Thursday, 07 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

Luiza, do Canadá para o governo

Na minha época de garoto, janeiro era sinônimo de férias, tranquilidade, ritmo mais lento, dormir mais tarde, acordar sem pressa. Nunca na vida poderia imaginar um mês de janeiro tão agitado como este. E, em grande parte (e em diferentes sentidos), as redes sociais fizeram deste o janeiro mais social de todos os tempos.

Nos primeiros dias do mês, a Luiza voltou do Canadá, um senador americano lançou um projeto natimorto que tentava regular a internet sob a sigla Sopa (algo como: lei de combate à pirataria online), azaração virou caso de polícia no BBB e alguns rabugentos aproveitaram a deixa para espinafrar a inteligência das novas gerações e as empresas de internet. Tudo isso “viralizou” e foi compartilhado e comentado nas redes sociais por milhares de pessoas nas últimas semanas.

Em meio a inúmeras análises, não deixaram de comparar a velha e a nova mídia. Ouvi e li que a falta de profundidade dos temas mais comentados é culpa das “novas mídias”. Ora, a nova mídia na verdade não determina qual a profundidade ou quais temas interessam mais para a sociedade. Novas tecnologias e plataformas digitais permitem, sim, o acesso ubíquo a um número muito maior de assuntos. E acredito que, se o dedo vai ficar sujo de tinta ou terá que esfregar a tela para virar uma página, a matéria-prima da notícia e quem a produz serão cada vez mais relevantes. A mudança fundamental é que produzir notícia se tornou algo simples e fácil.

A notícia não “viralizou”

O celular inteligente faz hoje o que antigamente era feito por uma velha máquina de escrever, uma câmera fotográfica e um telex (equipamento que transmitia textos para as redações de jornais). Juntos! Se as notícias acima se tornaram relevantes, é resultado do que a sociedade se interessa em ler e compartilhar. Essa é a nova regra da comunicação moderna, baseada nas interações sociais virtuais. E vale tanto para notícias como para qualquer outra interação. Seja com seus amigos, seja com empresas e serviços com os quais nos relacionamos.

Um dos questionamentos mais frequentes que faço a executivos nas minhas palestras é: sua empresa é capaz de gerar uma informação que é relevante para seus consumidores e que desperte neles o interesse em compartilhá-la? É assim que funciona…

A notícia mais relevante para mim surgiu nesta semana em meio à dança das cadeiras em Brasília, que por sinal também não tirou férias. A informação, no entanto, não chegou nem perto do frenesi virulento que outros temas banais geraram nas redes sociais. Na segunda-feira (23/01), li na “velha mídia” que a presidente Dilma Rousseff determinou que todos os programas de governo tenham monitoramento online e, preferencialmente, em tempo real. Apesar de extremamente relevante, a notícia não “viralizou”!

Projeto indispensável

O que Dilma quer fazer é dar um passo inicial para transformar os projetos do governo numa espécie de Luiza, que voltou do Canadá, a serviço do governo. A ideia é contar para todos o que está acontecendo e deixar que a sociedade monitore, compartilhe e controle os projetos do governo. É exagerada a afirmação da nossa presidente de que o projeto é revolucionário, tendo em vista que a informação ainda passa pelo crivo esperto dos membros do governo.

Segundo o porta-voz da Presidência, os dados poderão ser divulgados, mas o acesso ao sistema de monitoramento será inicialmente dos membros do governo. E completa: “Sim, eventualmente as informações serão publicizadas.” Com certeza, é um passo importante na criação de ferramentas que possibilitem esse monitoramento.

Fazer com que essa informação seja disponibilizada com coragem e transparência para todo e qualquer cidadão… Esse, sim, será um projeto revolucionário, progressista e indispensável.

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[Alexandre Hohagen, jornalista e publicitário, é responsável pelas operações do Facebook na América Latina]