A música popular está na CPI: foi ao buscar um CD de Lupicínio Rodrigues no armário que Roberto Jefferson machucou o olho – Lupicínio, convenhamos, pega forte. E a investigação se desenvolve ao som de outro antigo sucesso: ‘Se meu passado foi lama/ hoje quem me difama/ viveu na lama também’.
A imprensa mostra bem como a coisa funciona: se vocês investigarem uma acusação atual, dizem os governistas, vamos investigar acusações antigas, dos tempos em que a atual oposição era governo. Mas a imprensa não tem mostrado outra faceta das investigações: que os próprios jornalistas têm ignorado normas para mostrar as violações dos políticos envolvidos no atual escândalo.
Cabe à imprensa buscar os fatos e proteger as fontes: não há dúvida. Mas cabe-lhe também andar com cuidado ao tomar iniciativas como violar o sigilo bancário de pessoas ou empresas e divulgá-lo; ou ao revelar segredos comerciais de empresas de cujo envolvimento na corrupção se suspeita. São manobras duvidosas para um fim que, sem dúvida, é nobre: varrer ladrões de nossa vida política. Mas é preciso tomar cuidado extremo ao agir como se os fins justificassem os meios. Afinal de contas, muitos dos corruptos repassaram dinheiro (público, supõe-se) a políticos diversos para atingir um fim que consideram nobre, assegurar que um governo popular tenha condições de impor sua orientação.
Qual o limite jornalístico? Trata-se de um fio de navalha: cada um, a sós com sua consciência, deve verificar se não está errando para expor quem está errado.
Dúvida
Está misteriosamente ausente do noticiário sobre os Correios exatamente aquele que é o verdadeiro responsável pela empresa: o ministro das Comunicações, Eunício Oliveira. Seu nome não aparece em lugar nenhum. Alternativas:
1.
A imprensa reconhece que ele não manda mesmo e nem se dá ao trabalho de tentar ouvi-lo, porque sabe que daquele mato não sai coelho. Mas, mesmo admitindo-se que o ministro não mandava nada e não sabia de nada, não era sua a responsabilidade de cuidar da casa? Como dizem os advogados, não terá havido uma falha in vigilando?2.
A imprensa se esqueceu dele.A terceira alternativa seria a conspiratória: o ministro estaria livre de contestação por ser poderoso demais. Mas, além de ofensiva à imprensa, esta hipotética terceira alternativa não faz sentido: nesta crise, ninguém é poderoso demais.
Reagindo às invasões
Deve ser culpa do colunista: no meio desse noticiário todo, há informações que escapam. Mas é claro que a imprensa deve ter noticiado: o prestígio que o advogado Márcio Thomaz Bastos acumulou durante anos de bom trabalho não lhe daria imunidade a más notícias, não é mesmo? Mas o fato, que este colunista não leu, não ouviu, não viu nem pescou na internet, é que o advogado Ubirajara Berna de Chiara, presidente da 34ª subseção da Ordem dos Advogados do Brasil, em São José dos Campos, pediu que o ministro da Justiça tenha cassada sua carteira da OAB, de maneira a que não volte a advogar. Motivo: as seguidas invasões de escritórios de advocacia pela Polícia Federal, formalmente subordinada ao Ministério da Justiça.
As invasões não são acompanhadas por representantes da OAB, conforme determina a lei, mas não há emissora de TV que deixe de acompanhá-las. De acordo com de Chiara, esses atos, cometidos por uma corporação subordinada ao Ministério da Justiça, denigrem a categoria dos advogados.
Os clientes
Quando a Polícia Federal invade um escritório de advocacia e apreende documentos e computadores, que acontece com os clientes? Imaginemos uma pessoa que esteja se divorciando: com a apreensão, morre o obrigatório segredo de Justiça? Imaginemos uma empresa que esteja planejando novos investimentos e tenha encarregado o escritório de cuidar da parte legal: seus segredos comerciais deixarão de ser segredos? E os prazos de recurso dos clientes que não têm nada a ver com o motivo das invasões, serão perdidos?
Este colunista não sabe as respostas, e adoraria vê-las em algum meio de comunicação. É mais informativo do que ser ‘informado’ de que Éden é o nome do Paraíso, ‘em inglês!’ Alguém sabia que Adão e Eva falavam inglês?
Tá faltando um
No noticiário sobre a libertação de Suzane von Richthofen, ré confessa do assassínio do pai e da mãe, todos os lados foram contemplados: da indignação e revolta que o fato provocou ao reconhecimento de que, de fato, não era possível mantê-la presa, sem julgamento, quase três anos após o crime. Mas houve uma omissão no noticiário: lembrar que um colega nosso, o jornalista Antônio Marcos Pimenta Neves, também réu confesso de homicídio (matou a tiros a ex-namorada, a também jornalista Sandra Maria Gomide), até hoje, cinco anos depois, aguarda julgamento. Em liberdade.
Os adivinhos
Este colunista viu, nos meios de comunicação nacionais e internacionais, que a eleição no Irã seria decidida entre um ex-presidente e um representante da ala moderada de políticos islâmicos. Deu errado: o segundo turno ficou entre o ex-presidente e o representante da linha-dura. Depois, todos noticiaram que, no segundo turno, o ex-presidente lavaria a égua. Deu errado: quem lavou a égua foi o linha-dura.
Nenhum veículo nacional vai cobrar as agências noticiosas internacionais, que os induziram a erro? Pior: nenhum veículo nacional vai chegar à conclusão de que o Irã, um país muito rico, militarmente poderoso e com liderança sobre xiitas de todos os países, merece no mínimo um enviado especial?
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados