Sunday, 17 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

O novo presidente da Radiobrás

O jornalista José Roberto Garcez, novo presidente da Radiobrás, acredita que, passados quase 20 anos da luta por uma Constituição democrática, o país possui ‘maturidade’ para, através da sociedade apropriar-se de um sistema de comunicação público fazê-lo o seu porta-voz. Em tempo de transição dos sistemas para a tecnologia digital, o dirigente assume a empresa respaldado por um período de preparação estrutural, quando a Radiobrás se atualizou tanto em máquinas quanto em capital humano. Garcez foi entrevistado pelo e-Fórum.

José Roberto Garcez assumiu em 20/4 a presidência da Radiobrás, da qual era diretor de Jornalismo. Gaúcho, 54 anos, iniciou sua carreira em 1974, quando entrou no curso de Jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e logo começou a trabalhar em um jornal da região metropolitana de Porto Alegre. No final do primeiro semestre de faculdade, Garcez já atuava num dos principais grupos de comunicação do RS. Atuou em jornal, rádio e TV. Foi dirigente do sindicato dos jornalistas gaúchos.

Na prefeitura de Porto Alegre, na primeira gestão de Tarso Genro como prefeito (entre 1993 e 1996), Garcez teve a primeira experiência com a comunicação para o fortalecimento de um projeto político. Em seguida foi secretário de Comunicação no governo Raul Pont, na capital gaúcha, e em 1998 se tornou diretor da Fundação Piratini (TVE RS).

Na cargo atual, Garcez tem o desafio de chefiar todo o sistema Radiobrás — que compreende uma agência de notícias, uma rádio-agência, duas emissoras de televisão e cinco emissoras de rádio — fazendo com que esta empresa pública de comunicação cumpra sua missão de ‘universalizar o acesso à informação’.

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O que mudou na Radiobrás, na última gestão, como o senhor a recebe?

José Roberto Garcez – Acho que a principal mudança nos quatro anos da gestão em que o Eugênio Bucci foi presidente e eu fui diretor de jornalismo é o aprofundamento do caráter público da Radiobrás. Nesse período, nós aprofundamos o serviço que a Radiobrás oferece à população brasileira como um serviço que atende um direito do cidadão e não a uma necessidade do governo de expressar a sua versão dos fatos.

A Radiobrás passou a ser muito mais uma empresa voltada para atender o direito do cidadão de ter uma informação sobre o governo, sobre o Estado, sobre as políticas públicas que são aplicadas pelo governo. O nosso foco passou a ser o cidadão e não o governante. Se tivesse que escolher uma mudança fundamental, seria essa.

Nós, hoje, produzimos muito mais do que produzíamos há quatro anos, temos mais veículos, nos atualizamos nas questões tecnológicas, profissionalizamos cada vez mais o corpo de funcionários. Hoje temos mais funcionários concursados e menos funcionários contratados por regime de confiança. Todas as mudanças sempre buscaram que a Radiobrás seja, cada vez mais, uma prestadora de serviço público.

Quais as virtudes e limitações na estrutura da Radiobrás hoje?

J.R.G. Eu acho que a grande virtude da Radiobrás hoje é que seu corpo funcional está consciente da importância do nosso trabalho. Nosso trabalho não é apenas veicular notícias de interesse do governo, e sim prestar um serviço. Essa eu acho que á a grande virtude; é uma empresa madura na sua relação com a sociedade.

As limitações são de ordem mais material. É um momento em que vivemos uma fase de transição para a tecnologia digital, é preciso ter recursos adequados para fazer a migração. Temos processos internos que ainda não estão suficientemente abertos à sociedade, e nós entendemos que a sociedade deve ter uma participação mais intensa no dia-a-dia da empresa. Eu diria que hoje a Radiobrás está preparada para a evolução que teremos a seguir na área da comunicação pública do Brasil.

Qual sua compreensão sobre comunicação estatal e pública?

J.R.G. Se tivesse que escolher uma diferença entre comunicação pública e comunicação estatal, seria onde está o controle. Esse é um objetivo a atingir ainda. ‘Onde está o controle’ significa se o controle é da sociedade ou do estado; na comunicação estatal, o controle é do estado e na comunicação pública, o controle é da sociedade. Nós ainda temos que percorrer um caminho para que a gente consiga ter efetivamente veículos públicos sob o controle da sociedade.

O que temos hoje, não apenas no governo federal, mas também em muitos estados, é a consciência de que o Estado existe para atender ao público e, portanto, os veículos que ele opera devem estar voltados para esse interesse, para o interesse público e não para o interesse do governante. Eu acho que nós estamos percorrendo este caminho.

Pela primeira vez, passados quase 20 anos da construção da Constituição, estamos atingindo alguma maturidade para que a sociedade realmente se aproprie de um sistema de comunicação, que deve ser na verdade seu porta-voz. Mas os veículos de comunicação estatal, na minha opinião, são fundamentais dentro de um sistema de equilíbrio entre a iniciativa privada, a sociedade e os governos.

Como a Radiobrás vem se preparando para a digitalização?

J.R.G. Esse é o desafio do momento, junto com esse processo de definição do que seria a comunicação pública no Brasil, uma oportunidade para que ela realize plenamente a sua vocação. A revolução tecnológica que estamos vivendo cria oportunidades para que nossos veículos ofereçam possibilidades de acesso da população à produção, a mais fontes de informação. Portanto, o caráter que a comunicação deve ter de pluralidade e de expressão da diversidade, vai se concretizar. É nessa perspectiva que a Radiobrás se coloca, de ser o agente que dará maiores condições ao cidadão de se expressar, de ter veículos e canais onde ele possa viver a sua realidade cotidiana.

Militantes ligados à radiodifusão comunitária consideram que a Radiobrás, no governo Lula, não abriu espaço para as radicom. Qual o relacionamento cabível com as comunitárias, na estrutura legal e administrativa da empresa, e qual o relacionamento ideal?

J.R.G. Acho que aí tem uma pequena imprecisão. A Radiobrás não existe para definir uma política pública para a radiodifusão comunitária. Não é nosso papel, mas de outras estruturas do governo.

Dentro do que nos cabe, de ter um relacionamento efetivo com os canais comunitários, por exemplo, temos convênios com a Abccom (Associação Brasileira de Canais Comunitários) para troca de programação, temos também muito intercâmbio com rádios comunitárias, desde troca de conteúdo até formação e capacitação de pessoal.

A Radiobrás tem um grande interesse e uma necessidade profunda, inclusive, de ter uma relação com a radiodifusão comunitária, mas entendemos que nós, de maneira alguma, devemos avançar sobre a autonomia que a radiodifusão comunitária deve ter. A Radcom no Brasil é um dos exemplos mais acabados do que deve ser uma comunicação pública. O que a Radiobrás tem que fazer é estabelecer laços para a troca de conteúdo, de experiências, mas jamais absorver a radiodifusão comunitária. A Racom deve continuar absolutamente autônoma em relação às estruturas de governo.

Qual sua expectativa sobre o I Fórum de TVs Públicas?

J.R.G. Em primeiro lugar o Fórum já é um grande sucesso só pelo fato de nós termos hoje uma plataforma comum das entidades ligadas ao assunto. Todas elas discutindo e apresentando ao governo suas propostas já é um grande avanço, pois nós não tínhamos um ambiente único para discutir qual é o futuro da TV Pública no Brasil.

Na próxima semana, eu acho que nós conseguiremos atingir um nível bastante profundo de consenso entre as várias áreas do público, onde deveremos esquecer pequenas divergências e buscar as grandes convergências.

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Da Redação FNDC