Tudo bem, foram os parlamentares que provocaram: primeiro o senador Demóstenes Torres, que chamou a atenção do país para uma senhora de nome Jeanny Mary Corner, depois foi a senadora Heloísa Helena, com insinuações sobre lençóis e perfume Obsession. Mas os jornalistas não deveriam tê-los seguido, esclarecendo o que era obscuro e dando nome aos personagens da trama.
Se Palocci mentiu ao Congresso, se Palocci participou de alguma distribuição de renda heterodoxa, que seja processado. Mas suruba não é política, é questão de foro íntimo. Deslizes sexuais devem ficar fora do debate político, até por bom-gosto. Condenar o ministro por puladas de cerca é fundamentalismo moralista. E publicar histórias de puladas de cerca, com nomes e tudo, a menos que tenham vínculo político, não é jornalismo: é dedo-durismo de fofoqueiro.
Se a vida sexual do dirigente não interfere em sua atividade pública, não deve preocupar os jornalistas. O general Eisenhower comia sua motorista, e isso não o impediu de levar as tropas aliadas à vitória na Segunda Guerra. John Kennedy comeu metade de Hollywood, e seus mil dias de governo se transformaram numa lenda. Elizabeth I, por alcunha a Rainha Virgem, deu muito, e transformou a Inglaterra em potência mundial. Que é que deve ser estudado primeiro: seus inúmeros amantes ou a vitória sobre a Invencível Armada espanhola?
Respeitemos o ministro; lembremos que o ministro não é só ele, mas ele e sua família. Que responda por sua vida pública. E viva como quiser a vida privada.
Os preferidos
Quando um jornalista é convidado por um grupo para a cobertura de um ato criminoso, qual deve ser sua atitude? A discussão se aplica a um caso recente: 1.500 ativistas da Via Campesina, um dos braços do MST, que invadiram o horto florestal da Aracruz, a 56 km de Porto Alegre, e destruíram alguns milhões de mudas, além de inutilizar algo como 20 anos de pesquisas. O fato é que três redes de TV acompanharam os invasores e documentaram os atos de vandalismo. As três redes informaram que suas equipes acompanharam os 40 ônibus da Via Campesina sem saber o que fariam ou para onde iriam. A RBS, repetidora da Globo no Rio Grande do Sul, não foi convidada para acompanhar a destruição.
Este colunista acredita: cada emissora mobilizou carro, motorista, repórter, operador de câmera, equipamento, tudo para cobrir alguma coisa que não sabia o que era nem onde ficava. Poderia ser mais longe – neste caso, não haveria tempo para a reportagem chegar aos telejornais. Também poderia ser um piquenique em que as toalhas teriam estampado o rosto de Che Guevara, ou de Hugo Chávez. As emissoras teriam gasto tempo, dinheiro e equipamento, e não teriam matéria. Mas quem é que se importa com isso?
A propósito, este colunista conversou com advogados sobre a pergunta que abre esta nota. O jornalista, como qualquer cidadão, deve notificar as autoridades se for informado de que haverá a prática de um crime.
Mistério – 1
A TV mostrou que Duda Mendonça levava com ele, ao depor na CPI, uma esplêndida pasta de couro. Que é que carregava nesta pasta, se pretendia – e o fez – dizer a cada pergunta que não daria resposta? Documentos, talvez? Para quê? Este colunista continua curioso: leu blogs, colunas, noticiários, e não viu uma linha sequer sobre a pasta de Duda. Nem sobre seus óculos escuros, um curioso acessório numa sala onde jamais entrou sequer um raio de sol.
Teria a pasta de Duda algo a ver com a gentileza com que Suas Excelências o trataram? Pois Duda estava protegido, pelo habeas-corpus, de perguntas que pudessem incriminá-lo. Não era o caso de outras perguntas que se recusou a responder, como o nome de sua esposa. Mas iriam Suas Excelências enquadrar um cidadão tão educado, com uma pasta tão bonita?
Mistério – 2
O caseiro da Casa de Ribeirão Preto, 24 anos, salário mensal de 700 reais, vai depor acompanhado de um bom advogado. Tudo bem: é seu direito buscar uma assessoria de qualidade. Mas, com seu salário, certamente não é ele que está pagando os honorários advocatícios. Este colunista não chegou a ver esta informação relevante em nenhum meio de comunicação. Em algum lugar, atribui-se ao advogado a informação de que os honorários serão discutidos mais tarde. Continua a pergunta, ainda sem resposta: serão discutidos com quem? A quem interessava que o desempenho do caseiro na CPI fosse o melhor possível?
A história real
Em sua já longa carreira no jornalismo, Gabriel Manzano Filho foi preferencialmente um profissional de retaguarda: copy, editor, secretário de Redação. Numa breve escapada pela reportagem, Gabriel Manzano Filho comprovou mais uma vez que jornalista que é bom é bom em qualquer função. Foi ele, no Estado de S.Paulo, que desmontou a história do comandante do Exército, general Francisco Albuquerque – aquele que fez o avião suspender a decolagem e retornar ao ponto de embarque, para que ele e sua esposa não perdessem o vôo (e, de passagem, desalojou dois passageiros que já tinham embarcado e passou à frente de 14 outros, que também estavam na fila de espera). Manzano fez o que sempre deveria ser feito, por qualquer repórter: consultou os documentos de vôo, conversou com funcionários, e publicou a história.
Com um bom repórter apurando os fatos, não adiantaria ao general sequer combinar com os envolvidos, para que todos contassem a mesma história: há documentos demais, testemunhas demais. Que coisa feia, general!
Inculta e bela
E, já que estamos falando de viagens aéreas, uma placa no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, ordena: ‘Não viage nos degraus’. O pior é que o aeroporto em que esta placa está colocada ostenta o nome de Tom Jobim, compositor e poeta dos mais requintados. Tom não merece este tipo de homenagem.
Espaço restrito
Amplas reportagens informam os leitores de que as livrarias cobram das editoras para expor seus livros nos melhores espaços. Novidade? Não – e, considerando-se que há muitos livros novos para um espaço limitado, é preciso definir um critério para a exposição. O pagamento pode perfeitamente ser um critério, como o é nos supermercados, que vendem os melhores espaços nas gôndolas. Outros critérios existem, mas são complicados. O senador Eduardo Suplicy, por exemplo, escolheria livros sobre renda mínima. O candidato Geraldo Alckmin, por exemplo, deve adorar os livros de seu secretário Gabriel Chalita; já o prefeito José Serra prefere, com certeza, livros sobre Economia. E o presidente Lula prefere – bom, deixa pra lá.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados