Com chamada no alto da primeira página numa gorda edição de sábado e mais três páginas no caderno Esporte, a sabatina com o corintiano Ronaldo foi um fenômeno (Folha de S. Paulo, 16/5).
O rapaz goleou, disse coisas que mereceriam ser comentadas, desdobradas e amplificadas.
A mais importante: Ricardo Teixeira [presidente da CBF] ‘é um homem com duplo caráter’.
Duplo caráter seria uma forma diplomática de dizer que a pessoa não tem caráter algum? Caráter é apenas um traço distintivo de alguém ou o seu comportamento moral?
Enquanto não se destrincha o seu real significado, vale a pena avaliar o impacto da afirmação. Tudo indica que até hoje nenhum jogador profissional – famoso ou não – tenha ousado julgar de forma tão ostensiva a figura do todo poderoso donatário do futebol brasileiro. Ronaldo o fez. Maliciosamente, é verdade, sem esclarecer o que pretendia dizer, mas deixando claro que não estava fazendo um bom juízo do impoluto e probo Ricardo Teixeira.
Assunto encerrado
Então veio o fim de semana e encerrou o assunto como acontece com o noticiário político e o econômico. Neste caso, o assunto foi encerrado porque os cadernos esportivos estão cada vez mais magros e não dão conta de todos os eventos do fim de semana em tantas modalidades e países.
Além disso, a matéria geradora foi uma exclusiva da Folha e no jornalismo brasileiro os assuntos não são compartilhados. Como Ronaldo não teve um bom desempenho no jogo de domingo contra o Botafogo caberia à Folha e apenas a ela dar seqüência ao petardo político do jogador.
Nem tudo está perdido: O Globo também conversou com o Fenômeno (e aparentemente depois de publicada a sabatina da Folha, na segunda-feira, 18/5, capa e página 2 do caderno Esportes). No fim da longa entrevista o repórter quis saber qual a resposta da CBF ao comentário sobre Ricardo Teixeira: ‘Ninguém me ligou. E acho que nem vão ligar’.
Ligariam, se o nosso jornalismo diário fosse efetivamente diário. E ficaria esclarecido se duplo caráter é o mesmo que nenhum caráter.