O Brasil tornou-se em 2011 a sexta maior economia do mundo, segundo as últimas estimativas, mas é um país com baixo grau de inovação industrial e enorme carência de engenheiros e outros profissionais com formação científica e tecnológica. Esses dados são bem conhecidos, mas foram pouco explorados pela imprensa quando se noticiou a escolha do físico Marco Antônio Raupp para comandar o Ministério de Ciência e Tecnologia.
Os jornais mencionaram as queixas de petistas e apontaram a decisão da presidente Dilma Rousseff como sinal de possível mudança nos critérios da administração. Todos noticiaram a reação favorável da comunidade científica e o Globo chegou a publicar, junto da notícia, um minieditorial intitulado “Revolução”. Esse material saiu na sexta-feira (20/1). Mas todos poderiam ter feito mais.
Faltou ouvir não só cientistas, mas também especialistas em questões de competitividade e desenvolvimento econômico, para mostrar a posição do Brasil em relação a outras grandes economias e, de modo especial, em relação a outros emergentes, conhecidos por seu empenho nas políticas educacionais e de inovação tecnológica. Faltou, em suma, chamar a atenção para o potencial estratégico do Ministério de Ciência e Tecnologia, certamente pouco explorado até agora.
Pelo menos até sábado (21/1), a ênfase foi quase toda concentrada num aspecto da decisão: a presidente resistiu às pressões do PSB e do PT. O primeiro pretendia retomar um posto ministerial controlado por vários anos e perdido com a nomeação do petista Aloizio Mercadante. Quanto aos petistas, defendiam a manutenção do ministério sob controle do partido. Ao decepcionar companheiros e aliados, a presidente pode ter dado um passo para mudar os critérios de atribuição de funções na administração federal. Essa hipótese foi mencionada pelos jornais, mas, de modo geral, com cautela.
Sob controle
Questões pertencentes ao território comum da política e da economia tiveram destaque na mesma semana. O Valor deu manchete, na sexta-feira (20), com a decisão presidencial de suspender a realização de concursos e a nomeação de funcionários até o Congresso aprovar a criação do Fundo de Previdência Complementar dos Servidores Federais. Em 2011, o déficit do sistema dos servidores chegou a R$ 56 bilhões e superou o do INSS, reduzido para R$ 36,5 bilhões, como havia destacado o Globo, na quarta-feira (18), em chamada na primeira página.
Durante a semana, a presidente reuniu-se com grupos de ministros para discutir o contingenciamento de verbas orçamentárias – algo entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões, segundo estimativas divulgadas pela imprensa. Foi decidido, no entanto, salvar da tesourada a chamada área social, e assim foi sacramentado o plano de estender as ações de transferência de renda a mais 320 mil famílias.
No sábado (21), a Folha de S.Paulo avançou na cobertura, atribuindo à presidente a intenção de apressar os planos de investimento no primeiro semestre, porque o calendário eleitoral impedirá a contratação de obras a partir de julho. Um dos problemas do governo, nesta fase, é conciliar a intenção de investir com a necessidade de manter o orçamento sob controle, para assegurar certo espaço de manobra num quadro de crise internacional.
Oportunidade de ouro
A própria crise centrada no mundo rico foi assunto de ampla cobertura na semana. Depois de ter rebaixado nove países da zona do euro, na semana anterior, a Standard & Poor’s cortou a nota do fundo de resgate europeu, mas o efeito no mercado financeiro foi pouco sensível. Itália, Espanha e outros países conseguiram lançar títulos e rolar suas dívidas sem muita dificuldade, apesar das mensagens agourentas das agências de risco, cada vez mais desacreditadas.
Alguns focos de preocupação permaneceram. A Grécia voltou a negociar com os bancos credores um corte substancial de sua dívida e, no fim da semana, as notícias sobre o assunto eram em geral otimistas, embora qualquer desentendimento ainda pudesse anular os avanços. Projeções atualizadas do Banco Mundial indicaram um ano muito ruim para a economia europeia, com repercussões para os emergentes, incluídos a China e o Brasil. Tudo isso ganhou o devido destaque.
A pauta dos dias seguintes deveria incluir um acompanhamento cuidadoso das decisões estratégicas do governo federal, com uma provável definição de prioridades para investimentos. A margem de escolha é necessariamente limitada pelos compromissos em relação à Copa de 2014. A pauta deveria incluir também os desdobramentos da nova encrenca comercial entre Brasil e Argentina. A presidente Cristina Kirchner decidiu apertar o controle das importações e parte importante da conta vai ficar para as empresas brasileiras.
Os jornais noticiaram declarações e acusações dos dois lados e a diretoria da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) decidiu mandar uma missão a Buenos Aires para discutir o assunto, atravessando com isso o caminho da ação oficial. Boa oportunidade, sem dúvida, para a imprensa mostrar como anda a diplomacia comercial neste governo.
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[Rolf Kuntz é jornalista]