Cesare Battisti teve a sorte, ou o azar, de entrar no foco dos meios de comunicação. Azar, porque despertou seus adversários, que se opuseram tenazmente à negativa de extradição; mas, muito mais, sorte, porque a mobilização em seu favor evitou que acontecesse aquilo que é tão comum no Brasil, que fosse simplesmente esquecido na prisão enquanto o processo tramitasse, com a lentidão de praxe, em todos os escaninhos da burocracia brasileira.
E que é que acontece com quem não consegue uma posição sob os holofotes? Há um bom exemplo: Chong Jin Jeon, “Stoney”, cidadão coreano estabelecido no Brasil, casado com brasileira, com três filhas brasileiras, foi processado pelo maior conglomerado industrial da Coréia do Sul. Ficou um bom tempo na cadeia, no Brasil, aguardando decisão judicial sobre o pedido de extradição. Acabou sendo extraditado, com a condição, imposta pelo Supremo Tribunal Federal, de que sua pena englobaria o tempo já cumprido no Brasil. Besteira: tão logo chegou à Coréia, foi informado de que o Brasil ficava muito longe e que a pena cumprida aqui não seria descontada da prisão que cumpriria lá. Ponto. A imprensa brasileira tratou do caso com destaque mínimo, como se a separação de uma família não tivesse qualquer importância na ordem das coisas.
E daí? Daí que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a expulsão de estrangeiro que tenha filhos brasileiros é proibida. A única exigência é que haja relação de dependência econômica e vínculo socioafetivo entre o estrangeiro e a criança. Com base nessa decisão, uma moçambicana condenada por tráfico internacional de drogas não pôde ser expulsa do Brasil.
Uma pessoa condenada por tráfico internacional de drogas não pôde ser expulsa do país por ter um filho brasileiro. Já uma pessoa condenada por problemas que não envolvem tráfico, que tem três filhas brasileiras, cuja esposa é brasileira, foi extraditada – e nenhum veículo de comunicação sequer tocou no assunto. Tudo bem, entende-se a cautela: afinal de contas, a empresa com a qual Stoney duelou é uma das maiores anunciantes do Brasil. Mas anúncio não pode servir de álibi: se é para aceitar as imposições dos anunciantes, aonde vai parar a liberdade de expressão? Que, vamos repetir, não é um privilégio dos meios de comunicação, mas dos consumidores de informação, que no caso estão sendo privados de acompanhar o drama de uma família esmagada pelo poder econômico.
Rico, mas sem ostentar
Uma notável manifestação de oportunismo político passou meio batida pelos meios de comunicação. A notícia saiu, mas discreta, sem uma análise que mostre a incongruência dos argumentos de quem pretende subir na política aproveitando a descida do ex-ministro Antonio Palocci.
Quem assina o documento é um ex-prefeito de Guarulhos (SP), hoje secretário-geral do PT, Elói Pietá. Diz Pietá que o partido não defendeu Palocci porque seu enriquecimento impunha um “risco de distanciamento” da base social petista. “O que causou espanto e levou os petistas a não apoiarem sua permanência no governo foi a origem de seus ganhos privados (orientar os negócios de grandes empresas), a magnitude dos resultados (dezenas de milhões de reais), e o alto padrão de vida que ele se concedeu (representado pelo investimento em moradia fora de sua própria origem de classe média)”.
OK, OK. Só que os meios de comunicação não atentaram para alguns detalhes interessantes. Por exemplo, o ex-presidente Lula parece estar ganhando muito bem como palestrante, e suas palestras orientam negócios de grandes empresas. Esta última viagem do ex-presidente, por exemplo, envolveu palestras ao pessoal da Odebrecht e visitas a obras da empresa na América Latina; e culminou com uma passagem pela Venezuela em que o presidente Hugo Chávez, finalmente, com longo atraso, decidiu quitar antiga dívida com a empreiteira. Se Lula pode, por que não Palocci? E o advogado Márcio Thomaz Bastos, que foi ministro da Justiça de Lula, não terá como clientes exatamente pessoas de posses? Ganhar bem e cobrar caro não é crime. Competência é virtude, não vício.
Irregularidade, se houve alguma no caso Palocci, teria sido a inside information. Mas isso são apenas suspeitas, não há qualquer prova de que tenha efetivamente acontecido. Por que, então, a rejeição a Palocci e não a outros ícones do PT, ou do governo Lula, que estão bem de vida?
Traduzindo: Elói Pietá não quis dizer que a omissão do partido na defesa de Palocci foi um ato político, de setores partidários que o hostilizavam. E a imprensa deixou de cobrá-lo, pedindo-lhe informações complementares.
E no Olívio, nada?
O secretário-geral do PT talvez se interesse por esta notícia. Olívio Dutra, que foi prefeito de Porto Alegre e governador do Rio Grande do Sul, completa 70 anos, no dia 18, com um bom presente do povo gaúcho: sua nomeação para o Conselho de Administração do Banco do Estado do Rio Grande do Sul, Banrisul, onde aliás desenvolveu sua carreira de bancário, antes do tempo das vacas gordas. Espera-se que a presidente Dilma e o ex-presidente Lula estejam na festa.
Com a nomeação, Olívio vai inteirar algo como R$ 30 mil mensais, sendo R$ 18.640,05 de pensão de ex-governador, mais R$ 6.300,00 como conselheiro do Banrisul, mais estimados R$ 5 mil da aposentadoria no mesmo Banrisul.
Este colunista só encontrou a informação em um lugar: o blog do jornalista gaúcho Políbio Braga, sempre cheio de novidades. Cadê os outros meios de comunicação, que não comentam a entrega de um cargo que, presume-se, deva ser importante, como presente de aniversário?