O título do último filme de Hector Babenco quase foi Mulher Zumbi, mas o cineasta achou pesado, optou por O Passado, que abriu na última quinta feira (18/10) a 31ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Nunca Babenco foi tão longe no seu universo de ‘malditos’ (O Beijo da Mulher Aranha, Pixote, Carandiru) embora alegue estar justamente saindo desta esfera para a dos sentimentos e os sentidos.
O Passado traz o fim de um casamento de 12 anos e a vã tentativa de novos relacionamentos com pelo menos três pessoas por parte do parceiro masculino. É só uma tentativa, porque a ex-mulher gruda, surge como um fantasma nos momentos mais impróprios, interfere, interpela, atrapalha, mata e seqüestra… até conseguir se aproximar do ex, que não quer, mas não sai, está preso na rede.
Perguntas pessoais proibidas
Não é surpresa para nenhum parceiro a construção do labirinto por quem foi abandonado, de qualquer sexo, para enredar aquele que saiu, embora as mulheres ajam com mais feitiçaria. A surpresa foi a coletiva organizada pela Mostra na sexta feira dia 19, único momento em que os jornalistas foram autorizados a entrevistar o ator mexicano de 29 anos, Gael Garcia Bernal, que já foi Padre Amaro e Che Guevara, e marcou Amores Brutos e Babel. Proibidas as perguntas pessoais, avisaram.
A mesa era formada pelo diretor Babenco e três das quatro ‘mulheres’ de Gael ou Rimini, incluindo a perseguidora Sofia (Analía Couceiro). Quarenta minutos de perguntas vagas num auditório lotado (de onde saiu tanto jornalista?), ocupando todos os degraus, lotando as rampas até a porta. Como de início as perguntas não saíam, o diretor da Mostra, Leon Cakoff, provocou a mesa. Babenco pegou o microfone dirigindo ‘o filme’ de perguntas e respostas, e, talvez por medo de que a ala feminina enxergasse um machismo em O Passado, foi logo avisando: ‘é só uma comédia, hein? Um tango, é só um filme’.
Quando enfim a platéia se animou surgiram perguntas básicas feitas por representantes de sites e órgãos de imprensa, alguns pouco conhecidos, e só no final um jornalista provocou um pouco Gael ao perguntar por que persongem Rimini agia como teleguiado parecendo um ‘boludo’ nas mãos de sua ex, Sofia. Pronto, a entrevista acabou. Oportunidade para fotos. E tchau.
Tchau? A limitação de tempo, perguntas e profundidade no tema cinematográfico, em vez de instigar dignidade e profissionalismo na imprensa que foi desta vez quem levou o ‘fora’, provocou reação contrária, a reação de Sofia, o grude dos preteridos.
Um cardume de repórteres mulheres atacou o darling Gael com perguntas que iam do nada a coisa nenhuma, do tipo ‘como você se sentiu ao ficar nu no filme?’, às quais o guapo ator respondia com um incrédulo ‘hum hum’, ‘han han’ que não acrescentava nada e mal conseguia ouvir o que queria que respondesse ao cardume de gravadores acoplados a sua boca.
Com um olhar de socorro, Gael tentava alcançar o elevador de escape. Mas, tal e qual Rimini, ele não conseguia escapar da rede de jornalistas mesmo sem se deter um passo, escoltado pelos seguranças. Sufocado por microfones como naqueles filmes em que o protagonista avisa ‘lá vem a imprensa, por onde posso escapar?’, e evapora-se antes que o bando de invasores tomem conta da cena, Gael escapuliu sem dizer igualmente nada nem coisa nenhuma às perguntas idem.
Este papel da imprensa nas telas de cinema ou TV sempre é incômodo. O lugar onde foi colocada. Soa injusta. Não desta vez.
Os jornalistas aparecem bem em vários filmes como Reds, de Warren Beatty, Todos os Homens do Presidente, de Alan Pakula e Boa Noite, Boa Sorte, de George Clooney. Mal, em uma série de outros como Cidadão Kane, de Orson Welles, A Montanha dos Sete Abutres e A Primeira Página, de Billy Wilder, Capote, de Bennett Miller.
Mal, também, em uma infinidade de filmes B ou aqueles feitos para suprir as múltiplas horas que a TV a cabo deixou vagas. E não é que para Gael Garcia Bernal a imprensa brasileira escolheu protagonizar, na abertura da Mostra, justo um filme B?