Com mais erros do que acertos, os jornais e revistas vem tentando encontrar novas fórmulas editoriais e corporativas para sobreviver ao impacto da internet; mas a televisão, aqui e no resto do mundo, permanece atada à um modelo que tem mais de 50 anos.
A resistência à mudança é mais nítida no segmento dos telejornais, onde, descontadas as inovações tecnológicas e as mudanças no guarda-roupa, as emissoras seguem a mesma fórmula do Repórter Esso, da extinta TV Tupi, o primeiro noticiário em vídeo no Brasil. Trabalhei 11 anos no jornalismo da TV Globo e sou testemunha de que as mudanças no estilo de apresentar notícias foram apenas superficiais e formais.
A televisão está entrando na era digital sem ter conseguido livrar-se totalmente do pecado original de ter herdado o estilo narrativo do jornal impresso. Agora ela está diante do desafio da narrativa não linear e interativa da internet, mas continua agarrada ao estilo linear e unidirecional de contar histórias com imagens e sons.
O espectador permanece alheio às novas possibilidades de comunicação multimídia interativa porque segue hipnotizado pela sucessão de inovações tecnológicas e pelo fascínio da imagem. Os anunciantes, desconfiados da mídia impressa, mantém as verbas publicitarias na TV, garantindo às emissoras receitas que acabam estimulando o medo de arriscar mudanças na programação, apesar da queda das médias de audiência, em comparação aos anos 1980 e 90.
Os telejornais continuam agarrados à fórmula de apresentadores carismáticos e repórteres no local dos fatos, embora nem uns nem outros acrescentem diferenciais significativos ao conteúdo das notícias transmitidas. A regra de que os stand ups (repórter no vídeo) conferem credibilidade à reportagem continua sendo seguida ao pé da letra, embora os fatos mostrem que há pouca ou nenhuma relação entre o que o profissional viu e a realidade do evento noticiado. O deslocamento de equipes de jornalistas e a presença de correspondentes no exterior acabam funcionando mais como marketing dos telejornais do que como garantia de conteúdo original.
O uso intensivo da notícia como fator de atração de público levou à multiplicação de programas noticiosos, e como a capacidade de produção de novas reportagens é limitada, o recurso à repetição passou a ser onipresente. Os telejornais da noite repetem notícias e imagens já divulgadas nos noticiários da manhã e do meio-dia. Quem assiste ao Bom Dia Brasil muito provavelmente encontrara boa parte das matérias repetidas no Jornal Nacional e no Jornal da Globo.
A repetição em si não é um pecado. O problema é que o enfoque continua o mesmo, mostrando falta de criatividade dos editores, salvo quando um fato novo acontece entre um telejornal e outro. Outra causa da monotonia dos telejornais é o fato de todos eles seguirem a mesma agenda noticiosa. Como os manuais de redação são idênticos, a edição, estilo e apresentação das notícias acabam sendo quase iguais. As diferenças ficam apenas por conta dos gadgets eletrônicos ou do orçamento para financiar deslocamentos de repórteres.
As redes e emissoras independentes estão desperdiçando preciosos recursos financeiros ao não optarem por uma reinvenção da televisão em ambiente internet. A primeira coisa que os telejornais precisam esquecer é a preocupação em dar notícias que já circularam pela internet e estão em debate nas redes sociais. Também deixa de ser prioritária a regra de trazer a notícia pronta e supostamente completa. Com a multiplicação exponencial dos informantes online, cidadãos praticantes de atos jornalísticos, fica difícil ser inédito e, ainda mais, tentar condensar a diversidade de visões e opiniões numa única reportagem.
A tendência é a TV deixar de ser a referência obrigatória para as pessoas saberem o que está acontecendo porque elas estarão se atualizando por uma miríade de veículos, quase todos alimentados pela internet. Com isso, os telejornais tendem a se tornar menos atrativos e consequentemente menos valorizados em matéria de espaços publicitários. Para manter sua relevância diante do público, o telejornalismo precisa descobrir o que a TV tem de único em relação aos demais veículos de comunicação, algo que muitos sabem mas não aplicam.
A televisão é o melhor veículo para exposição da diversidade de perspectivas e opiniões, desde que os profissionais deixem as pessoas debater, sem impor condicionamentos ou direcionamentos. Os programas jornalísticos na TV em ambiente Web podem assumir duas características: espaços abertos para discussão ou espaços de opinião personalizada diversificada.
Dos dois espaços, a TV comercial, e também a estatal, usam apenas o ocupado por porta-vozes das opiniões ou projetos das respectivas direções. Na TV paga há mais debates do que na aberta, mas a razão fundamental não é o principio da livre discussão, mas o fato de que programas deste tipo são mais baratos, já que não envolvem produção sofisticada – bem como, quase sempre, encontram participantes interessados na visibilidade e marketing pessoal.
Nos Estados Unidos, empresas surgidas na internet, com a Yahoo!, estão contratando profissionais da televisão convencional e mostrando interesse em ocupar espaços diante da demora das grandes redes de TV em mudar suas estratégias editoriais na era digital. Além disso, os grandes jornais, originalmente impressos, estão agora investindo pesado na multimídia, abrindo outro flanco de ataque aos territórios antes exclusivos da TV. Quase todos os grandes jornais norte-americanos, europeus e japoneses já têm hoje boa parte de suas notícias na internet editadas na forma de vídeos.
As receitas publicitárias da televisão também estão caindo, mas em ritmo muito menor do que na imprensa escrita. As margens de lucro ainda são compensadoras. O momento da mudança é agora, porque esperar mais significa a possibilidade de ter que tomar decisões complexas em clima de crise ou quase crise, quando a margem de erro aumenta muito.