O título condena: ‘Walfrido agrega a seus bens R$ 23,5 mi nos últimos 2 meses’. Walfrido é o ministro da Coordenação Política, Walfrido dos Mares Guia, do PTB mineiro, e neste momento está sendo acusado de participação no mensalão tucano, o dinheiro de Marcos Valério que irrigou a campanha de Eduardo Azeredo, do PSDB, ao governo de Minas (com o petebista Walfrido na vice).
A leitura óbvia do título é que o ministro andou pegando algum, à sorrelfa, e há pouco tempo. Leia-se o texto, e é diferente: o ministro vendeu ações de uma de suas empresas no valor de 23,5 milhões de reais. Uma operação legal, registrada, com preços de mercado, nada de suspeitas, tudo direitinho.
Mas, como todos sabemos, o título tem mais leitura do que o texto.
Espantoso: ganha para trabalhar!
O técnico do Corinthians, Nelsinho Baptista, atendeu ao celular mas continuou falando no outro telefone. O que ele disse foi captado e deu ampla matéria, onde ele foi execrado. No dia seguinte, os repórteres foram fazer a repercussão, ouvindo diretores do clube sobre aquilo que o técnico tinha dito. Quais foram as horríveis confissões de Nelsinho?
Ele, que assumiu o comando técnico do Corinthians numa fase terrível do time e do clube, disse que com isso ganharia uma grana e faria sua publicidade.
Pergunta-se: e por que as demais pessoas do mundo trabalham, senão para ganhar seu dinheiro (e eventualmente fazer sua publicidade)? Na Bíblia, escrita há alguns milhares de anos, não está dito que o suor do rosto serve para ganhar o pão? Ou talvez preferissem que Nelsinho desse aquelas declarações do tipo ‘eu sempre sonhei com a oportunidade de dirigir esse time e até o faria de graça, mas sou obrigado a cobrar alguma coisa porque o padeiro tem de receber’? Não, não dá.
Bobo! Feio! Careca!
O título, sempre o título! Na reportagem sobre o encontro de Cristina Kirchner, candidata à presidência da Argentina, com o presidente Lula, o título é ‘Candidata e Lula criticaram a imprensa’.
E qual foi a pesada crítica à imprensa, ou à liberdade de imprensa, ou à honra dos jornalistas, ou talvez à honra da família dos jornalistas, desferida pelas arrogantes autoridades que acham que podem falar o que querem?
Foi o seguinte: Cristina Kirschner deixou cair um lenço e se abaixou para pegá-lo. E comentou: ‘Amanhã já vão dizer que estou me abaixando diante do Brasil’.
Pois é. Essa crítica à imprensa não foi mesmo terrível?
Assim é se lhe parece
Ah, saudades! No Rio, a Luta Democrática, em São Paulo a Notícias Populares. Os títulos nada tinham a ver com as matérias, mas pelo menos eram engraçados. No mínimo, ganhavam longe no quesito bom humor.
Luta à vista
A sentença é do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, mas deve preocupar os jornalistas de todo o país: a tese que sustenta destrói os alicerces do jornalismo. De acordo com a sentença, a imprensa não é obrigada a investigar profundamente uma notícia antes de publicá-la, de maneira a garantir sua veracidade; nem é obrigada a ouvir os outros lados envolvidos no caso. Em resumo, a tese abre caminho para o jornalismo de agressão, em que um dos lados (de preferência o que tenha maior poder político ou econômico) fale sozinho, sem que os adversários tenham meios de protestar. E, se quiserem mesmo reclamar, que comprem seu próprio jornal.
A sentença pode ser encontrada no site Consultor Jurídico, de 27 de setembro. É perigosíssima: é melhor que os jornalistas discutam o assunto desde já.
A culpa…
O apresentador Luciano Huck publicou artigo na Folha de S.Paulo contando que foi assaltado a mão armada e que, como qualquer pessoa, não gostou. A surpresa veio com a avalanche de cartas de solidariedade ao assaltante. Muita gente acha que Huck, por ser famoso, por ter ganho dinheiro, tem mais mesmo é de ser assaltado. E que história é essa de andar de Rolex, presente de aniversário? Ele que esconda o Rolex e ande com relógio de camelô, daqueles bem vagabundos!
Luciano Huck abriu um bar, deu certo. Abriu um restaurante, deu certo. Escreveu uma coluna no Jornal da Tarde, deu certo. Foi para a Globo, deu muito certo. Como dizia Tom Jobim, sempre preciso, sucesso no Brasil é ofensa pessoal.
É claro que esse pessoal que fala em problemas sociais para defender os bandidos e baba ódio contra suas vítimas vai pensar diferente se for assaltado. Como já diziam os políticos do Brasil, no tempo do Império, nada mais conservador do que um liberal que chega ao poder. E ninguém tem mais rancor contra os bandidos do que o social-permissivo que é assaltado.
…é da vítima
O caso Huck lembra muito aqueles comentários imbecis que se ouvem quando uma moça é estuprada. ‘Também, com aquelas roupas…’, ‘Vive com decotes enormes, faz questão de mostrar os peitos’, ‘Andando com essas saias curtas, queria o quê?’
Queria poder andar como quisesse, sem ser molestada. A culpa, como parecem não perceber os leitores raivosos, não é da vítima: é do criminoso.
A conta não bate
De acordo com a notícia, a presidência da República vai comprar equipamento médico: 50 abaixadores de língua, 26 capotes cirúrgicos (que custarão, cada um, entre 480 reais e 530 reais), 36 fronhas descartáveis (128 reais cada), 30 lençóis hospitalares (310 reais a unidade). Tirando os abaixadores de língua, aqueles que parecem palitos de sorvete e cujo preço unitário não consta da notícia, os gastos somam 15.386 reais (calculando-se os capotes cirúrgicos pelo preço mais alto, 530 reais). Mas anuncia-se que a presidência vai gastar 106,2 mil reais. Será que o palitinho de madeira custa tão caro? Ou os números simplesmente estão errados?
E eu com isso?
Foi uma semana tensa, aguardando decisões do Supremo, ouvindo ameaças do presidente iraniano Mohammed Ahmadinejad, assistindo a brigas mortais dentro do PMDB. Ainda bem que sempre sobra algum tempo para que a gente fique sabendo as novidades que realmente interessam. Por exemplo, que Joana Balaguer, ‘que teria tido um affair com o ex-BBB 7 Diego Alemão’, foi a uma festa de máscaras. E o affair, houve ou não houve? Chegaram ou não às vias de fato? Faltou informação!
Deu para saber também que Marina Mantega, cujo talento principal parece ser o pai-ministro, fez ensaio e diz ter assinado contrato de trabalho. E que o príncipe William foi fotografado com a namorada em boate. Ainda bem: tempos houve, na Pérfida Albion – apelido que o simpático Reino Unido carrega há séculos – em que a nobreza preferiu maciçamente outro tipo de prazeres. Não, não seja malicioso: gostavam de caçar raposas e exibir o rabo.
Gracyanne Barbosa, com todos os ypsilons e enes, esteve de biquíni na praia. Ela e uma boa parte da população feminina do Rio, claro. A notícia esclarece que ela curtiu muito.
E, finalmente, na série ‘faltou informação’, dizem que Angelina Jolie ‘teria tido’ um colapso ao abusar de álcool. Teve ou não teve? E desde quando, a propósito, jornalista publica notícia sem conseguir confirmá-la?
O grande título
Nesta semana, só um, magnífico: referia-se ao ‘músico Jobim Trio’. Como a velha marmelada Peixe, como os também já velhos aparelhos de som, ou como certas moças que ganharam ultimamente muita projeção em Brasília, ‘o músico Jobim Trio’ deve ser o famoso Três em Um. E certamente é ótimo.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados