Alguns leitores me perguntam porque publico com tanta frequência notícias sobre a crise nos jornais e acho que eles tem todo o direito a uma resposta mais ampla. Estou convencido de que a informação sobre o que acontece na imprensa não é mais um privilégio dos profissionais mas sim um tema que interessa ao público em geral, porque é através dela que recebemos as informações que condicionam nossas decisões pessoais. Assim, quanto melhor conhecermos a situação dos jornais, revistas, televisões, rádios e agora também dos páginas informativas na Web, mais capacitados estaremos para exercer nosso papel de cidadão. Tudo isto parece óbvio ou tirado de uma apostila de aulas de Moral e Cívica mas a internet tornou a informação uma matéria prima tão importante que ela não é mais uma exclusividade dos jornalistas. Saber o que acontece dentro das redações e nas salas da diretoria de um jornal é hoje tão importante para a informação pública como o que sai impresso. Porque é nestes ambientes que se decide sobre o que vamos discutir, pesquisar, batalhar ou refletir. Esta introdução serve para irmos outra vez o tema crise na imprensa agora com duas informações vindas dos Estados Unidos e que seguramente provocarão mudanças também aqui no Brasil, dentro de algum tempo. A primeira é a reportagem do jornal The Washington Post (Newspaper-TV Marriage Shows Signs of Strain) que revela uma corrida dos grandes grupos da imprensa escrita norte-americana para livrar-se de investimentos na televisão, contrariando a histórica tendência a associar conteúdos impressos com audio-visuais. O The New York Times, há semanas, torrou nove emissoras de TV depois de ter vendido sua participação no Discovery Channel, em novembro passado. O grupo Tribune , controlador do Chicago Tribune, quer se desfazer de 24 estações de televisão mas está encontrando muita dificuldade para achar compradores generosos. E o grupo E.W. Scripps, que tem 19 jornais e 10 TVs, quer desmembrar suas operações para ficar só com os impressos. Quatro anos depois de ser apontada como uma aliança estratégica, o casamento entre jornais e TV entrou em fase de separação amigável e a razão é uma só: a internet. O modelo de negócios da imprensa escrita está sendo revisto em todo o mundo por conta da emergência de novos atores na arena informativa como as páginas noticiosas em tempo real, os weblogs e a distribuição viral de informações por meio do correio eletrônico, listas de discussão e chats online. O modelo da TV também está em crise por conta da popularização da troca de vídeos pela internet, do barateamento dos equipamentos de gravação de imagens e dos softwares de edição e publicação de vídeos. Resultado, a televisão que já foi um negócio capaz de produzir fabulosos lucros líquidos de 40% ao ano nos EUA, luta hoje para ficar na faixa dos 10%. Para quem olha um pouco mais adiante, deixou de ser um bom negócio ter jornais e redes de televisão, ainda mais quando os dois estão juntos. Para se ter uma idéia do clima que está tomando conta das salas de diretoria dos grandes jornais norte-americanos, o grupo McClatchy, na virada do ano, passou adiante pela metade do preço o jornal The Minneapolis Star Tribune, comprado há menos de seis anos. A pressa na venda tem um motivo claro. A indústria dos jornais costumava ter lucros líquidos anuais em torno dos 20% até o ano 2000. Depois eles cairam para 10%. No ano passado foram de 8% e a previsão para 2007 é de magros 7%, confirmada por uma nova queda de 0,9% no faturamento publicitário dos jornais americanos no ano que está começando agora. O The New York Times está com um pepino na mão. Em 1993, o Times comprou o The Boston Globe por 1,2 bilhão de dólares. Hoje, o jornal perdeu 2/3 de sua circulação e vale apenas 500 milhões de dólares. Assustados com a queda constante da rentabilidade dos jornais, preocupados com o futuro da televisão comercial quando a era da imagem digital estiver a pleno vapor daqui a dois anos, os acionistas de grupos da mídia estão buscando socorro nos meios financeiros, na vã esperança de que eles podem recuperar a lucratividade perdida. O Star Tribune foi comprado pela Avista Capital Partners, enquanto o grupo financeiro Private Capital Managers, depois de ter forçado a venda de 33 jornais da rede Knight Ridder, reduziu agora no inicio de janeiro, seus investimentos no The New York Times, nos jornais da rede Gannett e no conglomerado Belo, de radio e televisão. O panorama não é menos sombrio na Europa, onde os deficitários jornais franceses namoram uma possível ajuda governamental para compensar quedas médias de 1 a 2% ao ano nas vendas em bancas e assinaturas.O ministro da Cultura, Renaud Donnedieu de Vabres, chegou a admitir que investidores em jornais gratuitos de opinião poderiam ter isenção fiscal, a ‘bolsa família’ da imprensa francesa. Os empresários, jornalistas e investidores travam uma corrida contra o tempo tentando salvar ativos, biografias e investimentos ameçados por mudanças estruturais provocadas por inovações tecnologicas que estão gerando novas rotinas informativas e novos valores sociais. Não é também apenas um fenômeno europeu ou norte-americano. Aqui no Brasil a situação dos jornais, editoras de revistas e televisões também está mudando, só que há uma escassez generalizada de informações por conta da pouca transparência dos grupos nacionais de mídia. Está cada vez mais claro que a mudança não se limita à produção de novas engenhocas e gadgets eletrônicos. É uma nova cultura em surgimento e o leitor é um protagonista chave nela. Quanto mais cedo ele tomar consciência deste novo papel através da informação, melhor ele poderá exercê-lo e usufrui-lo.
A importância da transparência na informação sobre a imprensa