Uma página do Valor de 17/10 saiu com o erro que se vê nas imagens abaixo. Não é trágico nem cômico. É só um pequeno incidente dentro do grande desafio de fazer um jornal por dia. Mas é raro, e não há por que, num Observatório da Imprensa, deixá-lo passar.
Esclareça-se: o sentimento que inspira este registro é de homenagem a todos os que fazem os jornais, em todas as suas etapas.
Serve também para aludir à prática de usar um texto falso, sem sentido, “lorem ipsum”, para ilustrar a diagramação e testar a fonte usada. Os criadores desse recurso (há controvérsias a respeito) escolheram o latim para sinalizar claramente que não se tratava de um conteúdo verdadeiro, apenas de uma mancha gráfica. A escolha procura reproduzir um conjunto de letras, frases e pontuação representativo dos textos em alfabeto latino.
Hoje existem softwares e páginas da internet que fornecem o “lorem ipsum”, ou “lipsum” original, ou variações aleatórias. O advento da linotipo havia dado origem a um sucedâneo americano, “ETAOIN SHRDLU”, usado para testar a máquina. Não era raro o linotipista compor involuntariamente a expressão sem sentido.
Também merece menção uma frase que contém todas as letras do alfabeto inglês, “The quick brown fox jumps over the lazy dog”, usada para testar máquinas de escrever e teclados de computador.
“Poiuyt”
A revista Mad celebrizou, nos
anos 1950 e seguintes, uma figura paradoxal, contendo uma distorção de perspectiva, denominada “poiuyt”. Muitos fãs, incluído o autor deste tópico, levaram um bom tempo para descobrir que se trata apenas de uma sequência da mão esquerda, do dedo mindinho ao indicador, nas aulas de datilografia, acrescida de um tê.
Devo minha descoberta a Célia Maria Ladeira, então colega minha na Tribuna da Imprensa (hoje na Universidade de Brasília). Ela ficou com pena de me ver catando milho na máquina de escrever, o que era corriqueiro na época, e me deu uma lauda com exercícios para aprender a datilografar decentemente.
Os exercícios consistiam em repetir até enjoar seis sequências de letras, usando quatro dedos de ambas as mãos (os indicadores teclam duas letras seguidas nas duas primeiras sequências; uso aqui um teclado Microsoft convencional, cujo miolo é a reprodução do velho teclado das máquinas de escrever):
qwert/poiuy
asdfg/çlkjh
zxcv/.,mnb
Talvez a página do Valor tenha saído com erro porque o texto começa em português (indicando a medida do “olho”). O objetivo do “lorem ipsum” é que o conteúdo cause estranheza e o leitor veja apenas a formatação tipográfica. Um conteúdo sem sentido clama por remoção. Às vezes, o clamor é ignorado.