Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O boato e o fato

O ex-presidente José Sarney confirmou que, ao ouvir boatos a respeito da estabilidade financeira do Banco Santos, retirou seu dinheiro de lá. O advogado do Banco Santos, Sérgio Bermudes, disse que, ao optar por uma fiscalização pouco discreta, o Banco Central alimentou boatos que contribuíram para a desestabilização de seu cliente.

Pelo jeito, muita gente já tinha ouvido falar dos problemas do Banco Santos. Destes, muitos eram jornalistas. E cabe a discussão ética: publicar rumores sobre bancos certamente contribuirá para destruí-los (o simples fato de haver boatos é suficiente para provocar uma corrida); mas será lícito comportar-se como se o público – que, no final de contas, é quem paga o salário dos jornalistas – não tivesse nada com isso?

Publicar os boatos, sem dúvida, é inaceitável. Mas ignorá-los também o é. Existe, acredita este colunista, um outro caminho – justo, seguro, de acordo com as tradições do bom jornalismo: investigá-los. Uma boa reportagem, com fatos, com análises, não pode ser confundida com divulgação de boatos nem com a desestabilização do mercado financeiro. Pode levar a uma intervenção, pode levar ao fechamento da instituição, mas terá cumprido o dever básico do jornalista, que é fazer jornalismo.

A propósito, a Folha de S. Paulo informou que o dono do Banco Santos costumava agradar jornalistas com gravuras raras. Quem as terá recebido?

Como é mesmo?

Ricardo Kotscho deixa o governo porque tinha combinado com Lula que só ficaria dois anos. A nota do Exército favorável aos métodos da ditadura não tem nada com sua saída, claro. Frei Beto deixa o governo porque tinha combinado com Lula que só ficaria dois anos. A gestão do Fome Zero, em que ele não consegue dar sequer um palpite, não tem nada com sua saída, claro. Oded Grajew, o primeiro empresário lulista, também está fora (parece que, a seu ver, pode ajudar melhor do lado de fora do balcão).

A imprensa registrou as saídas (há outras, também), notou as coincidências, mas está nos devendo a grande reportagem: afinal de contas, que é que está acontecendo com a Velha Guarda do PT e do lulismo?

Lá vem o seu China…

Que maravilha! A comitiva chinesa, tão exótica, tão bem vestida, tão cheia de dinheiro para investir! Nossos meios de comunicação ficaram nos paparicos, nos salamaleques, no registro da passagem da comitiva, e esqueceram alguns probleminhas. Primeiro, o problema comercial: de onde é que sai, mesmo, aquela gigantesca quantidade de produtos falsificados, de tênis a CDs? E aquela história da soja (que os chineses desistiram de comprar, quando já estava em seus portos, e por coincidência bem numa época em que os preços tinham subido), já foi esclarecida? Há as questões ético-comerciais, como o trabalho escravo e o trabalho infantil. E achar que a China é uma economia de mercado só pode ser piada.

…na ponta do pé

O encantamento com as grandes reservas cambiais da China e as promessas de investimento na infra-estrutura brasileira fez com que a gente se esquecesse de perguntar onde é que os chineses já investiram no Exterior. Ao que se saiba, a China é receptora de investimentos, e não investidora.

Lig-lig-lé

A China, como sabemos, é uma ditadura. Mas bloquear o acesso ao Cristo para que a comitiva chinesa pudesse vê-lo sem a incômoda proximidade de brasileiros não é o mesmo que transplantar sua ditadura para cá?

O outro lado

Aproveitando a onda de biografias de Roberto Marinho, o deputado estadual (PFL-SP) e jornalista Afanásio Jazadji também está escrevendo uma. Só que do outro lado do balcão. Afanásio, que moveu uma ação trabalhista milionária contra a Globo (e ganhou), centra seu livro na compra pelo empresário da TV Paulista, que considera fraudulenta. A TV Paulista, canal 5, é hoje a TV Globo de São Paulo.



Palavras, palavras

Atenção, companheiros: ‘coalização’ não existe. O que existe é ‘coalizão’. Aliás, ‘inicialização’ é a forma complicada (e errada) que os técnicos em computação criaram para substituir a tradicional, e correta, ‘iniciação’.

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados Comunicação; endereço eletrônico (carlos@brickmann.com.br)