Todo mundo, inclusive este colunista, ficou indignado com o fingimento de Suzane von Richthofen, que confessou ter ajudado a matar pai e mãe, orientada por seus advogados. Foi chocante – mas só até pensarmos um pouco no assunto.
Em primeiro lugar, a gravação das instruções dos advogados à jovem, se desmascarou a tática de simulação da defesa, também violou uma prerrogativa básica da democracia: o sigilo da comunicação entre o advogado e seu cliente. Nem a polícia, nem a Justiça podem invadir este sigilo; no entanto, ele foi violado por uma empresa privada e divulgado amplamente para todo o país (ver aqui artigo do advogado Paulo Sérgio Leite Fernandes para a revista eletrônica Consultor Jurídico). Em segundo lugar, simular é um direito da ré, e montar a simulação é um direito dos advogados de defesa. Pode até ficar feio, a opinião pública pode não gostar, mas é lícito.
Esta é uma parte da história. Outra é uma série de atitudes tomadas por Suzane: pedir cidadania alemã (o que não tem nenhuma importância real, mas nesta situação joga a opinião pública contra ela); pedir dinheiro da herança deixada pelos pais de cujo assassínio é acusada; pedir o afastamento de seu irmão da administração dos bens da família. Essa preocupação com dinheiro lança uma sombra ainda maior sobre ela: teria sido este um dos motivos que a levaram ao crime?
Resta uma reportagem que ainda não foi feita (e que Luís Nassif – ver aqui dois artigos do jornalista – vem reclamando): esta é Suzane von Richthofen ou uma personagem criada pelos advogados? Não caberia ao juiz examinar esses atos? Pois, se foram sugeridos por seus advogados criminais – do que este colunista duvida – pode-se até chegar à situação de declará-la indefesa e nomear novos patronos.
Sigilo bancário? Que sigilo?
Um excelente tema de debate é proposto pelo engenheiro Pedro Meinrath, fiel leitor desta coluna. Quando se discute a violação do sigilo bancário do caseiro Nildo, diz Meinrath, fala-se de algo que não existe mais. ‘Há muitos anos não se tem privacidade em contas bancárias no Brasil. Todo mês os bancos informam o movimento das contas de qualquer tamanho quando repassam às autoridades o montante do recolhimento do CPMF. Ou seja, cada cheque que você solta ou recebe é monitorado’, observa Meinhardt. Sigilo bancário? Que sigilo?
E não é só isso. Depósitos ou retiradas maiores são informados às autoridades, de acordo com a lei. Remessas internacionais acima de 3 mil dólares são examinadas. O movimento dos cartões de crédito é monitorado pela Receita Federal.
Este colunista não entende nada de cruzamento de dados, mas fica-lhe a incômoda sensação de que Pedro Meinrath está absolutamente certo: que o tal sigilo bancário não existe e já faz tempo. Pior: que mandar um subalterno levantar um extrato é pura perda de tempo. É como mandar um motoboy buscar do outro lado da cidade um texto que já está na tela do computador.
Um lado só
A ONG Transparência Brasil acaba de abrir um blog, Deu no Jornal, dedicado a notícias sobre corrupção. O blog se baseia exclusivamente no que foi publicado. Mas surge um problemão: e quando os jornais publicam notícias erradas?
Recentemente, a reportagem de um grande jornal não compareceu a um determinado julgamento, e escreveu (matéria assinada, ainda por cima!) com base exclusivamente nos dados deliberadamente distorcidos transmitidos pelo promotor – que, como acusador, é parte interessada. Ninguém mais foi ouvido. Houve erros sérios de informação, que exigiram longa carta de correção. Pois bem: como é que fica o blog quando acontecer algo desse tipo?
Pior: como o blog vai funcionar com base num banco de dados, com quem é que se conversa quando houver erros? E quando uma das partes for visivelmente prejudicada por uma reportagem unilateral?
É um tema que merece debate: como evitar que uma boa iniciativa se transforme num instrumento de ataque aos acusados.
Brilhos da imprensa
1.
De um grande portal, ligado a um jornal importante: ‘PMs acusam morto de ter atirado neles’.2.
De outro portal importante: ‘Jovens e minorias utilizam celular de forma diferente’. Este colunista já tinha ouvido falar de uma minoria que estaria utilizando o toque vibratório do celular de forma diferente, mas sempre imaginou que se tratasse de piada.3.
De todos os meios de comunicação, frase do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos: ‘Estou absolutamente confortável no ministério’. A expressão normal, em português, é ‘à vontade’. Mas a mania de imitar americano faz com que as pessoas ‘feel comfortable’, sintam-se confortáveis.Da série ‘E eu com isso?’
1.
De um portal grande: ‘Xuxa e Sasha ‘inauguram’ montanha-russa na Disney’. Mas não pára por aí: somos informados também de que Xuxa e Sasha se divertiram na Disney. E que a informação não foi levantada pelo próprio veículo – o que, convenhamos, é cada vez mais difícil: sua origem é a própria Xuxa.2.
De outro portal: ‘Os filhos de Madonna, Lourdes e Rocco, assistem aos shows particulares da popstar’. Aliás, os filhos de qualquer pessoa, pelo menos enquanto não têm condições de reagir, assistem aos shows particulares dos pais.3.
De um jornal importante: ‘Os apresentadores do Jornal Nacional passam o domingo com os filhos no cinema’.4.
De um portal (a internet é fantástica para dar esse tipo de notícia): ‘Gwen Stefani vai ter uma menina (…) O chá de bebê (…) teve decoração rosa, o que confirmou o sexo do bebê’.******
Jornalista, diretor da Brickmann&Associados