Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O buraco negro da notícia

O governo de São Paulo sabia que rebeliões sob o comando do PCC estavam para acontecer no fim de semana, afirmou o Fantástico. Sabia como? Recebeu a notícia por fax? E-mail? Foi escuta telefônica? Algum Pereira de recados? O cidadão paulista não foi informado, os do resto do Brasil muito menos.

O crime organizado, uma espécie de governo paralelo, que só chegou aonde está porque tem laços fortes com instituições públicas e privadas numa longa história nacional, anda descontente com perdas de poder nos últimos quatro anos. As perdas naturalmente se devem à atuação da banda dos bons moços, que teima em agir. A banda podre da polícia brasileira tem sido punida, assim como a de outras instituições públicas e privadas.

Os laços continuam fortes, tanto que a mídia não ousa entrevistar o Marcola, um dos chefes do PCC, ou ao menos saber como o governador de São Paulo foi informado sobre o que estava para acontecer e que acabou ocorrendo, mesmo depois da medida preventiva de transferir 700 presos ligados ao PCC da capital para o interior. Todo cidadão brasileiro quer saber como trabalha o Marcola, quem são os amigos do Fernandinho Beira-Mar. Decerto que é uma história muito mais consistente do que a triste novelinha entre os abobados, os honestos e os que usaram luvinhas de pelica no Partido dos Trabalhadores quando chegaram ao poder.

Anestesia geral

O buraco negro da notícia é um pedaço do filme que não nos cabe assistir, mas tem a ver com tráficos nacionais e internacionais de todo tipo, a começar com o de influências, passando pelo de órgãos humanos, crianças e, óbvio, o de dinheiro, ouro, pedras preciosas e outras riquezas. A notícia é refém. Não podemos contar com ela, apenas nos parece absolutamente cinema nonsense o clamor dos presidiários por paz, justiça e liberdade. Eles esqueceram de pedir saúde e educação, mas era de esperar que não lembrassem, a maioria nem sabe o que é isso, já nasceu no limbo, são párias.

A economia vai bem, os lucros continuam em alta, a indústria bélica está em ótima fase e os grandes líderes mundiais fazem o que podem em reuniões semestrais para melhorar o planeta, desde que o mercado não saia prejudicado e que os países pobres, os que foram saqueados anteriormente, saldem suas dívidas contraídas para pagar o estrago dos saqueadores nos últimos séculos. Isso é realmente nonsense. A mídia nacional, entretanto, trata como coisa absolutamente séria e justa.

Terroristas, estudantes, presidiários, sem-terra, sem-teto… O que querem afinal esses revoltados? Voar em helicópteros, de avião, degustar caviar com pó de ouro, passear de barco? Por que essa gente toda não se acalma e espera o bolo aumentar o bastante para ser distribuído? Não tem pão, ora, comam brioches. Não há brioches para todos? Então assistam à novela das oito ou leiam os cadernos de fim de semana dos jornais. O efeito é o mesmo: anestesia geral.

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Jornalista