Porque hoje é domingo, imaginei encontrar nos grandes jornais – ou pelo menos em um deles – alguma tentativa de ir à raíz do problema dos cartões corporativos, até aqui ignorada no mar de números em que navega o noticiário sobre o seu uso, com duvidoso proveito para o leitor.
A questão básica, de que a imprensa continuou a passar ao largo, é a de como o setor público pode administrar melhor o seu custeio – a infinidade de despesas do dia-a-dia, parte delas pagas com dinheiro de plástico ou com cheques de contas especiais dos pagadores, sem as quais o Estado estanca.
Esse gerenciamento beira a quadratura do círculo. Idealmente, a manutenção da máquina deve se dar com um mínimo de burocracia, em nome da agilidade, mas com regras e controles tais que limitem o desperdício – fazendo cada real render o máximo, ou quase, em cada gasto –, previnam os abusos e flagrem os desvios, com a punição rápida dos que deliberadamente privatizam em benefício próprio recursos públicos ao seu alcance.
Uma das provas da imensa dificuldade de conciliar tudo isso, mesmo no mais honesto e austero dos governos, está no vai-vem das diretrizes a respeito. Todos os ministros devem ter cartão, se diz num dia. Nenhum ministro deve ter cartão, se diz no outro – para citar um de uma montanha de possíveis exemplos das mudanças de políticas no setor.
Governar o governo é um nó. Começa pela imensidão das zonas de sombra entre o que obviamente deve ser permitido e obviamente deve ser proibido no manejo cotidiano do dinheiro do contribuinte. E termina na necessidade de um exército de funcionários que fiscalizem os desembolsos dos colegas.
De novo para pegar um caso entre milhares, pensem nos R$ 8 reais que o ministro dos Esportes gastou com uma tapioca, bancados por seu cartão. Foi uma irregularidade única e exclusivamente porque ele estava
Acho que já deu para pegar o espírito da coisa, pois não? Imaginem então que belo serviço poderia ter feito hoje o jornal que gastasse um par de páginas mapeando o pantanoso terreno da economia doméstica dos governos, discutindo alternativas, fazendo comparações – para não reduzir as coisas, pela enésima vez, ao facilitário do denuncismo.
Até porque o dinheiro público que vai para o ralo por indiferença ou incompetência de quem o gasta representa um escândalo tão ou mais grave do que o do dinheiro que vai para o bolso dos corruptos.