Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha não larga o osso, deve ser bom

‘Sem diploma, famosos viram estrela em propaganda de faculdades’, diz o título em cima da foto da deslumbrante Ana Hickmann (Folha de S. Paulo, domingo, 4/11, página C-10). O que chama mais a atenção nesta enorme matéria da Folha: os seios da vedete, a falta do plural [em estrela] ou a tolice exposta em estado tão puro?


A matéria parte de um factóide e pretende estabelecer uma falsa controvérsia: uma maneca como a Hickmann – que só terminou o curso supletivo – pode figurar num anúncio de uma universidade privada?


A Folha errou, a pergunta correta deveria ser outra: Ana Hickmann fez implante de silicone nos seios? Isso é o que efetivamente interessa. De qualquer forma, enquanto não se esclarece a transcendental questão, os mentores do lobby associados aos marqueteiros da Folhona pretendem vender a idéia de que o negócio do ensino superior é igual a qualquer outro, por isso não pode dispensar grandes verbas publicitárias nem a contratação de celebridades para estrelar os comerciais.


‘Não interessa se a Ana Hickmann não fez faculdade. Na publicidade, o que interessa é a imagem que você passa para o público’, proclama sabiamente Antonio Carbonari, presidente do grupo Anhanguera Educacional, logo no início. Há algo profundamente aristotélico nesta argumentação, pena que não foi destacado.


Encomenda entregue


A matéria foi encomendada à Folha pela universidade do senhor Carbonari para aproveitar a festa de lançamento da sua nova campanha de anúncios. Os publicitários ouvidos pela reportagem (como Bya Aidar da MPM Propaganda) vão na mesma linha: ‘Certamente as faculdades se basearam em pesquisa. Se fizeram essa opção é porque está dando resultado. Existem pessoas maravilhosas que cresceram na vida sem diploma’.


Nada disso surpreende, as matérias de interesse comercial agora entram na pauta normalmente, são publicadas no corpo do jornal sem características de matéria paga e assinadas por repórteres do quadro fixo. O que chama a atenção é a preciosa declaração de um professor da Faculdade de Educação da USP, uma universidade pública, Nélio Bizzo:



‘O sistema educacional do Brasil é pouco desenvolvido e o cliente [destaque do OI ] dessas faculdades não sabe ao certo o que acontece no curso. Assim como um anúncio de pasta de dente, em que a marca contrata um dentista para dar credibilidade, deveria ser evidente a faculdade trazer alguém que fez sucesso porque estudou lá.’


O presidente da Universidade Columbia, em Nova York, designaria os alunos como clientes? Quem vai esclarecer a palpitante questão será o emérito professor Arnaldo Niskier na sua próxima aparição na página 3 da Folhona. Aguardem.

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Jornalista