Tudo saiu nos últimos dias, em publicações de grande circulação e excelente reputação. Ao senador Cristovam Buarque, ex-ministro da Educação, é atribuída a palavra ‘coalização’. Ao Sandro Vaia, excelente jornalista, diretor de Redação de O Estado de S.Paulo, atribui-se uma carta ‘despretenciosa’. Nikki Lauda, grande piloto de Fórmula 1, vira ‘Nick’. E o general Golbery, um dos homens mais poderosos do regime militar brasileiro, se transformou em ‘Golbery da Costa Couto’.
Pobre Golbery do Couto e Silva! Cruzaram seu nome com o de um adversário, o marechal Costa e Silva. Ou com o do civil Ronaldo da Costa Couto, que já teve muito poder no Brasil e hoje é um festejado historiador. Nikki Lauda, para virar ‘Nick’, teria de trocar sua Áustria pela Austrália, ou por algum outro país de língua inglesa. Mas, como no caso da troca do nome do general, qual jornalista se importa com o nome dos outros?
O pior é o que aconteceu com Cristovam Buarque e Sandro Vaia. Cristovam é um intelectual, é professor universitário, foi reitor da Universidade de Brasília. Pode ter milhões de defeitos, mas jamais diria ‘coalização’ em vez de ‘coalizão’. E o Sandro Vaia, palmeirense incorrigível (ninguém é perfeito!), preferiria aparecer no Estadão com a gloriosa camisa do Corinthians a trocar ‘despretensiosa’ por ‘despretenciosa’.
Enfim, batatada também faz parte do nosso ofício. E não é apenas no Brasil: descrevendo para o New York Times um curso de árabe para militares americanos no Iraque, o enviado especial diz que ‘ninguém será capaz de ler Omar Khayyam depois desse treinamento’.
Claro que não: como é que um estudioso de árabe poderia ler Omar Khayyam no original, se ele escrevia em persa?
Regência deposta
Há erros que, de repente, se tornam moda. Entrou na moda, por exemplo, destroçar a regência dos verbos. ‘Eu não lhe conheço’, em vez de ‘eu não o conheço’, ‘não posso lhe respeitar’ em vez de ‘não posso respeitá-lo’ são cada vez mais comuns. Talvez isso se deva ao maior convívio com vícios regionais de linguagem, como este, de trocar o ‘o’ por ‘lhe’, típico do português coloquial do Nordeste.
Mas há casos em que não dá. Por exemplo, num comentário sobre o livro de Bill Clinton, escreveu-se a seguinte pérola: ‘Sua mulher o olhava como se ele a tivesse dado um soco no estômago’. Ufa!
Modismos
E, por falar em moda, ninguém mais fazia alguma coisa ‘há’ alguns anos. Agora, as pessoas faziam alguma coisa ‘havia’ alguns anos. Por quê? Este colunista não tem a menor idéia – talvez pelo mesmo motivo que muito jornalista prefere trocar a expressão clássica ‘risco de vida’ por ‘risco de morte’. Ou que faz com que, na TV, ninguém brigue com ‘sua’ esposa: o cavalheiro briga com ‘a esposa dele’. E não se diga que é para evitar confusões: o telespectador sabe perfeitamente que não é com a simpática senhora que está a seu lado no sofá que vai ocorrer a briga.
Atenção, colegas!
O filme Pelé Eterno, entre centenas de gols antológicos, mostra a certidão de nascimento do Rei. Seu nome não é ‘Edson’ Arantes do Nascimento: é ‘Edison’ Arantes do Nascimento. O nome, esclarece o filme, foi dado em homenagem a uma personalidade admirada por Dondinho, pai do Crioulo: o inventor americano Thomas Alva Edison.
Limites
Este colunista é fã de histórias em quadrinhos e é fã de Garfield. Mas o que aconteceu nos jornais que publicam a tira é excessivo: no dia da estréia do filme de Garfield, a história em quadrinhos é pura propaganda. Não dá: pega mal para o jornal, pega mal para Garfield. E pega muito mal para nós, leitores.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados Comunicação; e-mail (carlos@brickmann.com.br)