deveriam parar de correr atrás da fama a qualquer custo, como o fazem hoje. Liz sempre soube que os melhores amigos da mulher, como na canção clássica interpretada por Marilyn Monroe, eram os diamantes (‘Diamonds are girls’ best friends’, do filme Os homens preferem as loiras).

Agora sabemos também, no instante em que foi escrita a notícia, que:

** ‘`Ficante´ de Naomi Campbell diz que ela é garota pra um fim de semana apenas’

**Cauã Reymond e Alinne Moraes se encontram em show no RJ’



Totalflex

A brincadeira de ‘escolha o final de seu título’ continua a pleno vapor na internet. O portal dá uma parte da história e você decide como completa.

** ‘Edwards continua candidato à presidência apesar de sua mulher enfrentar um’

** ‘Menina de menos de dois anos é encontrada com intoxicação por cocaína na’



Os grandes títulos

A idéia do título abaixo é boa (e, dirão alguns, até adequada). Mas é visível que houve um erro de digitação – que ninguém corrige para não perder tempo e ser o primeiro a levar a notícia errada ao internauta:

** ‘Policias do Sudeste terão bando de dados integrado’

E o melhor, sem dúvida, é este – com direito até ao vídeo da Vovó da Pizza para quem decifrar seu verdadeiro sentido:

** ‘Meninas tão mulheres com as maquiagens da Betulha’

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados