Saturday, 28 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A polêmica do jornalismo na primeira pessoa


Durante décadas, o jornalismo foi quase um sinônimo de texto na terceira pessoa. O repórter era o intermediário entre o protagonista da notícia e o leitor, o que o transformava num narrador, na terceira pessoa. A rádio e a televisão começaram a quebrar esta regra mas, agora, ela está perdendo o status de dogma profissional por causa do fenômeno weblog, que está consagrando narrativa baseada no eu.


O texto na primeira pessoa ainda incomoda a maioria dos jornalistas, pois é geralmente associado ao protagonismo, atitude vista como um pecado capital no exercício da profissão. Eu mesmo tenho muita dificuldade em usar o pronome pessoal, mas na web é cada dia maior o número de profissionais que acabaram incorporando o personalismo dos chamados jornalistas amadores(também conhecidos como jornalistas cidadãos), surgidos na crista da onda dos weblogs.


A nova postura diante do texto na primeira pessoa entrou na agenda da grande imprensa e das principais universidades norte-americanas movida pela pressão dos weblogs, onde os autores são ao mesmo tempo protagonistas. A rede de televisão ABC  criou um segmento noticioso chamado First Person (Primeira Pessoa) onde o protagonista se dirige diretamente à audiência, sem a participação de um ou uma repórter. E é cada vez maior o número de jornais que substituem o relato de repórteres pelo dos ou das protaganistas.


Steve Outing, do Instituto Poynter, um centro de estudos especializado em jornalismo na Flórida (EUA), lançou a tese de que o jornalismo na primeira pessoa é uma fórmula narrativa híbrida, que combina o estilo tradicional e o gênero contador de histórias, adotado pela maioria esmagadora dos blogueiros.


O uso do eu em narrativas jornalísticas não é novo. Icones do jornalismo norte-americano como Gay Talese e Tom Wolfe cunharam a expressão Novo Jornalismo, nos anos 70, para identificar textos escritos na primeira pessoa. O inédito é a generalização do eu na grande imprensa, até em redutos da tradição como o The New York Times.


A pesquisadora de jornalismo online, Amy Graham  levou a questão para o terreno da credibilidade. Ela acha que tanto faz o eu como o ele, mas a questão não parece ser tão simples. É evidente que quase todas as regras e rotinas do jornalismo estão mudando, mas o repórter ainda é visto como o profissional que certifica a credibilidade de um relato, principalmente quando o entrevistado é desconhecido pelo público.


Esta função certificadora perdeu boa parte de sua força por conta do acúmulo de erros cometidos recentemente por jornais e jornalistas no mundo inteiro, mas ela ainda é um referencial para parte do público consumidor de informações. Apesar disto, o leitor pode ir se acostumando com o uso da primeira pessoa no texto jornalístico, porque esta é uma tendência irreversível.


A prova é o crescimento dos weblogs, hoje perto dos 15 milhões no mundo inteiro e dobrando de número a cada cinco meses e meio, segundo o site Technorati.