Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nossas armas e as armas do poder

O jornalista e apresentador de TV Paulo Henrique Amorim pediu proteção à Polícia Federal: considera-se perseguido pelo banqueiro Daniel Dantas, contra quem move dura campanha, e pelo governador paulista José Serra. A perseguição, diz Amorim, se estende à sua família.

O médico-legista Daniel Ponte não apenas denuncia perseguições a si como pede à OEA, Organização dos Estados Americanos, que proteja outras pessoas que considera em risco: o delegado Protógenes Queiroz, da Polícia Federal, e o jornalista Ucho Haddad. E isso não ocorre em regiões distantes, em pequenos municípios que vivem sob a lei da selva: tanto Ucho Haddad quanto Paulo Henrique Amorim trabalham em São Paulo, a maior cidade do país.

Nas regiões distantes, a situação é ainda mais grave: quase todos os dias há notícias sobre tiros, atentados, emboscadas a jornalistas. Numa das cidades mais desenvolvidas do Brasil, Campinas, parece claro que o mandante de um atentado a granada contra um grande jornal, o Correio Popular, foi um criminoso condenado e preso – que, dentro da cadeia, mantém seu comando sobre a quadrilha.

Aonde precisaremos chegar para que haja providências oficiais? Parece óbvio, mas quem está na cadeia não pode nem ter comunicação livre com quem está fora, quanto mais transmitir ordens e determinar ações criminosas. Parece óbvio, mas só teremos liberdade de imprensa de verdade se jornalistas como Paulo Henrique Amorim e Ucho Haddad, concorde-se ou não com o que dizem, tenham condições de segurança para exercer a profissão. E não se pode aceitar que autoridades sejam acusadas de promover perseguição contra jornalistas sem que uma investigação imediata busque indícios de sua culpa ou inocência.

Importante: a segurança inclui não apenas o risco de vida, mas toda e qualquer forma de coação. O jornalista tem de ter garantido o direito à liberdade de locomoção, à vida pessoal, à intimidade (não ser seguido, não ser vigiado, não ser filmado, não ser espionado, a não ser por decisão judicial). Jornalismo é, de certa forma, e sempre, uma profissão de risco. Mas é conveniente não exagerar.

 

Hoje aqui, amanhã ali

Quando Paulo Francis e Joelmir Beting deixaram a Folha de S.Paulo com destino ao Estadão, a mudança foi aceita com naturalidade: eram dois profissionais em busca de melhores condições de trabalho. Quando a Rede Globo reduziu a um mínimo a participação na área jornalística do lendário Cid Moreira, a mudança foi aceita com naturalidade: tratava-se de um processo de renovação que um dia iria acontecer.

Agora as reações são outras: ninguém sai de uma empresa por razões profissionais, ou de mudança de objetivo: tudo é político. Olavo de Carvalho deixou o Jornal do Brasil, por não aceitar que sua coluna se transformasse de semanal em mensal. Pronto: seus fãs acusam ‘a grande imprensa’ de estar ‘infestada por socialistas de botequim’. Parece que Augusto Nunes, diretor de Redação do JB, jornalista experiente, dono de um dos melhores textos da imprensa brasileira, odeia os leitores que lhe pagam o salário; parece que Nelson Tanure, empresário que comanda o jornal, quer reduzir o número de leitores de sua empresa.

Há demissões e contratações políticas, é evidente; mas, da mesma forma, é evidente que não são todas. Há quem deixe o veículo de comunicação por não atrair muito público. Que tal examinar as hipóteses profissionais antes de mergulhar nas teorias conspiratórias do jornalismo?

Aliás, foram partidarizadas até as mudanças que não aconteceram. Há uns dois anos circulam na internet informações sobre os motivos da demissão de Alexandre Garcia da Rede Globo. Só que Garcia continua lá, apesar dos boatos. E os boatos continuam a circular, embora Garcia continue onde sempre esteve.

 

Jornais em alta

A propósito, confirmando que os jornais buscam mais leitores, e não menos, saiu informe do IVC, Instituto Verificador de Circulação. O crescimento médio da circulação paga dos jornais foi de 5% em 2008, na comparação com 2007. De 4 milhões, 113 mil exemplares diários (só de jornais filiados ao IVC), a circulação paga diária passou para 4 milhões, 350 mil exemplares. Nos dois anos anteriores também houve aumento de circulação, de 6,5% (2006) e 11,8% (2007).

Completando: o jornal de maior circulação paga no país continua sendo a Folha de S.Paulo, que foi também o jornal que teve o maior crescimento em 2008.

 

Web em alta

Nos Estados Unidos, segundo informação do instituto Nielsen, o jornalismo na internet continua crescendo vigorosamente. Em dezembro de 2008, a audiência aumentou 16%, comparada com o mesmo mês de 2007.

É o público buscando cada vez mais informações, e cada vez mais variadas.

 

Ame-o ou deixe-o

E, já que falamos em partidarização, veja só o que saiu no blog governista ‘Por um novo Brasil – sem medo de continuar sendo muito feliz’: após elogiar as medidas econômicas do presidente Lula, ataca os oposicionistas.

‘O Brasil é um país livre, não impede ninguém de sair e se instalar onde lhe convier (…) por que não vão para onde lhes agrada? Por que ficar sofrendo aqui no Brasil, se acham que existem lugares melhores para viver, estudar, trabalhar, criar seus filhos? (…) A porta da rua é serventia da casa’.

Só não é igualzinho aos tempos do general-presidente Emilio Garrastazu Médici porque o slogan dele, com o mesmo objetivo, era mais bem formulado: ‘Brasil, ame-o ou deixe-o’.

 

A Escola Base nua

A grande imprensa, finalmente, passou a cobrir o caso Colina do Sol – a história de um grupo de quatro nudistas, dois americanos e dois brasileiros, que acabou preso, sob acusações das mais estranhas. Todos foram libertados: contra eles, acusados de pedofilia, não há depoimento de qualquer vítima (e mesmo assim ficaram mais de um ano presos). É um dos casos jornalísticos atuais que mais lembram o escândalo da Escola Base: em cima de declarações de autoridades loucas por holofotes, os meios de comunicação ajudaram a destruir a vida de várias pessoas inocentes e a dilapidar seu patrimônio.

Ainda bem que a imprensa entrou no caso. Mas, se entrasse mais cedo, dificilmente os acusados teriam ficado presos por tanto tempo, sem que houvesse qualquer acusações verossímil contra eles. Vale a pena, a propósito, ler o depoimento que um dos americanos, Frederick Louderback, fez logo após ser solto.

 

Tri-silêncio, tchê!

A governadora gaúcha Yeda Crusius decidiu que também precisa de seu AeroLula: quer porque quer um aviãozinho novo, que deve custar algo como US$ 26 milhões. Desafia: ‘Podem chamá-lo de AeroYeda, de Queen Air, do que quiserem’. A governadora, a propósito, comete um equívoco: Queen Air é o nome de um avião da Beechcraft, a hélice, bem mais barato do que ela está disposta a pagar. Mas quem vai querer um avião barato, se a conta é do contribuinte?

O tema aqui, porém, é outro: a imprensa malhou pesadamente o presidente Lula quando comprou seu Airbus A-319. Agora, trata com muita discrição e gentileza o avião novo da senhora governadora. É o caso típico de dois pesos, duas medidas – até porque o avião de Lula, proporcionalmente à arrecadação do país, é muito mais barato que o avião de Yeda, que o Rio Grande do Sul paga sozinho.

 

Erramos

Esta coluna informou que ninguém havia noticiado a multa a quatro bancos. O correto é ‘quase ninguém’: o jornal Valor, discretamente embora, deu a notícia.

 

Como…

Do portal noticioso de um grande jornal:

** ‘A estudante diz que não pensa em pousar para uma revista masculina’

O pessoal se enganou com relação à notícia. Pousar não é tão importante. Difícil mesmo deve ser o vôo da moça antes do pouso.

 

…é…

De uma coluna noticiosa de grande prestígio:

**Celebração do sexto centenário de São Paulo, 1954

São Paulo, quem diria! Foi fundada uns duzentos anos antes do Descobrimento do Brasil!

 

…mesmo?

 De uma coluna importante:

** ‘Hoje em dia, o Brasil está liderando a cooperação com países da língua portuguesa, formando policiais da África, Haiti e Cuba’.

Liderança é isso: até Haiti e Cuba estão virando países de língua portuguesa.

 

E eu com isso?

Esta notícia deve ser mesmo importante, tanto assim que a própria assessoria de imprensa da dirigente partidária a distribuiu:

** ‘Heloísa Helena chega de barco ao Fórum Social Mundial’

Mas não é a única notícia-bomba dos últimos dias:

** ‘Miss América estava com infecção na garganta durante disputa, diz jornal’

** ‘Phelps acerta joelho em mesa durante fórum na Arábia’

** ‘Marcello Antony e Mônica Torres vão ao cinema e fogem da chuva’

** ‘Bad hair day: Uma Thurman surge desgrenhada’

** ‘Jessica Simpson reclama das críticas usando calça super-apertada’

** ‘Felipe Massa janta com a mulher e amigos’

** ‘Mickey Rourke é clicado carregando uma pizza inteira’

Puxa! Como ele deve ser forte!

 

O grande título

Há dois concorrentes interessantes. Um deles, naturalmente, do Big Brother, programa que por algum motivo faz com que todos os meios de comunicação divulguem a concorrente Rede Globo e procurem aumentar sua audiência:

** ‘Parte da casa dorme na tarde de domingo’

Entende-se: o imóvel trabalha muito, abrigando tanta gente, e precisa descansar.

O outro, o melhor da semana, traz aquele quê de mistério:

** ‘Caminhão-tanque destrói balsa e fica pendurado na Escócia’

É um título que lembra velhos tempos. Lembra uma pequena cidade, bem na fronteira de um estado com outro, com aquela fama de lugar distante. Os moradores das cidades próximas, quando se referiam àquela parte do frango de onde saem as penas do rabo, costumavam chamá-la pelo nome da cidadezinha.

Mas, cá entre nós, que será que quer dizer ‘fica pendurado na Escócia’?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados