A crise atual na maior parte dos grandes jornais do mundo inteiro tem raízes muito mais profundas do que a maioria das razões levantadas até agora. Não se trata apenas de uma sucessão de erros administrativos, estratégias editoriais equivocadas, notícias falsas que abalaram a credibilidade ou perda de receitas publicitárias. Um paper acadêmico escrito pelo professor Mark Deuze , na Universidade de Indiana, nos Estados Unidos parte do princípio que a internet está alterando irreversívelmente a forma como os jornalistas produzem notícias, o que acelerou a instabilidade na indústria dos jornais, provocou o surgimento de uma crise de identidade profissional e vai levar a um novo modelo de texto jornalistíco. Deuze afirma que duas constatações estão na origem na irreversibilidade das mudanças na mídia impressa: 1) Com o advento da internet, o texto deixou de ser apenas a expressão de idéias por meio de palavras, sons ou imagens. A narrativa jornalistica também se estrutura através da interatividade e do hipertexto; 2) O público deixou de ser uma massa inerte e passou a ser parte indispensável na produção da nova narrativa jornalística, um processo essencialmente horizontal e descentralizado. A sociedade contemporânea chegou a um tal grau de imersão na informação que as pessoas deixaram de dar à imprensa a importância que esta teve no passado, quando ela era decisiva na formação da agenda dos temas discutidos pelo público. Ao mesmo tempo, a tecnologia deu ao público tantas ferramentas de comunicação (telefones, internet, correio eletrônico, weblogs, chats, fóruns etc) que hoje é praticamente impossivel separar o consumo da produção de informações. É claro que tudo isto acabou colocando em questão uma série de valores que estão na base do que Mark Deuze chama de identidade profissional dos jornalistas. Um dos pilares desta identidade estabelece que a função do jornalista é dar às pessoas as informações que elas precisam para serem bons cidadãos. É esta função que justifica valores como isenção, objetividade e criativdade narrativa. Mas quando o público começa a produzir informações, o jornalista passa a ter que buscar uma nova identidade profissional, num momento em que os jornais também se defrontam com a dura realidade da crise do modelo de negócios. A tese do professor holandês é a de que as dificuldades atuais dos grandes jornais são estruturais, ou seja, o sistema verticalizado e centralizado de produção de notícias não atende mais às necessidades da população em matéria de informação. Por outro lado, a crise de identidade profissional só será superada na hora que os jornalistas assumirem que eles perderam a exclusividade na função de dizer aos membros de uma comunidade, o que eles devem fazer para serem bons cidadãos. A notícia como conversa, ou seja troca, surge como um novo valor em ascenção dentro do jornalismo, que consequentemente começa a receber adjetivações variadas como participativo, cidadão, online etc etc.