Em pleno Caderno de Cultura do Correio Braziliense de domingo (12/2), uma aberração: uma ‘reportagem’ recheada de superlativos ao Governo do Distrito Federal, intitulada ‘Rumo ao futuro’. O incrível é que não se via em nenhum lugar escrito ‘material publicitário’. Ou seja, o próprio Correio assinou essa aberração do jornalismo. Aliás, não, isso não pode ser chamado de jornalismo, se fosse escrito pela assessoria de imprensa do governador seria menos elogioso a ele.
Pelo texto fraco, sem nenhuma visão política ou pública, tenho quase certeza de que foi da colunista social. Só para se ter uma idéia do tamanho da coisa, aí vão alguns exemplos do texto:
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O dia 4 de fevereiro ficará marcado indelevelmente no calendário de Brasília. Naquela data, o governador Joaquim Domingos Roriz concretizou uma de suas metas de governo: a inauguração da Usina Hidrelétrica de Corumbá IV.**
Foi tudo no superlativo, não só em números técnicos e físicos, como quantitativamente. As 10 mil pessoas que foram assistir e participar da festa, entre moradores da região e do Plano Piloto, viveram um dia alegre, tranqüilo e inesquecível. Nem mesmo a noite insone abateu o governador Roriz e a família, que circularam entre os convidados, transmitindo a cada um que se aproximava toda a euforia pela realização de mais um dos planos de governo, concretizados dentro do prazo preestabelecido.**
Uma estrada perfeita, toda sinalizada e pronta, deu acesso aos convidados a tendas montadas no sopé da represa, que, como Roriz gosta, estava toda gramada, exibindo um verde de ponta a ponta. Um sem-número de ônibus e vans que partiu da CEB, na 905 Sul, transportou as pessoas entre o Plano Piloto e o local da festa, e entre a casa de força e as tendas, onde 20 leitões à pururuca, sete bois assados e seis toneladas de churrasco, que incluía cubos de frango nos espetinhos. Tudo preparado pelo especialista Carlos Campagnolo, que veio especialmente de Toledo, no Paraná.**
Renata La Porta se encarregou do bufê, que tinha arroz, vinagrete, mandioca e farofa, servidos por um verdadeiro batalhão de 360 garçons, que serviu também, incrivelmente gelado o tempo todo, 15 mil litros de chope, 5 mil litros de água e 6 mil litros de refrigerantes, até ao fim da festa, animada por shows de Chico Rey e Paraná, Chitãozinho & Xororó e a banda Ricardo Chaves. Outros se encarregavam de recolher os copos descartáveis e pratos, o que deixou o espaço decentemente limpo.**
Os 500 funcionários, encarregados da organização e uniformizados de forma impecável, atendiam a todos os presentes com solicitude e cortesia, chefiados pela responsável por tudo, a promoter Márcia Lima, que decorou as centenas de mesas com toalhas adamascadas em branco e marinho, realçadas com arranjos florais no centro de cada uma. O posto médico, com ambulâncias da Secretaria de Saúde e do Corpo de Bombeiros do DF, cuidou do bem-estar da multidão, que aproveitou bastante a festa, que se prolongou até as primeiras horas da noite.**
O governador de Goiás, Marconi Perillo, presente à festa, citou Fernando Pessoa para expressar o que é realizar aquilo que se projeta: ‘Deus quer, o homem sonha, a obra nasce’, ao que o governador Roriz acrescentou: ‘Há justamente 50 anos, tomou posse um brasileiro que acreditava ser permitido sonhar e virou este país para o interior, de forma destemida. Hoje, vemos o que vemos: uma Brasília consolidada e desenvolvida’. O sonho de JK continua a se tornar realidade.Incrível, não? E o pior de tudo: meus impostos servem para pagar esses leitões à pururuca e a impecável decoração… Que papelão, Correio Braziliense!
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Jornalista, Brasília