Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Emoção e preconceito

É difícil cobrir uma tragédia como a do Rio: há a emoção, a competição, as informações desencontradas, as autoridades loucas por um holofote falando aquilo que lhes vem primeiro à cabeça para garantir seu espaço nas notícias. Nesse clima tenso, envenenado, muita bobagem acaba achando seu espaço.

Preconceito, por exemplo. No noticiário do primeiro dia, já se destilou preconceito contra ateus, contra quem não partilha os valores cristãos, homossexuais, soropositivos, nerds, muçulmanos fundamentalistas, pastores evangélicos que teriam influenciado o assassino com seu fundamentalismo bíblico. Dentro da imprensa, um grupo de jornalistas chegou a discutir os limites da cobertura de uma tragédia desse tipo, para evitar que malucos diversos, para alcançar alguns instantes de notoriedade, saiam matando gente por aí. Houve até quem sugerisse que tragédias como essa fossem noticiadas omitindo-se o nome do assassino, evitando a publicação de sua foto. Sabendo que não alcançaria a fama, talvez muita gente se contivesse.

É um tema que vale discutir, embora este colunista ache que sempre haverá alguém disposto, para levar vantagem, a violar o que tenha sido combinado. Mas também vale a pena discutir o tema do preconceito: no Brasil, o preconceito de etnia, de religião, de todos os tipos está ainda arraigado.

Não faz muito tempo, a torcida de um time de futebol, por considerar que um jogador era homossexual, discriminou-o fortemente, a ponto de nem mencionar seu nome. E agora mesmo um jogador de vôlei se sentiu obrigado a proclamar publicamente sua homossexualidade depois de um jogo em que o estádio inteiro gritava “bicha, bicha” sempre que ele tocava a bola. O deputado federal Jair Bolsonaro agora diz que não era o que queria dizer, mas o que disse é que um filho seu não namoraria uma negra porque tinha sido bem educado e não vivia num ambiente promíscuo. Um americano, judeu, decidiu processar o criador do Facebook, Mark Zuckerberg, também judeu, por não ter eliminado imediatamente uma página que pregava a violência no Oriente Médio. O título da notícia já identifica o autor do processo não como americano, nem como ativista, nem como militante, mas como “judeu”. E, nos comentários, há coisas como “Eles que são $hudeu$ que se entendam”.

Não é chamando negro de afrodescendente que o preconceito vai desaparecer.

É difícil, no calor da cobertura, distinguir uma opinião fundada de um caso de preconceito. A história do fundamentalismo islâmico, por exemplo, se baseava exclusivamente na barba que o rapaz teria deixado crescer (e que, conforme dizem, raspou na véspera do crime) e em comentários esporádicos de que gostaria de destruir grandes alvos, como ocorreu no 11 de setembro. Seria, claro, o primeiro caso de fundamentalista islâmico apelar a Jesus, como está em sua carta de suicídio, e não a Alá. Já a história do homossexualismo tem outra origem: ele matou mais meninas do que garotos, portanto não gostava de mulheres e tinha mais consideração por homens. E gostava muito de computadores, logo… e seu melhor amigo, nos tempos de escola, era fanho… e tinha o apelido de Swing, porque mancava de uma perna… e sua mãe biológica, que ninguém ali conhecia, certamente era louca… e, com diagnóstico positivo de Aids, decidira vingar-se das humilhações que havia passado naquela escola… A história de Aids, a propósito, não se sabe de onde apareceu.

Cuidado, pois: quem tem preconceito sempre busca espalhá-lo, conscientemente ou não. E a imprensa pode se tornar o amplificador dos preconceituosos.

 

Oposição, sempre

Um detalhe curioso da tragédia do Rio é que, como de hábito, boa parte da imprensa responsabilizou o Governo. Bobagem: escola não é banco e não pode ser policiada como se fosse um banco (e, aliás, há assaltos a bancos com certa frequência). A escola é um ponto de inclusão, de integração, não de exclusão. Detectores de metais? Lamentavelmente, há armas que passam pelos detectores. Cães farejadores? Raios-X?

Não, nada disso: uma pessoa enlouquecida pelo desejo de matar dificilmente será contida. O presidente americano Ronald Reagan, com toda a sua segurança a postos, levou um tiro no estômago. O papa, no meio de uma multidão, foi alvejado por Mehmet Ali Agca. Um dos homens mais bem guardados do mundo, o dirigente egípcio Anuar Sadat, foi assassinado durante um desfile militar.

A crítica ao Governo, no caso, é um cacoete: a culpa de tudo é sempre dos governantes. Como a história do desarmamento (e este colunista, não custa lembrar, é a favor de desarmar os civis): numa tragédia como esta do Rio, o criminoso sempre dá um jeito de arranjar armas, sejam proibidas ou não.

Só faltou quem pusesse a culpa nos Estados Unidos. Mas, até o momento em que fechávamos esta coluna, o presidente Hugo Chávez não se havia pronunciado. Se os americanos foram responsabilizados por ele até por terremotos, por que não pela tragédia do Rio?

 

Um mundo pior

Era um homem sem inimigos. Sim, existiu, e tive a felicidade de conhecê-lo. Exerceu o jornalismo por mais de 50 anos e ninguém jamais encontrou algo para falar mal dele. E agora, dias após sua morte, após longa doença, a gente ainda se surpreende ao descobrir relatos de coisas boas de Reali Jr.

Casou-se com uma mulher sem inimigos – uma esposa que, não por acaso, chama-se Amélia. Na Embaixada informal do Brasil em Paris, sua residência pertinho da Torre Eiffel, Amelinha ficava feliz quando tinha muitos convidados para o almoço, o jantar, os drinques. Jamais reclamou do trabalho na cozinha, jamais se queixou de lavar os pratos – e isso, naturalmente, enquanto conversava com todos. Grande anfitriã, a Amelinha; inteligente, bem-informada, simpática, diplomática. Na casa da família Reali não havia discriminação ideológica: lá se reuniam pessoas que, em outros lugares, sequer trocariam um cumprimento. Esses convidados eram gente importante: Fernando Henrique Cardoso, Lula, Miguel Arrais, Delfim Netto, empresários de porte (mas a importância do personagem não tinha nada a ver com o convite: este colunista também esteve com Reali em Paris, quando as quatro meninas ainda eram pequenas, e foi recebido como em poucos lugares).

Elpídio Reali Jr. fez de tudo em imprensa, na época em que a palavra multimídia era ainda desconhecida. Foi repórter de campo de TV, foi repórter e comentarista de rádio, foi repórter e comentarista de TV, escreveu em grandes jornais sobre futebol, politica, economia, relações internacionais. Viveu o jornalismo por inteiro: seus visitantes, em Paris, sempre lhe deixaram informações preciosas para compartilhar com os consumidores de notícias.

Essas informações, agora, vão rarear. Terão de buscar outros caminhos para chegar ao grande público. Mas isso não é o principal. O importante é que, sem Reali, o mundo ficou pior.

 

O repórter e o burocrata

Realinho, certa vez, foi contratado por uma grande rede de TV para comandar uma cobertura importantíssima: o general Golbery do Couto e Silva, principal assessor do presidente Ernesto Geisel, impulsionador da abertura politica, sofrera um descolamento de retina e seria operado em Barcelona. Na época, não havia essas facilidades de Internet, de comunicações fáceis. Havia, em alguns lugares, torres de TV com acesso a satélites. Por motivos que não vêm ao caso, a rede não pôde mandar as imagens de Portugal. Realinho mapeou a Europa, traçou um caminho terrestre até a Tchecoslováquia, com transmissão por microondas, e de lá a cobertura subiria para o satélite. Ao mesmo tempo, fazia a cobertura dos acontecimentos, já que o tratamento de saúde do general era o principal fato político brasileiro.

Enfim, a primeira reportagem, impecável, chegou ao Brasil. E o único comentário que o burocrata daqui fez ao jornalista de lá se referia ao cabelo, que estava “um pouco despenteado”. Realinho fez uma cobertura fantástica da cirurgia e do tratamento pós-operatório do general Golbery, e da movimentação política brasileira em Barcelona. E, depois disso, jamais aceitou nova incumbência daquela rede. Mas também não saiu por aí malhando os ex-companheiros e intitulando-se “progressista”. A propósito, ele poderia fazê-lo: Realinho era bem de esquerda, o que o levou ao deixar o Brasil no início da década de 70 e a morar mais de trinta anos na França.

 

O Dia do Jornalista

O jornalista Vitor Vieira, do portal VideVersus, foi agredido no Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul – com palavras, pelo presidente do Tribunal, o ex-deputado João Osório, que o expulsou do recinto; fisicamente, por seguranças de João Osório, quatro dos quais fardados. O atento jornalista Políbio Bragalevantou as gravações das câmeras de segurança do TCE e montou este filmete, que colocou no YouTube e encaminhou ao Movimento de Justiça e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul. As gravações das câmeras externas (lá, segundo disse a vítima, prosseguiram as agressões físicas) não foram fornecidas: segundo o tribunal, são câmeras ocas, sem equipamento.

 

E, por falar…

O presidente francês Nicolas Sarkozy não cumpriu a promessa, mas, segundo o jornalista Franz-Olivier Giesbert, diretor da revista Le Point, ele ameaçou “quebrar sua cara”. Motivo: em janeiro de 2008, a revista publicou uma reportagem sobre o passado de Carla Bruni, então recém-casada com Sarkozy, qualificando-a como “devoradora de homens”.

 

…no assunto

A história está no livro “Sr. Presidente – cenas da vida política de 2005 a 2011”, que Giesbert acaba de lançar. Ele diz também que a própria Carla Bruni não se incomodou com a publicação de uma lista de seus namorados, mas lhe disse que Sarkozy, “profundamente apaixonado”, tinha se irritado muito com a reportagem.

Há uma diferença importante entre a história francesa e a gaúcha: no caso francês, quem ameaçou bater no jornalista foi o próprio presidente, e tudo ficou só na ameaça. No caso gaúcho, o jornalista foi agredido por seguranças, depois de ter sido insultado pelo presidente do tribunal, que se limitou às agressões verbais e preferiu delegar a atividade física a terceiros.

 

Bons livros…

Marçal Aquino, um dos melhores escritores brasileiros da nova geração, novelista, roteirista, grande companheiro, lança na quarta-feira seu novo livro: O invasor, um livro de muita ação, ambição, violência – base do roteiro do premiado filme do mesmo nome, do diretor Beto Brant. A seu lado, Reinaldo Moraes lança dois livros em um: Tanto Faz e Abacaxi. São engraçados, levemente pornográficos, bons de ler. O lançamento ocorre nesta quarta (13/4), a partir das 19h30, na Livraria da Vila – rua Fradique Coutinho, 916, em São Paulo. E inaugura um novo selo, Má Companhia, para gente inteligente que detesta o politicamente correto.

 

Fica difícil 1

Nos velhos tempos pré-Google, era um sacrifício convencer jornalistas iniciantes a consultar a pasta das pessoas que iriam entrevistar. Compreensível: era preciso pedir a pasta, preencher uma papeleta, mexer com papéis velhos e muitas vezes empoeirados, uma chatice. Mas agora, depois do Google?

Pois é: depois do Google, continua difícil. Um repórter andou procurando alguns especialistas em música popular: Sérgio Carbra, Emílio Bello de Carvalho e João Márcio. Cansou de procurar – até que uma alma caridosa o informou de que Sérgio Carbra era Sérgio Cabral, pai do governador do Rio; Emílio Bello de Carvalho era Hermínio Bello de Carvalho; e João Márcio, o legendário João Máximo. Aí ficou fácil.

 

Fica difícil 2

Não faz muito tempo, foi leiloado o milionésimo exemplar do Menino Maluquinho, de Ziraldo. Um repórter procurou a editora dizendo que tinha sido informado de que um menininho do Rio de Janeiro queria porque queria ficar com o exemplar 1 milhão, e que o pai dele estava disposto a gastar o que fosse preciso para atendê-lo. Queria saber o nome do menino ou do seu pai.

Bom, ninguém nunca tinha ouvido falar dessa história. Até que alguém, de repente, decifrou tudo: como Ziraldo desenvolveu toda a sua carreira no Rio, o governador Anthony Garotinho decidiu que pagaria o que fosse necessário para manter no Rio o milionésimo exemplar do Menino Maluquinho. O tal menininho era Garotinho. E para explicar ao repórter, sem ofendê-lo, que não era bem aquilo? E para explicar-lhe, em seguida, que o governador do Rio usava efetivamente o nome político de Garotinho?

 

Como…

A descoberta de um bombardeiro Dornier-17, derrubado sobre o mar nos ataques da Alemanha à Grã-Bretanha, saiu primeiro na edição brasileira de um portal internacional; em seguida, saiu a mesma notícia, igualzinha, num imenso portal brasileiro de notícias. E, sendo a notícia igualzinha, igualzinho também era o erro:

“O avião, de 52 metros de comprimento e 18 de envergadura (…)”

O avião tem pouco menos de 16 metros de comprimento. O tamanho apontado na notícia é o de três aviões somados, mais um pouquinho.

 

…é…

De um grande portal esportivo:

“A diretoria do clube pernambucano se encontrou com membros da direção corintiana na última quarta-feira, em São Paulo, após a derrota por 2 a 0 contra o São Paulo, pela Copa do Brasil, no Morumbi.”

Tudo bem – mas “derrota contra” é meio esquisito. E o jogo não foi no Morumbi: foi em Barueri. Rima, mas não é o mesmo estádio.

 

…mesmo?

De um grande jornal regional, aliás ligadíssimo ao Governo:

“O ministro da Educação, José Haddad, considerou este um dia de luto para a educação brasileira”.

Foi uma maldade terrível: trocar o nome justamente de Fernando, o mais vaidoso dos ministros, apelidado até de Fernando Vaidade!

 

Mundo, mundo

“Americano que escreveu guia para pedófilos é condenado”

Se pedofilia é crime, nada mais justo do que punir também quem orienta os pedófilos (e ainda mais com argumentos que glorificam o sexo com crianças, lembrando que na Grécia, nos tempos da Sócrates, ter como companhia de jogos amorosos um garoto fofinho era quase uma obrigação).

Mas, como não disse Sócrates, nada há de novo sob a chuva. O gringo foi condenado, mas vai cumprir a pena em liberdade. Que horror, um país em que quem comete um crime hediondo como esse não fica preso nem um pouquinho!

 

E eu com isso?

É muita tragédia, gente. Tanta tragédia que o problema nuclear japonês foi jogado às páginas internas, tanta tragédia que mal se fala na Líbia, na Costa do Marfim, tanta tragédia que um novo terremoto no Japão passa despercebido. É preciso variar um pouco!

**Cláudia Leitte aparece de óculos

**Ke$ha usa o corpo para pintar quadros durante turnê

**“Faço descoloração em todo o corpo”, revela Juju Panicat

**Justin Bieber exibe abdômen em jogo de futebol e deixa fãs animadas

**Ângelo Paes Leme espera primeiro filho com a mulher

**Britânica gasta mais de R$ 50 mil no casamento de cadela de estimação

Sejamos bonzinhos. Mas o professor Felipe Jorge, que me ensinou Português, não iria tolerar o cacófato. “Cagasta” é duro de aguentar!

**Grávida, Daniele Suzuki compra enxoval do filho nos EUA

**Preocupada, mãe de Lady Gaga acompanha filha em turnê

**Jornal: amizade de Ivete Sangalo com o irmão estaria em crise

**David Arquette comemora sobriedade de cem dias pelo Twitter

 

O grande título

**Há uma coleção de títulos engraçados:

Aos 29 anos, mulher pesa 220 kg na BA

E fora da Bahia, quanto pesará?

**Príncipe William pode se casar com roupa militar de gala

Todos pensando que ele iria se casar com Lady Kate!

Lembra um pouco uma fantástica resposta atribuída a uma sexóloga americana, consultada por uma telespectadora que queria saber se podia tomar pílula com diarréia. Resposta: “Claro que pode. Mas a minha eu prefiro com água”.

O título vitorioso é muito melhor. Só pode ser este:

**Famosas brasileiras engravidam como nunca

Que será que elas andam fazendo?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados