A notícia do Jornal do Brasil (terça-feira, 15/5), que confundiu um grupo de atores em filmagem com autênticos bandidos do Comando Vermelho, grupo integrante do crime organizado no Rio, foi a mais comentada da semana. Mas passou batido um ângulo interessante: a publicação da foto, que aponta como criminosa gente que nada tem a ver com o crime, é exatamente o mesmo que ocorre quando os meios de comunicação apontam como bandidos pessoas que são apenas suspeitas.
Outro dia, na TV, alguém disse que as grandes operações da Polícia Federal podiam não dar em nada, mas pelo menos desmoralizavam os bandidos. Tudo perfeito – mas quem garante que os cavalheiros e senhoras em questão são bandidos? É correto condená-los antes de qualquer julgamento? Não é preciso lembrar a Escola Base, o Bar Bodega, tantos casos em que pessoas inocentes foram apontadas pelas autoridades como criminosas e os meios de comunicação referendaram o erro. Há centenas de casos em que as autoridades erraram.
Voltemos alguns anos, para a época da ditadura: o prisioneiro era torturado e morto, alguma autoridade policial informava que ele tinha fugido, dias depois vinha a notícia, dada por outra autoridade, de que tinha sido morto ‘em troca de tiros com as forças da lei’. Nunca faltaram autoridades para distribuir e autenticar esse tipo de informação falsa – nem jornais e emissoras de rádio e TV para divulgá-lo. Agora, basta alguém ser preso e algemado, de preferência pela Polícia Federal, para ser imediatamente condenado. E ai do juiz que ousar dar-lhe um hábeas corpus, que há mil anos é a base do direito de defesa: é posto na hora no rol dos suspeitos. Na hora aparece a frase fatal, ‘a Polícia prende mas a Justiça solta’.
Imagine se os atores confundidos com bandidos forem assim rotulados! E, no entanto, é a mesma coisa. Nós, jornalistas, temos a responsabilidade de dar à defesa tanto crédito quanto à acusação. E de ter tanto respeito à Justiça quanto temos por policiais mascarados.
Silêncio mineiro
O primeiro caso que se conhece da ação político-financeira de Marcos Valério foi o de Eduardo Azeredo, que foi governador de Minas, senador e presidente nacional do PSDB. Pouco se falou de Azeredo no caso do mensalão – e isso embora os petistas tenham protestado duramente contra a discrição da imprensa com relação ao tucano mineiro.
Outro caso, bem mais recente, vem sendo tratado com a mesma discrição. O bicheiro Antônio Petrus Khalil, o Turcão, preso pela Polícia Federal, tinha cinco cheques, no valor somado de R$ 100 mil, em nome de Milton Reis, assessor político do governador tucano Aécio Neves. A explicação: Reis disse que pegou o dinheiro emprestado há cinco anos, pagou tudo direitinho, mas ficou com vergonha de pedir os cheques de volta. Se o caro colega não viu a notícia, não fique chateado: do jeito que foi divulgada, não era para ver, mesmo.
Já era
Quando passou ao mundo empresarial, o hoje ministro Miguel Jorge era um infatigável divulgador das virtudes da desvalorização do câmbio, defendida pelo presidente de sua empresa, Wolfgang Sauer. A defesa era tão insistente que Delfim Netto, sempre irônico, cunhou a Lei de Sauer: ‘Seja qual for o câmbio, a defasagem é de 30%’.
Tudo bem que Miguel Jorge tenha mudado de idéia, agora que é ministro, e defenda o fechamento das empresas que não conseguirem conviver com o real forte. Mas a imprensa bem que poderia chamar a atenção para o fato.
Também já era
O governo federal está anunciando o retorno do programa nuclear. Seria jornalisticamente interessante verificar qual a posição do presidente e de seus ministros a respeito do programa nuclear, quando o governo Geisel iniciava a construção das usinas de Angra dos Reis.
Três manchetes
O presidente Lula garantiu, na inauguração de novas instalações da Siemens, em Jundiaí (SP), que o Brasil não terá problemas de energia nos próximos anos. Três manchetes a respeito dessa afirmação:
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‘Lula garante que país não vai racionar energia até 2011’**
‘Lula garante que até 2012 não faltará energia’**
‘Lula diz que o país não terá falta de energia até 2015’Observando
O presidente Lula optou por não beijar a mão do papa Bento 16. Atitude correta: comportou-se como chefe de Estado diante de um chefe de Estado. Poderia (e isso seria uma opção sua, também correta) comportar-se como um católico diante de seu líder espiritual e, sem qualquer problema, beijar-lhe a mão.
Só que, como observou o premiadíssimo publicitário Neil Ferreira (e o fato não foi notado pelos nossos meios de comunicação), Lula não beijou a mão do papa, mas beijou a mão do deputado Jader Barbalho.
E eu com isso?
Este colunista, em sua avançada idade, às vezes imagina como é que sobreviveu aos tempos em que não havia fax, só telex; e as fotos eram enviadas de avião, nas mãos de algum passageiro de boa vontade. Em que, para fazer uma pesquisa simples, era necessário pedir dezenas de pastas empoeiradas ao arquivo. E em que não tínhamos acesso imediato a notícias como essas:
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‘Americanos estão fartos de Britney Spears e Paris Hilton, diz site’**
‘Gianecchini chega com morena a festa de Otaviano Costa’**
‘Cantora Sheryl Crow anuncia gravidez em website’Esta informação, aliás, é interessantíssima: a notícia que se segue ao título diz que Sheryl Crow anunciou em seu website que adotou uma criança recém-nascida.
Os grandes títulos
Há semanas em que não dá para disputar. O título que se segue é ótimo:
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‘Equipe de luta olímpica embarca para Pan da catego’Mas havia um exemplar imbatível:
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‘Congresso aprova aumento de recurços do governo’Porque, como sabemos, sem recurços nada funsiona.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados