Todo domingo ele faz tudo sempre igual: conversa com as companheiras de trabalho, passa horas no auditório, faz piada, brinca com os convidados. Todo ano ele faz tudo sempre igual: em fins de dezembro, vai para Celebration, na Florida, e passa o réveillon por lá. Quando está fora do Brasil, todo dia ele faz tudo sempre igual: anda pelas ruas sem ser cercado por fãs, come frutas de ambulantes, varre a entrada da casa, se aparece um repórter ele inventa alguma notícia só para causar confusão (da última vez, disse que só tinha seis meses de vida). Quando apresenta seu programa aos domingos, há uns 50 anos, as músicas e as vinhetas todas as semanas são iguais.
E este homem metódico, que costuma fazer tudo sempre igual, um dia despenca no Palácio do Planalto, inesperadamente, bem no horário em que o presidente Lula daria audiência ao presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Sílvio só tinha estado no Palácio no começo dos anos 1990, quando Itamar Franco era o presidente. Segundo disse à imprensa, tinha ido pedir a Lula uma doação para o Teleton, o programa de 26 horas contínuas que apresenta desde 1998 em benefício da AACD, Associação de Assistência à Criança Deficiente. O Teleton existe há 12 anos. Sílvio jamais pediu uma doação a Fernando Henrique Cardoso, jamais pediu uma doação a Lula. Não se deu ao trabalho de pedir audiência. Simplesmente, imagina-se, acordou com a idéia de pedir que o presidente ajudasse a AACD fazendo uma doação ao Teleton. E a imprensa a-cre-di-tou!
Tudo bem, a imprensa costuma imaginar que o consumidor de informações acredita quando diz que recebeu informações colocadas num envelope debaixo de um viaduto. Mas não se imaginava que ela própria acreditasse no que diz. Pois acredita – além do mais, é confortável acreditar. Daria para desconfiar que um empresário com a mania de ser metódico, tradicionalmente afastado do convívio palaciano, que raramente viaja pelo país (passou uns 30 anos, por exemplo, sem ir ao Rio, sua terra natal) só mudaria de hábitos por algum motivo importante. Mas investigar dá trabalho e trabalho cansa.
Falha de marcação
É claro que nem Lula nem Silvio Santos falariam sobre o real motivo do encontro (e, se alguém tentasse Henrique Meirelles, o presidente do Banco Central, cujo tempo de audiência foi utilizado na reunião, seria ainda pior: Meirelles ou não responderia ou responderia naquela linguagem de ata de reunião do Copom, o que é exatamente a mesma coisa). Mas havia algumas pistas:
1.
De Teleton é que Silvio não tinha ido falar.2.
O assunto era importante, urgente. Ou o presidente o chamou, pedindo sigilo, ou ele conseguiu um horário na agenda presidencial assim que mencionou o tema que pretendia expor.3.
Há dois negócios de Sílvio que são do interesse do governo: TV e banco (incluindo ramificações como títulos de capitalização, cartões de crédito, associação com a Caixa Econômica Federal, venda de carteiras de crédito, carnês). Não haveria qualquer motivo para conversar com o presidente sobre os cosméticos da Jequiti, ou o magnífico hotel do Guarujá, a revendedora de automóveis, prédios, Teatro Imprensa, a sinagoga que constrói em troca de outra, que incorporou aos terrenos de sua sede.TV? Negócios financeiros? O leque está se fechando. Com o terreno demarcado, já dá para conversar com gente que sabe das coisas e ouviu rumores que podem ser checados. Como diria o próprio Silvio Santos, quem procura acha.
Mundo global
Definindo o que é globalização: é um grupo português de comunicação, com nome em inglês, cujo principal acionista é casado com uma brasileira, instalar-se no Rio e São Paulo, mantendo excelentes relações com gente influente em Brasília e pensando em se firmar ainda mais no Brasil com a compra de uma rede de TV.
Nosso presidente
Lula nasceu em Pernambuco, mas como político é paulista (como Fernando Henrique, que nasceu no Rio e é um político paulista). Lula foi muito pobre, tornou-se conhecido como líder operário mas hoje é elite – com bom apartamento, sítio, filhos criados, boa renda vitalícia. Lula é nordestino ou é paulista? Lula é brasileiro – e é a prova de que a discussão separatista é rigorosamente idiota.
Aquela moça cujo nome nem precisa ser citado distribuiu incitações sem sentido contra nordestinos. Mas não foi a única: há blogueiros que há pelo menos dois anos acusam São Paulo de separatismo, dizem que detestam a cidade e o estado, que tudo é feio – menos eles, naturalmente, que fazem questão de criar raízes. E a reação de alguns jornais nordestinos à exortação cretina da moça foi tão nociva quanto a dela: faziam questão de identificá-la como ‘a paulista’, como se representasse a totalidade da população do estado.
Bobagem: o paulista Ciro Gomes foi governador do Ceará, o carioca Celso Pitta foi prefeito de São Paulo, o gaúcho Blairo Maggi é governador do Mato Grosso, o matogrossense Jânio Quadros foi prefeito e governador de São Paulo, o goiano Joaquim Roriz foi governador de Brasília, o fluminense Faria Lima foi prefeito de São Paulo, o maranhense José Sarney é senador pelo Amapá, o mineiro Negrão de Lima foi governador da então Guanabara, a paraibana Luiza Erundina foi prefeita de São Paulo, o gaúcho Leonel Brizola foi governador do Rio.
Querem punir a moça. Bobagem: primeiro, não é questão de cadeia, mas de educação; segundo, tem muito mais gente que cometeu o mesmo crime. Deve-se deixar essa discussão sem sentido para quem não tem o que fazer, ou que acha importante discutir os antepassados, e não os filhos e os netos, o futuro.
E, já que têm tempo livre, que tal aproveitá-lo lendo Monteiro Lobato?
Cadê as notícias?
Quando um Legacy e um Boeing se chocaram, em 2006, com a morte de 154 pessoas, o caso virou manchete (e merecidamente). Mas, agora que parte do caso foi julgada, o silêncio é ensurdecedor: a sentença da Justiça de Curitiba extingue a ação de difamação contra o jornalista Joe Sharkey, que estava a bordo do Legacy e escreveu uma série de reportagens sobre o ‘péssimo’ sistema brasileiro de controle aéreo e suas ‘falhas operacionais’. A questão não está encerrada: cabe recurso. Entretanto, é importante verificar que, mesmo quando um estrangeiro critica serviços brasileiros, a Justiça brasileira se coloca ao lado da liberdade de imprensa.
Mas seria interessante que os meios de comunicação do país se mobilizassem para ver como as coisas vão ficar. Cabe entrevistar, por exemplo, a viúva de uma das vítimas do acidente, Rosane Gutjhar, que se considerou ofendida pelas acusações de Sharkey por suas críticas ao sistema brasileiro de controle de voos e foi quem moveu a ação de difamação, agora extinta (há outra ação, esta criminal). Cabe também uma discussão muito interessante nesta época globalizada: acusações publicadas na imprensa americana (e protegidas, portanto, pela Primeira Emenda à Constituição local) merecem que tipo de tratamento de outros países? Que acontece se alguma afirmação é feita nos Estados Unidos e repercutida em outros países via internet?
A lei americana contra o ‘turismo da difamação’ impede juízes americanos de executar sentenças proferidas no exterior que contrariem a Primeira Emenda. É um belo tema para debate.
Tortura, não: a reportagem premiada
A reportagem ‘Quando a sombra cai’, de Sérgio Vieira, difundida pela Rádio Senado, venceu o 12º Prêmio Imprensa da Embratel. A reportagem conta a história da tortura desde os primeiros tempos do país, quando índios e negros podiam ser mortos a chicotadas, até os tempos atuais. A matéria, segundo informações da Agência Senado, foi ao ar em 2009, no Dia Mundial dos Direitos Humanos, 10 de dezembro. Uma sugestão: se ainda não estiver na rede, por que não colocá-la na internet, para que todos possam ouvi-la?
Cerveja na Rota
A notícia foi publicada até que com certo destaque: a Rota, a letal ronda ostensiva da PM paulista, distribuiu títulos de Amigo da Rota a uma série de empresas ‘por sua colaboração’. Entre as empresas, quatro grandes cervejarias: Ambev, Schincariol, Femsa (Kaiser) e Heineken.
Mas ninguém publicou a informação mais importante: que colaboração foi essa, que mereceu um gesto público de gratidão? Imaginemos, claro, que não foi o envio de cerveja ou de refrigerantes ao grupamento. Terá sido contribuição em armas, munição, fardamento, veículos? Ou em dinheiro propriamente dito?
Nada demais, doações fazem parte do jogo – desde que esteja tudo registrado. Está? Até agora a PM, a Rota, a Secretaria da Segurança de São Paulo e as cervejarias nada disseram. E a imprensa, olimpicamente, ignora a questão.
Cada vez aumenta mais
Na grande imprensa, nada. No Paraná, saiu no blog de Zé Beto. Em São Paulo, no blog de Ucho Haddad. Enfim, enquanto ‘O Cara’ ainda é ‘O Cara’, o Iate Clube Lago de Itaipu promoveu a 4ª Pesca ao Tucunaré em Foz do Iguaçu, tendo como prêmio o Troféu Luiz Inácio Lula da Silva. Patrocínio? De estatal, claro: Itaipu. Ou, caso a gente vá mais fundo, da nossa conta de luz.
Plínio nas letras
Plínio de Arruda Sampaio, a prova cabal de que sucesso nos debates não dá voto, lança na quarta-feira (17/11) Por que participar da política?, pela Editora Sarandi, no Sindicato dos Professores da Rede Estadual de São Paulo (Praça da República 282, São Paulo, SP). É um livro compacto, de 64 páginas, que enfatiza a importância de conhecer a política e dela participar.
Ódio e Amor
Maria José Silva lança pela Global Editora um romance atual, ambientado na Colômbia de hoje, onde estão as FARC, e o Peru da rebelião do inca Tupac Amaru contra a colonização espanhola. Uma jovem engenheira é sequestrada pelas FARC e acaba se apaixonando por um dos seus integrantes. Com esse ódio e esse amor já está nas livrarias.
Crônicas escolhidas
Também já está nas livrarias o Pois é…, do médico Marcus Aranha, com 62 crônicas publicadas nos últimos 20 anos nos jornais O Norte e Correio da Paraíba. No lançamento, na Casa de José Américo, João Pessoa, PB, o livro foi apresentado pelo presidente do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, Humberto Fonseca de Lucena, e por um dos filhos do autor, Marcus Aranha Filho.
Como…
Tanto se reclamou da criminalização dos suspeitos que a imprensa caiu no extremo oposto: antes do fato já entra a palavra mágica, ‘suposto’.
Um bom caso: um cavalheiro de pouco mais de 60 anos foi preso em flagrante, no Rio, quando mantinha relações sexuais com uma menina de 12 anos. Diz o título utilizado no noticiário de TV:
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‘Polícia prende suspeito de pedofilia em flagrante na Zona Oeste do Rio’
…é…
Título de um grande jornal:
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‘Polícia investiga suposto erro em cirurgia de menino de 2 anos em SP’E qual foi o ‘suposto erro’? O menino entrou no hospital para operar a fimose. Operaram-lhe a boca e o umbigo.
A direção do hospital ‘lamenta profundamente o ocorrido’. Só faltou a nota oficial lamentar ‘o suposto ocorrido’.
…mesmo?
De um grande jornal:
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‘Ao ser apresentada aos problemas que pipocaram na sua ausência, Dilma talvez tenha saudades de Seul, onde degustou um termômetro que oscilou entre o ameno e frio.’É a primeira vez que este colunista vê a expressão ‘degustar um termômetro’. Terá a Coréia, tão desenvolvida, criado algum termômetro comestível?
Mundo, mundo…
Bollywood, o grande centro produtor de cinema da Índia, está finalmente se libertando dos códigos restritíssimos que limitavam a criatividade dos filmes. Agora chegou a vez dos gays: pela primeira vez, um filme indiano traz um beijo de dois rapazes homossexuais. Eis como a notícia foi publicada no Brasil, num grande portal de Internet:
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‘ (o filme) chegou aos cinema da Índia nesta sexta (12). Criticos comparação a produação a ‘O segredo de brokeback mountain’.’O redator deve ter ficado chocadíssimo com o que viu na tela.
…vasto mundo
Comecemos pelo título:
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‘Milionário britânico muda de sexo, se arrepende e muda de sexo de novo’Antigamente, ele se chamava Sam Hashimi, Foi casado por doze anos, tinha filhos, mas chegou à conclusão de que queria trocar de sexo. Operou-se em 1977 e virou mulher, com o nome de Samantha Kane (custo das várias cirurgias a que se submeteu: quase R$ 300 mil). Namorou muito, virou figurinha fácil no society de Mônaco, mas cansou: cansou dos hormônios femininos, que a seu ver o deixavam emocionalmente instável, cansou de decepcionar-se em relações sexuais com homens, cansou de ser mulher. Em 2005, operou-se de novo para virar homem, agora com o nome de Charles Kane. Finalmente, decidiu casar-se (e vai casar com uma mulher, Victoria).
Só há um problema: bisturi vai, bisturi vem, seu corpo deixou de produzir testosterona (para isso, toma hormônios). E o pênis, reconstituído com retalhos de pele retirados da barriga, definitivamente não é mais o que era.
E eu com isso?
Já discutimos demais os assuntos chatos: agora é hora do frufru, de preferência numa boa confeitaria, com bons amigos, sem hora para sair.
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‘Bombom cai no samba com novo silicone’Trata-se, claro, de Adriana Bombom. A dúvida: com tudo aquilo que lhe é natural, onde terá posto o silicone?
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‘Atriz Eva Longoria se veste de presunto durante premiação europeia da MTV’**
‘Juliana Paes faz compras com a sogra, no Rio’**
‘Rihanna adota trança para passeio com o namorado’**
‘Celebridades vão às compras com conforto e despojamento’**
‘Angelina Jolie diz que o filho de seis anos cozinha melhor que ela’**
‘Quem dorme até tarde não é vagabundo, diz ciência’**
‘Melancia usa bumbum para se promover’**
‘Clint Eastwood diz que gostaria de reencarnar como inseto’**
‘Observar carne tem efeito calmante, diz pesquisa’
O grande título
É uma semana rica em bons títulos. Comecemos pela Fórmula 1:
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‘Rubinho não pensa em parar e afirma: ‘corro atrás do campeonato’’Pelo jeito, é este o problema: Rubinho é um ótimo piloto, mas até do campeonato ele corre atrás.
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‘‘Ex-tia da merda’, ‘vovó do crack’ é detida no DF’E pensar que, quando este colunista começou a trabalhar, camisinha era ‘preservativo’ ou ‘condom’, e bunda nem pensar. Nádegas, conforme o caso. Ou, às vezes, ‘derrière’.
O grande título é esportivo:
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‘Santos deve oficializar contratação de meia quarta’Leia com calma: na quarta-feira, o Santos deve anunciar a contratação de um meia. É, deve ser isso.
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados