Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A mídia na margem de erro

Pela quarta vez nesta campanha eleitoral volto ao tema de como a mídia divulga e analisa os resultados das pesquisas de opinião.


Uma vez escrevi sobre a forma Polyana com que o Estado apresenta os números das sondagens, fazendo das tripas coração para mostrá-los de modo a permitir que o leitor conclua que Lula lidera, mas Alckmin não está morto de jeito nenhum. Hoje, o jornal intensifica a ‘torcida’, mas não é o caso de chover no molhado.


Prefiro chamar a atenção para o noticiário da imprensa em geral, que não consegue assimilar o que realmente significa ‘margem de erro’ em pesquisas.


Tome-se o título de página interna do Globo de hoje: ‘Diferença entre Lula e Alckmin cai em pesquisas’. Olhando as tabelas com a evolução dos resultados do Ibope, entre 31 de julho e 22 setembro, e do Datafolha, entre 29 de junho e 22 de setembro, é inegável que a tendência de Lula foi subir e depois estabilizar, e que a tendência de Alckmin, depois de estabilizar, foi subir.


O problema é fazer a sintonia fina dessa tendência, quando a diferença entre o primeiro colocado e a soma dos votos de todos os demais, descontados nulos e brancos – o que indica a maior ou menor chance de haver segundo turno – é altamente escorregadia.


Dos nove levantamentos do Ibope, em nenhum a posição de Lula variou além da margem de erro de 2 pontos percentuais em relação à pesquisa precedente.


Na última comparação, por exemplo, ele ‘caiu’ de 49% para 47%. Que quer dizer isso: quer dizer que ele tinha qualquer coisa entre 47% e 51% e agora está com qualquer coisa entre 45% e 49%. Se se admite que Lula podia estar com 47% na pesquisa anterior, o que é perfeitamente legítimo do ponto de vista estatístico, nada impede que de lá para cá ele ou tenha caído 2 pontos, ou tenha ficado onde estava – ou tenha ganho 2 pontos.


No caso de Alckmin, para ficar ainda no Ibope, só uma vez ele mudou efetivamente de posição: em 9 de agosto, quando caiu 6 pontos em relação à sondagem (4 pontos acima da margem de erro). Mesmo nas duas ocasiões em que ultrapassou a barreira dos 2 pontos para mais ou para menos – de 25% para 27% em 7 de agosto e de 30% para 33%, em 22 de setembro, a variação é menos cristalina do que parece.


Para ficar no caso do dia, se o Ibope diz que o tucano tinha 30% em 20 de setembro e passou para 33%, isso significa que ele tinha entre 28% e 32% e tem entre 31% e 35%. Se tivesse 32%, ou ele perdeu 1 ponto ou ganhou 3. Se tivesse 28%, ou ganhou 3 pontos ou ganhou 5.


Os lulistas podem preferir a primeira das quatro possibilidades. Os tucanos, a quarta. Nenhum deles está necessariamente certo. Nenhum deles está necessariamente errado.


É isso que a mídia, presa à sua própria e ampla margem de erro ao noticiar e comentar fatos, não passa ao leitor. Na atual disputa presidencial, idealmente toda matéria com resultados de pesquisas deveria trazer, em letra graúda, a advertência: cuidado com os números.


O leitor precisa saber que, na realidade, eles podem ser o que parecem. Ou o que não parecem.


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