Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Agora, a politização da ação nas favelas

O Jornal Nacional de ontem (10/3) não deu os nomes da mãe e da filha atingidas durante tiroteio entre bandidos e soldados no Morro da Providência, no Centro do Rio, nem lhes mostrou os rostos. O SBT Brasil fez ambas as coisas. O noticiário do SBT bancou ‘informações exclusivas’ segundo as quais a intervenção militar cessaria. Não é o que dizem os jornais de hoje.


No Globo deste sábado a mãe se chama Divaneide dos Santos, 29 anos, e a filha é Leiuse, 26 dias. Para que se tenha idéia de quanto os jornais estão distantes dessa realidade, na Folha a mãe se chama Ivaneide, e a filha tem um nome diferente em cada jornal: Leiusa (JB), Leílza (Folha), Luísa (Estadão).


Nos sites, a contagem é avassaladora (resultados tomados entre 12h30 e 13 horas de sábado, 11 de março) a favor da ação militar:


O Dia Online (“Você é contra ou a favor da ocupação das favelas pelo Exército?”): 93,83% a favor, 19.450 votos.


Globo Online (“O Exército vai conseguir recuperar as armas roubadas”; será a pergunta a mais convincente e relevante que se poderia formular?; chega a minudenciar, como diria o douto Ibrahim Abi-Akel, se todas ou poucas armas serão recuperadas):


Sim, todas, 33.79%


Sim, mas só algumas, 10.79%


Não, a operação é perda de tempo, 17.64%


Não, mas o que importa é que as tropas estão na rua, nos dando mais segurança, 37.78%


Noves fora, 17,6% eram contra. Total de 17.828 votos.


Portal Terra (‘Você é a favor da ocupação do Exército nas favelas do Rio?’):


A favor, 95.30 %, 184.524 votos.


Pesquisadores universitários fizeram sondagens que indicam maciço apoio da população carioca (em torno de 90%) à participação do Exército na repressão. Essas pesquisas não são limitadas pela definição socioeconômica dos usuários de internet.


Os jornais pararam de computar os gastos das Forças Armadas na operação, mas deveriam insistir nisso. Sem partis pris: pode ser que a diminuição da criminalidade, se e quando vier a ser obtida, compense o custo.


Amanhã, domingo, os jornais publicarão reportagens que abordarão a politização do assunto, iniciada nas edições de hoje com manifestações da governadora Rosinha Mateus. O secretário de Segurança Pública, Marcelo Itagiba, candidato a deputado federal, sumiu do mapa.


Em 1994, a intervenção do Exército foi interpretada como favorável à candidatura de Marcelo Alencar, do PSDB, que foi eleito.


Hoje se estampa a intervenção de procuradores, Ministério Público, entidades de direitos humanos. Não discutem o problema e a busca de soluções. Há quem diga que a solução de alguns problemas será um problema para essas entidades. É um ponto de vista que, em alguns casos, não deve ser descartado. Isso dito, a truculência, venha de onde vier, deve ser noticiada, denunciada, apurada e punida. E haverá truculência, como em toda ação militar desde que o mundo é mundo.


Veremos se os jornais deste domingo tratarão de forma equilibrada a questão político-partidária, que envolve: políticos – desde o presidente da República até vereadores com eleitorado nas áreas afetadas -, autoridades de carreira, entre elas, notadamente, policiais, promotores e juízes; traficantes, ongueiros, advogados, jornalistas e, last but not least, cidadãos.


Existe o discurso de que a intervenção é ‘absolutamente inconstitucional’, não declarada, e tem finalidade política. Mas se pode perguntar se uma intervenção declarada, no figurino previsto (estado de defesa ou estado de sítio), não seria uma politização ainda mais explícita. Vide resultados de sondagens de opinião. Ou seja: o distinto público aplaude a intervenção bélica. 


Anote-se: na manhã deste sábado os senadores petistas Saturnino Braga e Eduardo Suplicy visitaram a Rocinha em companhia do presidente da maior associação local, William de Oliveira, que passou uma temporada preso sob acusação de cumplicidade com traficantes e policiais bandidos (estes, policiais, ainda detidos).